Os comentários nas redes sociais sobre o falecimento de Oscar Niemeyer mostraram que ainda hoje a arquitetura moderna é polêmica. Seu mestre Le Corbusier dizia que seus prédios eram "máquinas de morar"; quem se viu obrigado a morar neles completa: "máquina de morar mal". O arquiteto indignava-se ao perceber que os moradores tentavam logo tornar o espaço adequado ao uso humano, com cortininhas e vasos de plantas.
É inegável a completa inadequação ao uso humano dos espaços planejados pela arquitetura moderna: praças sem árvores e sem sombras, edifícios quentíssimos, de péssima acústica e com escadas sem corrimões; ambientes em que apenas robôs se sentiriam à vontade ainda que, no caso de Niemeyer, dessem maquetes belíssimas.
Seu talento plástico superou o de Le Corbusier; comparar as obras de um e de outro é como comparar um pássaro em voo a um caixote. Infelizmente, contudo, a visão desumana que orienta a arquitetura moderna também orientou a obra do brasileiro.
As arquiteturas tradicionais têm elementos em várias escalas, dos pequenos arabescos do tamanho de uma mão a almofadas de porta de menos de um metro, a portas emolduradas com dois metros, abrindo caminho para pés-direitos de altura adequada ao clima. Estas escalas, presentes igualmente na natureza em que uma árvore pode ter um tronco de 30 metros de diâmetro, mas tem também galhos progressivamente mais finos, folhas, flores, nervuras... fazem com que as pessoas se sintam confortáveis.
Na arquitetura moderna, o efeito buscado é o oposto; os detalhes inexistem, as escalas dão saltos, passando imediatamente do minúsculo ao monumental. O ser humano é um intruso, uma formiga na mesa de jantar. Os nichos que nos dão conforto um espaço aconchegante junto à janela, a transição da rua à sala que uma varanda proporciona não existem; é o homem que deve se adaptar à arquitetura, não o contrário. É a negação do humano, nas dimensões, no conforto, em tudo que não a beleza dos edifícios vistos de longe ou em maquete.
Trata-se, na verdade, de uma expressão mais refinada duma visão arquitetônica orientada pelos totalitarismos do século passado a um dos quais, aliás, Niemeyer permaneceu sempre fiel. Stálin e Hitler mandaram construir edifícios gigantescos, em que o homem desaparecia como uma formiga numa mesa. Niemeyer fez edifícios em que o homem desaparecia como uma formiga numa bela escultura; a visão é a mesma, o erro é o mesmo. Difere apenas o talento de quem rascunha as leves linhas com que o humano é negado.