A prorrogação da CPMF por mais quatro anos volta à berlinda. E, como antes, gerando controvérsias, protestos e discussões apaixonadas. O governo federal quer mantê-la tal e qual, desvinculando-a do processo mais amplo e complexo de reforma tributária, como aliás fez em 2003. Os estados e municípios apóiam sua permanência, desde que haja partilha da sua arrecadação. No Congresso, a oposição, especialmente PSDB e DEM, advoga a redução da alíquota, mantendo o tributo apenas com finalidades fiscalizatórias (mecanismo auxiliar de controle da renda tributável). E há ainda os políticos de partidos aliados que a usam como moeda de troca na barganha por cargos e prebendas (vide Furnas). Já os contribuintes, cuja opinião, claro, é a menos ouvida, gostariam de pura e simplesmente vê-la morta e enterrada. Enfim, há posições para todos os gostos.
Comecemos pela extinção da CPMF. Hipótese altamente improvável. Basta ter presente que seu valor representa um percentual significativo das receitas tributárias da União, superior ao do IPI. Nesse sentido, eis alguns dados expressivos divulgados pela Receita Federal:
Por isso, tendo em vista o imperativo do equilíbrio fiscal, um alerta aos que propugnam a eliminação do tributo: cuidado com o que desejam! Tanto mais diante do período de volatilidade financeira global que acaba de ter início, não tem data marcada para terminar, e que já está afetando nossos mercados financeiro e de capitais. Avançar nessa direção, de redução da CPMF e da carga tributária em geral, exige que Congresso, governo e sociedade estejam preparados para cortar as despesas correntes e de custeio, para prosseguir na reforma do nosso sistema previdenciário. Estarão? O mesmo raciocínio se aplica a uma redução significativa da alíquota da CPMF.
Quanto à pretensão de partilha da CPMF entre União, estados e municípios, esta mostra-se útil e necessária na inadiável transformação do ICMS em IVA-estadual (ao lado de um IVA-federal): a CPMF pode desempenhar um papel de rede de segurança para atenuar as quedas de arrecadação que a entrada em cena do IVA-estadual, com regulamento nacional, incidência no destino e ampla não-cumulatividade, pode trazer para alguns estados. Nessa linha, um adicional de 0,12% na alíquota da CPMF seria instituído, por um período de cinco anos, com o propósito exclusivo de compensar os Estados que perdessem arrecadação.
Ao mesmo tempo, de maneira a se atenuar o impacto desse aumento e tornar o tributo menos odioso, deve ser introduzida a possibilidade de os contribuintes, tanto pessoas físicas como jurídicas, compensarem ou abaterem a CPMF relativamente a outros tributos federais, como o imposto de renda e a contribuição previdenciária. Tal mecanismo poderia ser introduzido gradualmente, até um limite de 50% da alíquota de 0,38%, à razão de 10% por ano.
Em resumo, a proposta é esta: a CPMF torna-se permanente; a alíquota é aumentada de 0,38% para 0,50%, por cinco anos; os 0,12% a mais são distribuídos entre estados que tiverem perdas com a introdução do IVA-estadual; o contribuinte, paulatinamente, poderá compensar valor equivalente a 50% da parte destinada à União (0,19% em termos de alíquota). Ficaria assim:
Há, pois, uma alternativa viável para presença em nosso sistema tributário de um tributo permanente sobre a movimentação financeira, menos agressivo ao contribuinte e capaz de propiciar a conciliação de interesses para a reforma tributária mais ampla.
Porém, se a CPMF for simplesmente prorrogada por mais quatro anos, sem qualquer dessas amarras e condicionantes, a discussão séria da reforma tributária também o será, e assim sucessivamente, pelo período das demais prorrogações que naturalmente sobrevierem. Por isso mesmo, se as condições para um trato sério do tema ainda não se mostram presentes, uma alternativa seria fazer uma "miniprorrogação" do tributo, por apenas mais um ano, período no qual governo, Congresso e sociedade devem buscar atingir um denominador mínimo sobre os próximos passos da reforma.
Leonardo Sperb de Paola é advogado, professor da FAE Business School e presidente da Comissão de Direito Tributário da OAB/PR.