É preciso fazer uma advertência aos homens livres, de apelo à razão e à paz entre brasileiros, como dizia Jean Jaurès: “Ante esse pânico louco as multidões podem ceder e não é impossível que a ele também possam ceder os governos. Estes passam o seu tempo (delicioso emprego) a se assustarem uns aos outros e a se tranquilizarem uns aos outros”. Em 31 de julho de 1914, o mesmo dia em que saiu publicado esse seu artigo, chamado “Sangue frio necessário”, Jaurès foi assassinado.
É crescente a violência de linguagem e de atitudes por parte do governo federal, e a crescente influência da mentira – ou melhor, da deformação da verdade – quando se manifesta publicamente. Mas nada nos deve impedir de ver a realidade tal qual se apresenta. E a realidade é muito dura. De nada adianta à paz o inventário dos mortos. Já é tempo de nos convencermos de que a luta com que nos defrontamos é de sobrevivência, pois nem se trata de garantir o progresso do país, e sim de lhe garantir ao menos a possibilidade de progredir.
No plano político, deveremos deixar de ilusões com uma democracia formal, que apenas serve, hoje, para assegurar aos que estão no poder todos os meios indispensáveis à liquidação dos esboços aí penosamente levantados pelos pioneiros da nossa organização democrática. Há de se cassar, ainda que tarde, o mandato presidencial via impeachment ou pelo TSE. Pois chega de representar a comédia da democracia, enquanto se deixa que esta perca as bases necessárias à sua formalização no país.
Dilma não censurou o indigitado dirigente da Contag; ao contrário, foi abraçá-lo
Há dias assistimos, horrorizados, a um dos chefes “sem-terra”, no Palácio, em manifestação de apoio à presidente, dizer asneiras assustadoras, intimidando os agricultores, ameaçando invasão de terra e atos de violência, a mesma ladainha de sempre. Ocorre que desta vez falou e foi apoiado pela Presidência da República sem qualquer admoestação. Esta fala impressionou, pois é como se fosse dado passe livre às invasões de terra. Ela soou como intimidação a todos os brasileiros do campo, que têm sustentado este país nas agruras que passamos no momento. É o único setor produtivo do país.
E o mais fantástico: dentro do palácio presidencial, o chefe sem-terra foi ovacionado por uma plateia de verdadeiros analfabetos e de líderes que apoiam uma revolução que quer destruir a democracia, conquistada a duros revezes e com verdadeiro sofrimento. A presidente não censurou o indigitado dirigente; ao contrário, foi abraçá-lo, como se ali estivesse obtendo um apoio à sua permanência no poder, demonstrando assim ser uma idólatra de si mesma. É o que acontece com muita gente. Namora tanto o poder que vira Hitler, Fidel Castro...
Ser governo não é um sistema, como tem sido aqui, de privilégio. Ser governo é uma forma de servidão. Deve-se ter pouco respeito por quem diz estar fazendo um sacrifício; trata-se de um impostor ou uma impostora.
Dias atrás, como fruto da incompetência e da inconsequência de quem exerce o cargo de presidente, deu-se um choque entre soldados e militantes do MST: resultado, dois mortos e vários feridos. A quem se deve creditar este infausto acontecimento? Evidentemente, à presidente da República, que ouviu calada as ameaças e depois foi abraçar a quem falou uma série de disparates. Ela incitou a desordem ao calar, e o abraço representou um apoio.
A incitação ao crime por um presidente da República é crime, e a Procuradoria-Geral da República deveria ter se manifestado. Não o fez, e isso gerará a intranquilidade ao campo, pois se fala em outras invasões programadas para este mês.
Tudo isso para chegarmos à seguinte conclusão: o que constitui perigo imediato, e que deve ser extirpado com firmeza, para implantar no país essa confiança que está nos faltando tanto internamente quanto internacionalmente, é a raiz plantada por medíocre governo do fascismo, aquele mais sutil e deletério, que se infiltrou como um veneno na vida brasileira, às vezes em nome de Deus, outras vezes em nome da revolução, mas sempre em nome da miséria e da fome.