Quem conhece a Amazônia identifica melhor as causas do desmatamento, originadas, principalmente, pela forma como a região foi ocupada, em uma época em que a própria lei estimulava a derrubada da selva. Hoje, carvoarias, madeireiras, assentamentos, produtores rurais e a população que vive da floresta dividem, em vários níveis, a responsabilidade pela redução gradual do bioma. No entanto, o Estado brasileiro merece, também, uma parcela de culpa por ter subestimado a importância da Amazônia no passado.
Sabemos que não é preciso derrubar mais árvores na Amazônia para expandir a agropecuária brasileira, mas o mero congelamento da atividade não garantirá a preservação da floresta. O desafio, no entanto, é dimensionar o nível de responsabilidade de cada agente, adotando alternativas sustentáveis, e viáveis economicamente, que contribuam para o equilíbrio entre o homem e a natureza.
A regularização fundiária da Amazônia e a legislação ambiental contribuem para engessar o debate sobre as melhores alternativas para a região. Por exemplo, até 2001, o Código Florestal obrigava os produtores a preservar 50% da área, e não 80%, como atualmente. Quem derrubou a metade da propriedade, passou a ser obrigado a reflorestar. Foi o que aconteceu com os assentamentos incluídos, recentemente, na lista dos maiores desmatadores da Amazônia.
Vale lembrar que a legislação ambiental contempla o território nacional, mas não considera as diferentes realidades, nem as regiões nas quais a agricultura se instalou há décadas. Se as normas forem cumpridas à risca, praticamente, a metade das propriedades rurais do Centro-Sul do país, no qual a agropecuária está consolidada, está ou estará fora da lei.
Outra questão é a existência de duas Amazônias, constantemente, confundidas: a do bioma e a legal. Sobre o bioma amazônico, é simples, abrange a marca da floresta, embora registre outros sub-biomas; já a Amazônia Legal é uma ficção geográfica, fruto da busca pelos benefícios fiscais da União por parte dos estados vizinhos à floresta. Alguns destes com parte predominante dos territórios fora do bioma amazônico, principalmente, no Centro-Oeste, onde estão os biomas de cerrado, de pantanal ou de caatinga.
No que se refere ao agronegócio, repito, o Brasil tem alternativas para a expansão. Há estudos técnicos apontando para o uso preferencial de áreas agricultáveis, atualmente, ocupadas por pastagens e que se encontram em vários níveis de degradação. E isso deve acontecer fora do bioma amazônico. Basta lembrar que a pecuária utiliza 200 milhões de hectares em todo país para um rebanho estimado em 180 milhões de cabeças de gado.
Ninguém em sã consciência discorda que esta distribuição pode ser refeita e até incentivada pelo governo federal. A questão, no entanto, é que há áreas degradadas na região e que poderiam ser recuperadas com culturas perenes, como o dendê e outras espécies nativas, que, além de seqüestrarem positivamente carbono da atmosfera, recuperam o solo e geram milhares de empregos.
Compreende-se que a defesa da Amazônia exija uma posição protecionista mais rígida. Isso não pode impedir, porém, que ignoremos áreas agrícolas consolidadas há gerações, sem encontrar formas de flexibilização do uso do solo. Ambas as posições são necessárias para alcançarmos o desenvolvimento sustentável que a Amazônia e sua gente merecem.
Reinhold Stephanes é ministro da Agricultura, Pecuária e Abastecimento.