Depois de, dias atrás, comentar alguns aspectos da reportagem do Le Monde sobre Curitiba, atenho-me hoje ao sistema de transporte da cidade, idealizado e implantado na sua concepção básica, nos anos 70. Tratava-se do corolário lógico da introdução do sistema trinário que é de conhecimento de todos os curitibanos. Essa ideia, elaborada pelo Ippuc em substituição a uma via ampla de grande velocidade unindo pontos de concentraçao comercial e serviços (projeto Serete), é uma das diretrizes fundamentais para o crescimento e desenvolvimento da cidade. Implantado o Eixo Norte-Sul, terminais foram construídos a fim de receber ônibus alimentadores que conduzem os passageiros para o eixo e para o destino final quando este não está sobre o eixo. Este modelo prevalece até hoje e não há razão para mudá-lo.

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Com o passar do tempo, novos eixos foram acrescentados ao Eixo Norte-Sul inicial; a saber, Leste-Oeste e Marechal Floriano. Esses eixos foram ligados entre si por linhas especiais, sendo a Interbairros 2 uma das principais. Durante muito tempo a velocidade comercial média dos ônibus na canaleta (incluindo as paradas) era de cerca de 23-24 km/h. Com o tempo, o sistema perdeu velocidade. Hoje, 40 anos após a inauguração do "Vermelhão", a velocidade é de 16-17 km/h.

O sistema não submergiu devido ao peso do número de passageiros, mas sim pelos cortes do eixo, devido à passagem das vias transversais. Estas foram aumentando de número, e é isso que nos levou à situação atual. Esta diminuição de 30% na velocidade faz com que, na mesma proporção, sejam necessários mais ônibus para transportar o mesmo número de passageiros. Isso aumenta o número de ônibus na canaleta, provocando comboios nos semáforos, o que piora ainda mais a qualidade do serviço, fazendo com que a carga dos ônibus não seja uniforme.

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Essa situação, evidentemente, não passou despercebida às áreas de planejamento da Urbs e Ippuc e, ao longo do tempo, projetos foram preparados para saneá-la. Infelizmente, durante os últimos anos não houve investimentos no sistema. Às vezes, é necessário fazer. Fazer o que precisa ser feito, sem ficar preso à ideia de que tudo tem de ser criativo. Para se ter uma ideia do que pode e deve ser implantado, vamos citar somente projetos concluídos ou encaminhados sem nenhum apelo a novas e brilhantes soluções criativas:

1. A expansão do desalinhamento para todos os eixos: o "desalinhamento" é uma solução que permite a ultrapassagem de veículos numa via de 7 metros e a introdução de um sistema de ônibus diretos e paradores, fazendo com que o sistema volte a circular com a velocidade média superior àquela inicial. O Eixo Boqueirão opera hoje com uma velocidade média de 28 km/h.

2. Implantação de sistemas eletrônicos que minimizem as paradas nos semáforos das canaletas e indiquem o tempo de chegada e carregamento dos ônibus.

3. Aumento da frequência dos alimentadores, mesmo que para isso seja necessario um subsídio.

4. Término dos trabalhos para o desalinhamento do eixo Norte-Sul e da adaptação do Terminal Santa Cândida, indispensável para a

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interceptação dos ônibus provenientes de Colombo.

5. Priorização do Inter 2

6. Término da Linha Verde com a implantação de duas linhas expressas ligando o Terminal do Maracanã ao Centro e ao Pinherinho.

7. Faixas exclusivas para dar prioridade ao transporte coletivo, e obra única em qualquer sistema sobre pneus no mundo, a construção do Terminal Central Slaviero, interligando todos os eixos e permitindo a transferência de passageiros para qualquer outro eixo.

Este conjunto de obras, além de eliminar grande parte dos problemas atuais, prolongará por muito tempo a vida útil do sistema sobre pneus e, aliado às adaptações que certamente o futuro exigirá, vai torná-lo permanente. Grandes mudanças tecnológicas no futuro podem determinar sua substituição, mas essas não são as atualmente pensadas.

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O artigo do Le Monde afirma também que as estações-tubo são muito estreitas. Na realidade, não são estreitas, mas curtas; devem ter o tamanho aumentado para se adaptar ao número de portas do biarticulado.

E, finalmente, o curitibano não foi "empurrado" para o automóvel somente pelas deficiências do sistema de transporte. O número de automóveis não teria tido o crescimento exponencial que teve não fora a política do governo federal, que, com o subsídio às montadoras, crédito abundante e prazos longos, permitiu que as classes média e emergente pudessem adquirir veículos que, além do conforto, são também um símbolo de status. Quanto às horas de dificuldade que esses veículos estão provocando na circulação, um ajuste na sincronização dos semáforos ajudaria muito. Sobre a afirmação do artigo de que os empresários impedem a implantação do metrô e das ciclovias, creio que, sem fazer qualquer juízo sobre os problemas dos e com os empresários, eles não têm nenhuma realção com a construção do metrô ou das ciclovias.

Quanto à tarifa, ela é atualmente de R$ 2,70 para os usuários (passageiros pagantes), sendo que a tarifa técnica recebida pelos empresários, em que pesem as conclusões da CPI e as declarações do Tribunal de Contas, continua sendo de R$ 3,18. Essa diferença entre a tarifa paga e a recebida pelos empresários gera um subsídio de R$ 12 milhões/mês, dos quais R$ 7 milhões são pagos pelo governo do estado e R$ 5 milhões, pela prefeitura, visando à manutenção da integração metropolitana. Afirmar que a tarifa de R$ 2,70 está entre as mais elevadas do país também é especulação. A tarifa de Curitiba é inferior à de oito capitais e de 12 cidades médias importantes (como Campinas, Joinville, Campo Grande etc.)

