• Carregando...
 | Griszka Niewiadomski/Free Images
| Foto: Griszka Niewiadomski/Free Images

O corte generalizado de investimentos por parte do governo federal compromete a retomada de programas estratégicos, como o de ampliação do acesso ao ensino superior. Ações do Ministério da Educação expressas por portarias em 2017 deixavam claro que tanto os juros para estudantes que pretendiam valer-se do Fies quanto a participação das instituições de ensino superior (IESs) nos financiamentos seriam maiores. Ao esvaziar o programa, o governo buscou alternativas. E elas não são boas para a educação.

Sem recursos para proporcionar financiamento estudantil de baixo custo, o governo federal passou a liberar, autorizar e dar automonia às IES para a oferta de programas na modalidade a distância. A liberação se dá com base no Índice Geral de Cursos (IGC) e autoriza IES com nota 5 a abrir, sem visita de avaliação, até 250 polos EAD ao ano; as que têm nota 4 podem abrir até 150 polos; as com nota 3, até 50 polos. Ocorre que existem apenas 36 IES com nota 5 no país: são 1,5% das 2.407 existentes. Já as com nota 3 – patamar mínimo para a existência de universidades, centros universitários e faculdades – são 1.805 (66,7%). Se estas últimas abrirem todos os polos a que têm direito, serão 9.025 novas unidades ofertando cursos EAD já neste ano.

Se alguns grupos já praticavam mensalidade de R$ 49 em cursos presenciais, é difícil imaginar o que ocorrerá no ensino a distância

Desta forma, na busca por novos alunos, a maioria das IES e seus novos polos passarão a ofertar vagas com valores muito baixos. Se alguns grupos já praticavam mensalidade de R$ 49 em cursos presenciais, é difícil imaginar o que ocorrerá na modalidade EAD.

Boa parte desses polos nem sequer foi avaliada quanto a acessibilidade, iluminação, recursos tecnológicos e condições técnicas das instalações físicas, todos inerentes à educação a distância. Para praticar baixos preços e ampliar o atendimento de um dia para o outro, muitas IES têm se valido de plataformas livres, sem qualquer estrutura de usabilidade, para postar e publicar apresentações e textos em PDF.

A interação, o desenvolvimento de relações interpessoais, o trabalho coletivo, a posição de protagonismo na solução de problemas são deixados de lado para estimular a leitura básica de textos, a resolução de listas de exercícios e a entrega de trabalhos que nem sequer são monitorados e tutorados por especialistas.

Leia também: Não é inteligente cortar verbas de ciência e tecnologia (artigo de Ricardo Marcelo Fonseca, publicado em 23 de agosto de 2017)

Leia também: O que está em jogo em uma universidade pública paga? (artigo de Marcelo Valério, publicado em 11 de outubro de 2017)

Antes que o impacto dessas ações seja mensurável, o Brasil mantém a constância na perda de posições no ranking mundial de universidades, o QS World University Rankings by Subject. Em sua última edição, após quatro anos de quedas sucessivas, o país perdeu a liderança na América Latina para o México. Apenas 13 departamentos de universidades nacionais figuram entre os 50, dois a menos que no ano anterior. Nota-se também quedas significativas na área de Engenharia, o que ocorre simultaneamente com o corte de 44% do orçamento para ciência e tecnologia.

Obviamente, as universidades ranqueadas são públicas e estas são sucateadas pela falta de políticas de investimentos em pesquisas e patentes. As privadas nem sequer aparecem entre as 100 melhores da região. A liberação de cursos sem qualquer avaliação, com base no princípio de que a nota 3 significa qualidade, acelera a banalização do ensino superior. A atração de alunos com base apenas em preços baixos, acompanhada pela baixa remuneração a professores, falta de apoio ao estudo e ausência de organização metodológica, acelera a desvalorização generalizada do bem mais significativo que um cidadão pode possuir: o seu saber.

Cesar Silva é presidente da Fundação FAT.
0 COMENTÁRIO(S)
Deixe sua opinião
Use este espaço apenas para a comunicação de erros

Máximo de 700 caracteres [0]