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Será o Judiciário imune a irregularidades? Embora constituído de pessoas com alta formação jurídica, submetidas a concursos públicos e bem remuneradas, não podemos olvidar que o ser humano é suscetível a erros e equívocos

Nos últimos dias temos assistido a intenso debate entre associações de classe dos magistrados, ministros do Supremo Tribunal Federal e o Conselho Nacional de Justiça. Na realidade, a queda de braço vem sendo sustentada, no lado do CNJ, pela força e determinação da ministra Eliana Calmon, corregedora empenhada em trazer a luz sobre o Poder Judiciário, sabidamente o mais refratário quando se trata de processos de transparência.

Não há, porém, o que contestar: a transparência deve ser a regra para que sejam eliminadas as fúnebres caixas-pretas.

No Legislativo e no Executivo temos o voto, como exercício de cidadania e escolha de nossos representantes. E aos poucos surgem mecanismos, como a Lei da Ficha Limpa, destinados a melhorar a sua performance. Aqui mesmo, no Paraná, a sociedade levantou-se contra os gravíssimos desvios praticados na Assembleia Legislativa, por falta de transparência. Essa fiscalização resultou na economia de R$ 90 milhões, apenas em 2011.

Ainda no Paraná, a Câmara Municipal de Curitiba dá mostras de como não fazer, deixando de punir a afronta aos bons princípios que devem reger a administração pública. Também ali, como na Assembleia Legislativa, os dados eram mantidos entre quatro paredes.

No Executivo temos exemplos dos mais variados escândalos. A presidente Dilma Rousseff parece caminhar no sentido da intolerância quanto aos malfeitores, mas ainda está sob prova e só o tempo indicará para que lado pesará a balança.

Será o Judiciário imune a irregularidades? Embora constituído de pessoas com alta formação jurídica, submetidas a concursos públicos e bem remuneradas, não podemos olvidar que o ser humano é suscetível a erros e equívocos. Conforme a sua personalidade poderá deixar-se influenciar pelas tentações. E elas se manifestam em todas as classes, das quais não estão excluídos os juízes. Porém, de todos exige-se tolerância zero à corrupção.

A criação do Conselho Nacional de Justiça em 2005 foi um divisor de águas. Se antes não havia registros de punições, após o advento do CNJ vários casos foram apreciados, com magistrados retirados de suas funções. Alguns levados à aposentadoria, à falta de outra disposição legal que possa impor o afastamento sem qualquer remuneração. Se antes a contemporização era a característica, a partir do CNJ houve grande mudança.

Combatido antes mesmo da sua criação, pelo temor de interferência interna, o CNJ nasceu como órgão destinado ao controle externo do Judiciário. Com esta missão, tem incomodado juízes, gerando a reação corporativa.

Boa parte dos críticos ainda não acordou para a grande vantagem trazida pelo Conselho, considerando-se que será melhor para a magistratura o pleno esclarecimento de eventuais irregularidades. O futuro se encarregará de mostrar que a imensa maioria do Judiciário é integrada por pessoas de bem. Ao final, a atuação do CNJ reafirmará a dignidade da boa magistratura.

A ministra Eliana Calmon está imbuída dos melhores propósitos. Mostra-se preparada e determinada para a difícil missão que abraçou, merecendo todo apoio. Foi aplaudidíssima recentemente em Curitiba, na Conferência Nacional dos Advogados. Viu-se ali uma mulher corajosa, que antevê na sua ação o bem da Justiça.

Para tanto, é fundamental que não se retirem do CNJ os poderes concorrentes às corregedorias estaduais, que na maioria não se mostraram suficientemente ágeis para enfrentar e julgar determinadas situações envolvendo seus pares.

A decisão liminar de ministros do STF, por ora, retirou parte das funções do CNJ. Foram suspensas 54 investigações em curso. Não serão verificadas as razões para a movimentação anormal em várias contas correntes de magistrados e familiares. São exemplos de prejuízos que as amarras impostas, ainda que temporariamente, já estão causando.

Há no ar grande preocupação com a possibilidade de esvaziamento da competência do CNJ. Um órgão essencial, que tem contribuído para que conheçamos inteiramente a Justiça brasileira, com suas qualidades e seus defeitos, permitindo aperfeiçoá-la. Esse ideal de melhoria não pode ser a utopia que, segundo Eduardo Galeano, é como o horizonte: ao darmos um passo em sua direção, ele fica um passo mais distante.

Vivamos sem utopias, permitindo que o Conselho Nacional de Justiça, ao desvendar a caixa-preta do Judiciário, cumpra o seu relevante papel.

José Lucio Glomb é presidente da Ordem dos Advogados do Brasil – Seccional do Paraná.

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