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2014: o ano que não começou

Que o ano sempre começa no Brasil depois do carnaval, não há a menor dúvida. A precisão não é o nosso forte em matéria de horários e calendários. Horários são marcados com flexibilidade: "Duas, duas e meia... quatro, cinco horas...". E datas móveis são ideais para balizar o calendário. Já escrevi aqui mesmo que temos precedentes históricos: se os revolucionários franceses estabeleceram os fenômenos naturais como maneira de medir o tempo, com meses denominados "germinal" e "floreal", por que não podemos ter "le Carnaval" como uma referência (mesmo porque em alguns lugares ele dura quase um mês...)?

Não acredito que, apesar disso, outros povos trabalhem mais que os brasileiros. Franceses, com seu horário semanal de 35 horas, não estão com essa moral toda para criticar a lassidão dos trópicos em um país em que a jornada semanal de trabalho é de 44 horas e mais da metade da força de trabalho faz duas horas extras por dia; ingleses, com a profusão dos seus bank holidays, feriados bancários e a prática do Boxing day, o dia após o Natal para desembrulhar presentes, também não. Italianos, nem pensar; alemães, quem sabe, com aquela fascinação pelo trabalho e pela eficiência a qualquer custo.

Confesso que não acreditava que duas coisas existissem na Deutschland: programas humorísticos e bailes de carnaval. Mas minha imersão recente na cultura germânica por causa de nossa neta tedesca, a gloriosa Anna Clara, me abriu os olhos: ambos existem, embora com características especiais: os humoristas são auxiliados por um acorde da orquestra ao fim de cada piada (deve ser para lembrar as pessoas que é hora de rir) e os bailes de carnaval são de uma solenidade ímpar, com pessoas fantasiadas ricamente sentadas em mesas observando sisudamente o que se passa no palco, onde cantores e entertainers se revezam. Um corinho de "mamãe eu quero", nem pensar, embora o costume de começar o carnaval mais cedo tenha um similar germânico de nome intimidatório: weiberfastnacht.

No caso brasileiro, 2014 corre o risco de não ter começado na quinta-feira após o carnaval, pois agora teremos o "depois da Semana Santa", o "depois da Copa" e o "depois da eleição". O "depois da Copa" é uma decorrência natural da nossa incapacidade de agir "antes da Copa": sete anos se passaram e muito pouca coisa aconteceu. Aeroportos maravilhosos, avenidas modernas com verdadeiras freeways urbanas, o reforço da rede hospitalar, hotéis em profusão, investimentos privados a rodo, blablabla. De concreto mesmo ficarão esses monumentos à capacidade brasileira de jogar dinheiro público em obras suntuosas, os estádios da Copa, enquanto as escolas e os prontos-socorros operam em condições subsaarianas.

E depois da eleição, daí, sim, é que o ano não começará – pois, se o partido do governo ganhar, tudo continuará no mesmo e, portanto, não há razão para pressa. E, se a oposição ganhar, todos ficarão na expectativa para ver se e quais coisas mudarão.

Não é à toa que os italianos dizem que os americanos inventaram a gioia del lavoro, a alegria do trabalho, e nós, latinos, descobrimos la gioia de vivere, a alegria de viver.

Belmiro Valverde Jobim Castor é professor do doutorado em Administração da PUCPR.

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