O ano de 2011 chegou ao fim e deixou um sentimento de frustração para todos os que veem na educação o caminho inevitável para a construção de um Brasil socialmente justo e democrático. A votação do Projeto de Lei n.º 8.035/2010, o nosso Plano Nacional da Educação (PNE), foi mais uma vez postergada, deixando em aberto temas decisivos que não podem mais aguardar
Mais do que lamentar a aparente falta de prioridade que a educação ocupa na agenda de setores do governo, é tempo de ressaltar aspectos que já tornam esse PNE um capítulo à parte na história do país. Nunca houve uma oportunidade tão clara e decisiva de participação da sociedade nos rumos de seu sistema de ensino.
Há quem demonstre não ter entendido bem esse fato, em uma espécie de miopia social, por exemplo, creditando o elevado número de emendas mais de 3 mil a um mero jogo de interesses sindicais ou político-partidários.
É legítimo e democrático que todos os setores se manifestem e defendam seus interesses. Mas é preciso ver também que grande parte dessas emendas foi produzida após amplos e subsidiados debates em diferentes fóruns, como a Conferência Nacional da Educação (Conae), em 2010.
A Conae mostrou-se uma instância fecunda. Foi capaz de ampliar a voz e o protagonismo de diferentes atores sociais. Desta conferência, que reuniu mais de 4,5 mil educadores, nasceu um documento com o consenso possível, de caráter construtivo e propositivo.
Do mesmo modo, o PNE deve ir à votação enriquecido em 2012 com as contribuições do movimento PNE pra Valer!, coordenado pela Campanha Nacional pelo Direito à Educação, do qual participam instituições de diferentes segmentos, como a União Nacional dos Dirigentes Municipais (Undime) e a Associação Nacional de Pesquisadores em Educação (Anped), apenas para citar exemplos.
A presença de representantes da sociedade civil nas diferentes fases de construção e tramitação do PNE é uma prova de que a educação definitivamente convoca a atenção dos brasileiros, não mais a reboque de problemas dramáticos, como filas por matrículas em portas de escola, nem atrás de uma longa lista de direitos sonegados pelo Estado, como saúde e segurança. É um tema que se torna cada vez mais o "prato do dia", num efeito em cadeia que só tende a se aprofundar.
Esse dado torna mais assombrosa a distância entre as demandas sociais na educação e a prioridade dedicada na agenda executiva do país. Tanto é assim que, na cobertura da imprensa, o grande destaque é conferido ao "braço de ferro" travado sobre qual deve ser o investimento público do setor em relação ao PIB uma questão de suma importância, pois pela primeira vez as metas do PNE estarão costuradas com fontes de financiamento, assegurando sua exequibilidade.
Esse impasse é simbólico. Mostra que, enquanto sociedade, precisamos vencer uma barreira sutil na história de nossa República: aquela segundo a qual a participação social é tratada como algo desejável e belo para dar "sensação de democracia", mas que não pesa efetivamente nas decisões, principalmente quando estas implicam disponibilização de recursos financeiros condizentes com as metas propostas.
O financiamento da educação não pode ser um argumento para tornar a aprovação do PNE um tema de gabinetes. Ao contrário, é tempo de discutir com a sociedade como ela espera ver aplicadas as riquezas arrecadadas pelo país.
A votação do PNE urge. É preciso reconhecer que a educação brasileira sofre pelo acúmulo de problemas ao longo de sua história e que o PNE que findou em 2010 não cumpriu boa parte do que prometeu.
Para não repetirmos erros passados, precisamos considerar as instâncias de participação e controle social como elementos que potencializam tanto a qualidade do plano quanto sua execução. O texto a ser votado, se não é o ideal, já está inevitavelmente vitaminado pela atuação das representações da sociedade civil, uma seta que indica estarmos no caminho certo para garantir, enfim, o direito básico de uma educação de qualidade para todos.
Paulo Castro, economista, é diretor-presidente do Instituto C&A.