Dez anos após a aprovação da Lei de Arbitragem, assiste-se na sociedade brasileira, como era previsível, lenta, mas incisiva adesão às formas alternativas de solução de controvérsias. Ainda sob efeitos nocivos da década perdida, os anos 1980, em ambiente político-jurídico atrasado e hostil a inovações, o autor da Lei 9.307/96 afirmava, quando de sua promulgação, em 23 de setembro de 1996: "... A lei está feita, agora resta converter os espíritos".
Ao considerar as dezenas de meses em que a Lei Marco Maciel esteve sub judice no Supremo Tribunal Federal, quando se debatia sua constitucionalidade e sua legalidade, tal conversão de espíritos parece não ter sido fácil. Como àquela altura todos os países de algum progresso já utilizavam a arbitragem de forma comezinha, tratava-se de saber, no Brasil, se as democracias ocidentais, sem exceção, estavam certas ou erradas.
A modernidade tem sido célere em seus avanços. Hoje, mesmo a União adere e participa de numerosos juízos arbitrais no plano externo, o mesmo a ocorrer com empresas públicas (desde que autorizadas legalmente a fazê-lo, em nossa iridenta opinião) como é o caso da Petrobrás. No plano interno, por sua vez, verifica-se formidável dinâmica em prol da utilização da arbitragem, a ganhar espaços inauditos, como na solução de conflitos derivados das relações de consumo.
Conveniente para empresas e clientes, o árbitro, escolhido pelo alvedrio dos contendores, passa a decidir as causas como se juiz fosse, de forma motivada e imparcial, no molde das sentenças judiciais, mas sem possibilidade de recurso. Enquanto Procons e Juizados Especiais julgam tais processos em um ou dois anos, as arbitragens se exaurem em não mais que 30 dias.
Com significativa repercussão nas custas, a opção arbitral permite, ainda, outras vantagens ao empresário, como a fruição do sigilo do julgamento, em prol da imagem e da marca comercial, diante da opinião pública, de órgãos fiscalizadores e da concorrência. A arbitragem reforça, ademais, a posição de credibilidade do proponente, que renuncia a vantagem de escudar-se no emaranhado imponderável do processo formal, com a tradicional solução: "Vá procurar os seus direitos". Para o consumidor, a via arbitral fulmina sua proverbial fragilidade diante do comerciante ou do empresário, ao ver-se investido do poder de escolher seu próprio juiz.
A única vedação, conforme nosso direito do consumidor, consiste em obrigar-se as pessoas à cláusula arbitral, com contratos direcionados e não devidamente negociados de forma clara, expressa e inequívoca. Não são apenas aspectos atinentes a custos, celeridade, sigilo e agilidade nos julgamentos e na celebração de acordos, sem injunções formais de Procons ou de instâncias ordinárias do Poder Judiciário, que prestigiam o instituto. Também atua para a superação de reservas à sua utilização, tanto a formações universitárias, a incluir disciplinas específicas sobre o tema, como o trabalho desenvolvido pelo Conselho Federal da OAB e por suas seccionais em todo o Brasil.
Nas relações de consumo, a arbitragem tem sido forma eficaz de encontrar meios conciliadores e garantidores de soluções equilibradas e construtivas. Urge, de resto, conforme lembra Arnold Wald, ao referir-se à arbitragem em geral, que se evite qualquer restrição à autonomia de vontade das partes, tanto na nomeação quanto na atuação de árbitros, salvaguardados os cuidados necessários para a prevenção do funcionamento de instituições inidôneas.
Jorge Fontoura, doutor em Direito Internacional, é árbitro em exercício na ICC/Paris e na Câmara de Comércio de Helsinque; vice-presidente do Centro de Estudos de Direito Internacional-Cedi/DF.
Deixe sua opinião