Quem nasceu antes o ovo ou a galinha? Esta pergunta feita como pilhéria, que brinca com as relações de causa e efeito pode ser transposta para a crise econômica e política vivida pelo Brasil neste momento. Quem surgiu antes, a crise econômica e ou a crise política? Difícil identificar um ponto inicial da atual crise brasileira em suas vertentes econômica e política para podermos afirmar quem antecedeu quem. Entretanto, podemos dizer que o conteúdo político da crise alimenta o econômico e vice-versa. Neste sentido o curto prazo desta crise é um nevoeiro intenso dentro do qual não vemos saída, e onde o acaso e a sorte se transformam em aspectos mais importantes que a racionalidade objetiva dos atores que buscam os rumos para a sua saída.

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No entanto a história, mais do que a análise da conjuntura atual, nos dá esperança que vamos sair do quadro de recessão econômica que vivemos e teremos um novo ciclo de crescimento, claro que desde que seja mantido um mínimo de estabilidade institucional no País.

Se não tivermos uma reforma política o processo de crise estará instalado na ação de parlamentares

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Esta afirmação não significa que basta esperarmos para que tudo se resolva, que independentemente do que façamos as coisas se resolverão de uma forma ou de outra. Se saímos da grande depressão de 1930, da crise do petróleo e da dívida externa dos anos 80, da crise cambial de 1999 e passamos pela crise internacional de 2008, foi porque muitos dentro e fora do governo agiram na busca de soluções. Desta vez não será diferente.

Diferentemente de outras crises econômicas por quais já passamos, a que estamos vivendo no momento tem forte conteúdo nacional, com origem no ordenamento político e no ordenamento econômico adotado pelo Estado e pelos governos brasileiros.

Quanto ao ordenamento político está bastante claro que o modelo eleitoral adotado a partir da Constituição de 1988 não tem levado às duas casas do Congresso Nacional pessoas que representem os interesses de seus eleitores. O poder econômico tem influenciado as eleições em tal monta que o espírito republicano praticamente foi despejado do Congresso Nacional, dando lugar a prática clientelista e a formação de “lobbies” de financiadores de campanhas.

Os parlamentares que votaram o impeachment da presidente Dilma Rousseff são os mesmos que meses antes aprovavam toda e qualquer medida que fosse mandada ao Congresso, desde que fossem mantidos seus cargos e seus negócios dentro do governo. Ao vislumbrarem uma chance de ampliar seu poder e ganhos viraram a casaca rapidamente.

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Se não tivermos uma reforma política o processo de crise estará permanentemente instalado na ação de parlamentares que condicionam o seu apoio político ao Poder Executivo ao recebimento de verbas e cargos que, por sua vez, sustentam as práticas de desvios de finalidades de órgão da administração pública e de empresas estatais, dando origem ao largo espectro da corrupção estatal brasileira.

No passado, para manter invisível o processo de corrupção, as entidades de controle e investigação eram mantidas inertes de maneira que a doença existia, mas permanecia oculta. Corroía a sociedade brasileira, mas era mantida em sigilo para não promover a ira popular. Esta prática parece que não será mais possível, portanto, para combater a corrupção que vem desorganizando todo o Estado brasileiro. Só resta a reforma política e vamos lutar por ela.

Quanto à política econômica vamos lembrar que vivemos na década de 80 e parte da década de 90 a praga da inflação que desorganizava todo o processo econômico brasileiro, principalmente a parte da economia voltada à produção e ao consumo interno dos brasileiros. Esta crise teve como efeitos mais deletérios a ampliação da miséria e da desigualdade econômica, cuja manifestação mais visível é a desordem urbana que vivemos nas grandes e médias cidades brasileiras até os dias de hoje.

Vencida a praga da inflação em 1994, o processo de estabilização econômica adotado na ocasião já trazia em seu bojo a nova doença da economia brasileira, os juros altos.

Os elevados juros pagos sobre os títulos da dívida interna brasileira no início do Plano Real tinham por objetivo atrair o capital especulativo internacional para promover a ancoragem cambial da economia e cobrir os déficits em contas correntes derivados da abertura comercial brasileira e da manutenção do real sobrevalorizado em relação às moedas conversíveis.

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Abandonada em 1999 como instrumento de controle inflacionário a âncora cambial foi substituída pelo regime de metas de inflação no qual os juros altos pagos pelos títulos da dívida pública foram mantidos como instrumento de política monetária para o controle inflacionário. O sistema financeiro percebeu nos juros altos uma fonte fácil e segura de lucros e com sua capacidade de influenciar as decisões do Banco Central e passou a atuar para manter as taxas de juros pagas pela dívida pública mobiliária brasileira em níveis estratosféricos. Nossas taxas de juros foram mantidas sempre como as maiores do mundo fazendo que, num período de 20 anos, os brasileiros pagassem através de impostos, com o chamado superavit primário, cerca de 10 vezes o valor devido no ano de 1994. E como não bastasse isso, tivessem o valor da dívida ampliada em cerca de 7 vezes.

Não há teoria econômica que dê sustentação à manutenção de juros e levados por períodos tão longos em uma economia, (sabe-se do poder desorganizador que os juros elevados em longos períodos exercem sobre o processo econômico), inibindo o investimento e o crescimento econômico gerando efeitos inflacionários no longo prazo pela restrição à ampliação do capital produtivo e a redução da renda potencial da economia, além de promover transferência absurda de renda de quem trabalha para quem não trabalha.

Os engenheiros, mais do que outras categorias profissionais, têm os seus empregos vinculados ao crescimento da renda nacional, medida pelo valor do PIB, e pela manutenção do nível dos investimentos. A recessão econômica e a redução dos investimentos, principalmente em infraestrutura, repercutem com maior intensidade na demanda por serviços de engenharia e, por consequência, no salário e nos empregos dos engenheiros.

Portanto, sempre que setores da mídia, sócia do rentistas do sistema bancário, enaltecerem os prodígios dos juros altos, sempre que defenderem a independência do Banco Central dos governos e a sua entrega total ao sistema bancário vamos reagir, porque estarão projetando nossa decadência como profissionais e instalando definitivamente no Brasil a prevalência do ganho rentista sobre o ganho do trabalho, projetando novas e constantes crises econômicas e sociais.

Valter Fanini é engenheiro civil, vice-presidente do Senge-PR e mestre em Desenvolvimento Econômico pela UFPR.