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No início deste ano os curitibanos foram surpreendidos com notícias que davam conta de uma invasão à histórica Igreja do Rosário, localizada na região do Largo da Ordem, na capital paranaense. O protagonista desse incidente foi o então vereador Renato Freitas (PT).
Não faltaram curitibanos revoltados com o ocorrido, ainda que não ligados à fé Católica ou posições partidárias específicas. O produto dessa indignação abrangeu, entre outras coisas, orações em frente à Igreja do Rosário, posts de enérgica reprovação à conduta do então parlamentar e manifestações populares.
Mas, será que aqueles que não concordaram com a atitude de Renato Freitas estavam restritos a essas reações, ou poderiam ter feito algo diferente?
A resposta curta é sim, tanto que eu e meu sócio Matheus Guérios reagimos a esses fatos com um pedido de cassação do agora ex-vereador, que foi processado com base em nossa representação, em conjunto com outros requerimentos apresentados por vereadores, o que culminou em sua cassação.
Ainda que eu e meu colega sejamos advogados, não foi a nossa profissão que nos permitiu apresentar esse pedido, mas – sim – um direito que é garantido a qualquer cidadão. Entretanto, como poucos sabem que possuem esse direito, é oportuno falar sobre o tema quando um episódio destes vem à tona.
A primeira coisa a ser entendida é que, segundo norma vigente no município de Curitiba, “qualquer pessoa é parte legítima para requerer à Mesa representação em face de vereador que tenha incorrido em conduta incompatível ou atentatória ao decoro parlamentar, especificando os fatos e as respectivas provas”.
Ou seja, qualquer um, diante de ato que fira o decoro parlamentar que todo vereador deve respeitar, pode solicitar à Câmara que a conduta do parlamentar seja apurada e que, como consequência, seja imposta até mesmo a punição de cassação, como foi o caso de Freitas.
Mas por que alguém faria isso? Os agentes políticos não estão acima da lei. Vereadores, deputados e senadores são eleitos por todos nós para atuarem como nossos representantes no exercício do Poder Legislativo, na produção de normas aplicáveis a todos nós. Então, se alguma dessas pessoas que elegemos para nos representar age em desconformidade com suas obrigações de decoro, não parece fazer sentido que possamos nos insurgir contra isso por meio de uma representação de cassação?
Evidentemente que sim e vale citar que isso já aconteceu em outras situações. Um exemplo é o caso do deputado paulistano Arthur Moledo do Val e suas grotescas mensagens de áudio a respeito das mulheres ucranianas.
E o direito de questionar atos estatais e políticos não está restrito a representações contra um parlamentar, uma vez que a Constituição Federal garante a possibilidade de cidadãos proporem ações populares para anular atos lesivos ao patrimônio público, à moralidade administrativa, ao meio ambiente e ao patrimônio histórico e cultural.
Da próxima vez que você, cidadão, se revoltar com a atitude de algum agente político ou estatal, não precisa esperar pelas próximas eleições para exercer seu direito constitucional. Em muitas situações, você pode ajudar a restabelecer a ordem muito antes disso.
Lincoln Domingues é advogado e sócio do escritório L. Domingues.