| Foto: Marcelo Andrade/Gazeta do Povo
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No próximo dia 29 de abril, o Supremo Tribunal Federal (STF) retomará o julgamento dos embargos de declaração que discutem a exclusão do ICMS da base de cálculo do PIS e da Cofins (RE 574.706). Para quem não se lembra do tema, em 2017 a corte decidiu que é inconstitucional incluir o ICMS na base de cálculo do PIS e da Cofins.

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A União federal, então, solicitou duas coisas ao STF: que a corte “module” os efeitos da decisão, ou seja, que restrinja ou até mesmo impeça a devolução dos valores pagos indevidamente; e que a corte declare que o ICMS a ser excluído da base de cálculo não é o ICMS “destacado” na nota fiscal, e sim o ICMS “efetivamente pago”, uma vez que, dado o caráter não cumulativo do imposto, o somatório dos valores destacados é sempre maior do que o efetivamente pago.

O que está em jogo neste julgamento do STF? Segundo dados da Lei de Diretrizes Orçamentárias de 2020, um impacto para os cofres federais de R$ 45,8 bilhões em um ano e R$ 229 bilhões em cinco anos. É por isso que foi apelidada de “a tese do século”.

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Na minha visão, a modulação de efeitos é inconstitucional. Mas o que significa modular os efeitos de uma decisão? Significa dizer que, apesar de a cobrança de um tributo – ou de parte de sua base de cálculo, como é o caso aqui comentado – ser declarada inconstitucional, não haverá a devolução do que foi cobrado inconstitucionalmente no passado. A decisão do STF somente se aplicaria, então, para fatos que ocorrerem após uma determinada data que deve ser fixada pela corte. Seja qual for essa data, tudo que foi pago até então seria considerado válido apesar da inconstitucionalidade da cobrança. Seria mais ou menos assim: eu cobrei a mais durante todos esses anos, mas vamos deixar isso de lado, pois a conta para o governo devolver o dinheiro ficou muito cara.

Em eventual modulação, poderia ainda existir uma ressalva aos contribuintes que tinham ações em curso em 2017, quando o STF decretou a inconstitucionalidade, mas isso seria estimular ainda mais a gigantesca litigiosidade tributária existente no Brasil, pois, se é assim, doravante todos nós, contribuintes, devemos questionar tudo que levantar a menor suspeita de inconstitucionalidade, para não corrermos o risco de não sermos alcançados por futuras decisões daquela corte. Além do mais, uma tal modulação é ofensiva ao princípio da isonomia, dado que, se uma lei é inconstitucional, é inconstitucional para todos, independentemente de se adentrar em juízo ou não para questionar sua legitimidade. Aliás, nesse sentido, quem não entrou em juízo confiou na lei, e não teria direito à eventual devolução pelo simples fato de não a ter questionado em juízo. É quase intuitiva a ofensa à isonomia.

Temos, ainda, um outro complicador que deveria afastar a modulação: a inércia do STF em apreciar os embargos de declaração fez com que muitas decisões transitassem em julgado em favor de milhares de contribuintes que já compensaram os valores indevidos. Como ficarão esses contribuintes em caso de modulação? Terão de devolver os valores? Em tempos de crise econômica e pandemia, como justificar uma tal atitude para esses contribuintes?

Pelos pontos já citados acima, o leitor já deve ter entendido que, em relação ao tema da modulação dos efeitos da declaração de inconstitucionalidade, concluo pela sua inaplicação em matéria tributária. Em 2010, publiquei um livro, Inconstitucionalidade e Tributo, onde reforço que a declaração de inconstitucionalidade da cobrança de um tributo não se enquadra nas hipóteses legais que autorizam a modulação, quais sejam “segurança jurídica” ou “excepcional interesse social”. Em última análise, eventuais modulações deveriam ser apreciadas caso a caso, no plano concreto, em ações individuais, não pela pena abstrata das decisões plenárias do STF.

Há ainda uma questão de ordem sobre a qual, infelizmente, tenho pregado no deserto. O Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil ajuizou a Ação Direta de Inconstitucionalidade 2.258, na qual se pede que seja declarada a inconstitucionalidade do artigo que permite ao STF modular os efeitos de suas decisões (artigo 27 da Lei 9.868/69), tal como se está pretendendo fazer no caso aqui sob análise. Até o momento, o placar está empatado: dois votos para cada lado. Em outras palavras, o STF ainda está por decidir, e o placar está equilibrado, se é possível modular os efeitos de suas decisões.

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Recapitulando: um dos requisitos para a modulação de efeitos é a segurança jurídica. Se o Supremo Tribunal Federal deseja segurança jurídica, deve concluir antes o julgamento da inconstitucionalidade sobre modular os efeitos de suas decisões. É preciso decidir antes de aplicar, sobretudo sem o devido critério, esta modulação.

Não se nega que o impacto orçamentário é grande na chamada “tese do século”. Mas impacto orçamentário grande não é cláusula que autorize alterar os efeitos da inconstitucionalidade no tempo.

O Brasil está sofrendo com tantas idas e vindas na arena fiscal, reduzida a um balaio conflituoso de interpretações que comprometem a segurança jurídica. E, junto com ela, o investimento privado nacional, o investimento estrangeiro, e a vontade de construir um país sério. É preciso garantir a restituição tributária a quem de direito, respeitando o Código Tributário Nacional e, sobretudo, a nossa Constituição.

Dalton Dallazem é advogado especialista em Tributação Internacional, doutor em Tributação Internacional pela University of Florida (EUA) e em Tributação Doméstica pela UFPR.

Infográficos Gazeta do Povo[Clique para ampliar]
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