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Artigo

A arte do diálogo no Baixo São Francisco

Em fevereiro, quando a Procuradoria do Meio Ambiente pediu a cessação da Quadra Cultural na Rua Paula Gomes, o poeta e advogado Rodolfo Jaruga fez, entre amigos e frequentadores d’ O Torto Bar, uma observação que nos pôs a todos pensativos. O recurso à Justiça, disse Jaruga, é a declaração do fracasso da política. Quem vai bater às portas do Ministério Público é porque já desistiu do diálogo, ou nada espera dele, ou nem sequer pensou em tentar dialogar.

A reclamação da Procuradoria representou ao mesmo tempo um aviso e uma ameaça. O aviso de que os moradores estão incomodados. A ameaça de que a interdição da Quadra, liquidando uma iniciativa generosa e bem-intencionada, possa levar, num efeito dominó, a drásticas restrições e mesmo à destruição da intensa vida cultural que se abriga neste setor do São Francisco.

Ora, diante do conflito aparentemente insanável entre duas respeitáveis funções urbanas, lembramo-nos das possibilidades inscritas em dispositivo da Lei Orgânica de Curitiba. Com a criação, na região, de uma moldura institucional, tal como prevê o artigo 150, poderíamos obter as condições para a harmonização daquelas funções, e talvez mais que isso. O reconhecimento de que a região do Baixo São Francisco apresenta nítida vocação para a geração de entretenimento e cultura poderia ensejar, além da existência de um fórum permanente de entendimento, sob a mediação do poder público, extraordinárias oportunidades de desenvolvimento cultural.

Traduzida em petição ao Executivo e Legislativo municipais, a proposta de criação de um Setor Especial de Produção Cultural foi recebida com entusiasmo pelos empresários, artistas e frequentadores da área do Baixo. Também alguns moradores passaram a compreender que esse pode ser o melhor caminho, fora dos trâmites judiciais, para a defesa dos seus direitos.

Acompanhada de centenas de assinaturas, a proposta foi levada às autoridades e vem merecendo a atenção e os estudos técnicos de viabilidade por parte dos órgãos de coordenação cultural (FCC) e de planejamento (Ippuc).

No Legislativo, o presidente da Câmara, vereador Paulo Salamuni, dedicou longa audiência para ouvir os termos do projeto; também na Comissão de Urbanismo, presidida pelo vereador Jonny Stica, a proposta alcançou algum consenso e a decisão de encaminhá-la para a fase de audiências públicas.

A sensatez com que está formulada, a esperança que suscita, as possibilidades que inaugura vêm abrindo caminho para um novo tempo no Baixo São Francisco. Uma vez criado ali um perímetro experimental, fundado no conceito de arranjos urbanos locais e com sólida base no artigo 150 – uma área piloto para experiências em circulação, segurança, controle acústico, iluminação e limpeza, mas sobretudo na arte do encontro, com o apoio de moradores esclarecidos e satisfeitos –, outros Setores Especiais poderão cobrir o São Francisco, com suas diversas especializações, e alastrar-se pelo tecido da cidade.

A invenção do Setor Especial do Baixo São Francisco representará o triunfo do diálogo, a aposta na democracia, o investimento na capacidade criativa e no talento político dos agentes envolvidos. Uma construção político-administrativa que dará início a um círculo virtuoso na região e será uma conquista cívica de toda a Curitiba.

Jaques Brand é frequentador do Baixo São Francisco; Ieda Godoy é empresária; Pedro Cordeiro é morador do bairro.

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