A Autoridade Palestina demandará à Assembleia Geral da ONU que a Palestina seja reconhecida como o 194.º Estado Membro das Nações Unidas. Trata-se exatamente daquilo que Israel, Estados Unidos e Europa pretendem evitar
Em 1947, uma resolução da Assembleia-Geral da ONU determinara a criação de dois Estados, um para os judeus, outro para os árabes. O Estado de Israel fora imediatamente constituído, ao passo que o Estado palestino, 63 anos depois, ainda não saiu do papel.
A combinação do sentimento de exaustão histórica, aliado à paralisia nos processos de negociação de paz, às contínuas absorções de território palestino pela ocupação das colônias judaicas e ao momento delicado que vive a diplomacia israelense, levaram a Autoridade Palestina (AP), com o aceite discreto do Hamas, a buscar outras formas de solução do conflito para além das negociações diretas.
Amanhã, a AP demandará à mesma Assembleia Geral que a Palestina seja reconhecida como o 194.º Estado Membro da ONU. Trata-se exatamente daquilo que Israel, Estados Unidos e Europa pretendem evitar, muito embora a proposta formalize o tão reclamado reconhecimento de Israel pelos palestinos.
Ainda que obtenha sucesso na Assembleia Geral, será necessário o aval do Conselho de Segurança (CS), no qual os EUA já alertaram acerca da imposição de seu veto. A Europa, por sua vez, propõe que a Palestina seja aceita como Estado não membro, como o Vaticano, algo além do status de observadora que possui hoje, e que dispensa a recomendação do Conselho de Segurança. Para os palestinos, porém, é muito pouco se considerando os 63 anos de exaustiva espera.
Uma das questões centrais dessa iniciativa gira em torno do direito de retorno dos palestinos expulsos em 1948, o principal ponto de desacordo daqueles que se opõem à empreitada. Outra delas, diz respeito aos cenários que poderão seguir-se a um veto no Conselho de Segurança, por exemplo, que toda a Cisjordânia seja ocupada por Israel, que as colônias aumentem juntamente com a violência transfronteiriça, ou ainda que os EUA suspendam sua ajuda financeira à AP. São riscos inerentes à iniciativa, mas que talvez não intimidem um povo vitimizado pela opressão da potência ocupante dia após dia. A hipótese de se obter ao menos a condição de Estado não membro, todavia, atribuirá aos palestinos a condição de Estado ocupado. Ainda que a ocupação não cesse com o eventual reconhecimento do Estado palestino, não restam dúvidas de que os termos para as futuras negociações mudarão e de que essa ocupação será deslegitimada. Ao contrário de um povo oprimido sistematicamente, ter-se-ia um Estado cujo território embasado nas fronteiras de 1967 encontra-se subjugado a uma estrangeira ocupação militar, contrariando os preceitos das Nações Unidas e dando causa a um incidente verdadeiramente interestatal.
Embora uma resolução adotada na Assembleia Geral não tenha o alcance jurídico de um aval do CS, seu alcance simbólico e diplomático tem valor indiscutível. De mais a mais, significa uma alteração importante no eixo geopolítico da região, vez que a iniciativa acontece em meio à Primavera Árabe e ao recente conflito havido com a Turquia, bem como pelas mudanças de posição de Egito, Líbia e Tunísia, fatos que podem agravar o isolamento de Israel na região.
Um Estado palestino reconhecido certamente tornaria mais difícil a continuidade do desrespeito israelense das principais resoluções do CS acerca da questão dos territórios palestinos ocupados em 1967. Se a proposta terminará em um novo confronto, ou na criação de condições para uma verdadeira negociação, dependerá da atitude dos principais atores, mas também das reações do restante da comunidade internacional.
O Brasil se destaca de modo especial nessa questão. Dilma Rousseff, a primeira mulher a abrir uma sessão da Assembleia Geral das Nações Unidas, defendeu a posição brasileira de apoio ao legítimo direito do povo palestino à criação plena de seu Estado, bem como o compromisso com o respeito ao Direito Internacional, aos direitos humanos e aos espaços multilaterais para a solução de conflitos.
Larissa Ramina e Carol Proner são doutoras em Direito Internacional e professoras do Programa de Mestrado em Direitos Fundamentais e Democracia da UniBrasil.
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