Definem a tarifa de Curitiba dois fatores importantes: o número de pagantes, que corresponde a cerca de 50% dos passageiros transportados; e a integração, que permite que com a mesma tarifa o passageiro possa fazer diversas viagens dentro do sistema. Se considerarmos um caso extremo, um passageiro embarcado em Itaperuçu pode chegar a Contenda, percorrendo 70 km, pelo preço de R$ 2,70. Trata-se de um subsídio enorme oferecido a uma grande parte da população da região metropolitana. Uma quase transferência de renda. Quem paga por isso? Os governos, estadual e municipal, e a população de Curitiba.

Não se pode desintegrar a Região Metropolitana, mas é preciso pensar numa solução para o problema, passando a considerar Curitiba não como um ente isolado, mas como membro de um grande aglomerado urbano que, através de um planejamento consistente, possa dividir entre si direitos e deveres. O transporte, que deverá ser pensado como um grande elo de ligação deste conjunto, terá de ter, num futuro próximo, os custos repartidos proporcionalmente entre todos.

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Para terminar estas considerações, não posso deixar de abordar dois temas de extrema importância. O primeiro deles é o metrô. Considerando o estado atual de avanço do projeto, qualquer manifestação de minha parte poderá parecer despropositada, e até mesmo romântica. Entretanto, mesmo como um registro para o futuro, não posso deixar de me manifestar. Através de declarações nos jornais tomamos conhecimento de que todos os problemas que poderiam afetar o metrô foram discutidos, pensados e encaminhados, que o custo-benefício foi verificado, que o poder da municipalidade sobre o projeto e obras foi estabelecido, que as economias foram feitas a fim de adequar o projeto ao custo previsto. Mas a pergunta fundamental continua sem resposta: é o metrô necessário?

Não vou repetir aqui argumentos que já foram citados em outras ocasiões, como o aumento da capacidade do sistema desde que implantadas as medidas citadas neste artigo. Contudo, um fato é preocupante: a tarifa do metrô. Na evolução do projeto do metrô, o mesmo se inicia com uma linha Sul-Centro e evolui para praticamente duas linhas com o acréscimo da Centro-Cabral. As linhas do Eixo Sul transportam hoje cerca de 270 mil passageiros/dia útil, e as linhas do Norte, 130 mil passageiros, perfazendo um total de 400 mil passageiros/dia útil. Esses números, porém, só foram somados um ao outro – o que não é correto – na tentativa de se justificar os investimentos e definir a tarifa de equilíbrio econômico. Ninguem pensaria em fazer um metrô para 130 mil passageiros.

Isso torna a comparação das tarifas muito importante. Não se pode comparar a tarifa do metrô – R$ 2,45 (segundo declaração aos jornais) –, que é cobrada por pessoa, incluindo todos os passageiros, pagantes, idosos e demais isentos, com a atual tarifa técnica de

R$ 3,18 cobrada pelos ônibus, que inclui somente os pagantes. Se essa tarifa fosse dividida pelo número total de passageiros, ela seria inferior a R$ 1,60. Especificamente no Eixo Norte-Sul, em função do tamanho dos ônibus, esta tarifa não passaria de R$ 1,20. É esta a tarifa que tem de ser comparada à tarifa de R$ 2,45 do metrô, que receberá ainda uma parcela fixa para complementar o equilíbrio do custo operacional desse transporte. Se considerarmos esta parcela fixa de no mínimo 10% do custo operacional, o custo tarifário do metrô será de cerca de $ 27 milhões/mês, o que, comparado ao custo atual das linhas que serão substituídas pelo metrô, gerará um subsídio mínimo da ordem de R$ 20 milhões/mês. Isso valerá o custo, o incômodo que a obra vai causar, a substituição de parte de um sistema que é a marca de Curitiba e que não está obsoleto? Vale realmente a pena? Serão estes 17 km necessários?

A outra questão refere-se à existência de dois órgãos debruçados sobre o planejamento de Curitiba, o Ippuc e a Secretaria de Planejamento, que têm pontos de vista muitas vezes diferentes sobre as proposições urbanísticas. Um poder de veto conferido à Secretaria de Planejamento deixa o Ippuc refém não só da oportunidade, mas do exame de seus projetos, nos quais interfere a Secretaria de Planejamento. Esse problema, iniciado na administração passada, aumentou nesta. O Ippuc, tendo sofrido com a falta de visão de diversas direções, esperava iniciar uma recuperação que lhe acrescentasse novos quadros aos já existentes e a volta daqueles que estão a serviço de outros órgãos, estimulando assim sua capacidade, criatividade e o reconhecimento de sua primazia no planejamento urbano de Curitiba. O Ippuc foi praticamente alijado das grandes decisões urbanas, e é muitas vezes criticado pela sua inoperância. Mantida a Secretaria de Planejamento, será necessário delimitar claramente o campo das duas instituições, tendo a clareza de atribuir ao Ippuc reformado o planejamento urbano de Curitiba.

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Lubomir Fichinski, arquiteto.