No dia 15, foi publicada na imprensa uma carta aberta, subscrita por 105 juristas, professores e advogados, denunciando o que chamam de “regime de supressão episódica de direitos e garantias verificado na Operação Lava Jato”, a saber: “à presunção de inocência, ao direito de defesa, à garantia da imparcialidade da jurisdição e ao princípio do juiz natural, o desvirtuamento do uso da prisão provisória, o vazamento seletivo de documentos de informações sigilosas, a sonegação de documentos à defesa dos acusados, a execração pública dos réus e a violação às prerrogativas, dentre outros graves vícios”.
Em entrevista no dia seguinte, publicada pela Folha de S.Paulo, um dos signatários tentou suavizar a abrangência da carta, dizendo que não há um ataque ao Poder Judiciário como um todo, embora mantenha a ideia de que há uma execração pública, pela exposição midiática dos acusados, e que isso geraria um constrangimento aos membros dos tribunais superiores e do próprio Supremo Tribunal Federal se não seguirem o entendimento das chamadas instâncias inferiores.
A carta recheia de adjetivos depreciativos a conduta do primeiro ao último escalões da Justiça
Ora, a carta – não é preciso ser operador do direito para entendê-la – recheia de adjetivos depreciativos a conduta do primeiro ao último escalões da Justiça, não considerando que inúmeras questões, como as ali denunciadas, já foram objeto de habeas corpus interpostos contra as decisões do primeiro grau e, na sua quase totalidade, não tiveram solução favorável liminarmente.
Esta celeuma me fez lembrar de um famoso advogado gaúcho, já falecido, quando dizia que o criminalista deveria ter em casa um altar para venerar o delegado de polícia, o promotor de Justiça e o juiz, porque dos seus erros e acertos dependeria a sua própria sobrevivência. E, indagado sobre a possibilidade de o advogado não ter sucesso em relação à defesa de seu cliente, respondia: ou a causa do cliente não era uma boa causa, ou os argumentos lançados no processo não eram eficientes. Por isso, o defensor ou usava exaustivamente o emaranhado das regras do processo, para diminuir eventual pena ou até conseguir a prescrição da pretensão punitiva, ou ambos se desapegavam um do outro – o cliente, porque insatisfeito; e o advogado, por não ter mais argumentos para a defesa . Estas, talvez, sejam as alternativas que se apresentam aos envolvidos na Operação Lava Jato e aos seus procuradores, em vez de lançarem graves acusações ao Poder Judiciário como um todo.
Por outro lado, o silêncio da OAB sobre a carta é eloquente. Se tudo o que foi dito é verdadeiro, só para argumentar, a iniciativa deveria ter sido dela ou por ela encampada. Nada aconteceu. Mais: se há a contaminação denunciada, cuja gravidade e abrangência a carta revela, ela não é só episódica como afirmam seus signatários; ela é sistêmica e, por isso, há o dever legal e constitucional, enquanto exercentes de função essencial à Justiça, de buscar o restabelecimento da ordem em instância além das que o Poder Judiciário brasileiro oferece: a Corte Interamericana dos Direitos Humanos, resultante do Pacto da Costa Rica, da qual o nosso país é signatário e pela qual está sujeito a eventuais sanções. Se esta alternativa não for exercitada, os signatários da carta correm o risco de perda de credibilidade do que afirmam e de o episódio passar à história como choro de perdedores.