Com a aposentadoria do ministro Marco Aurélio, em julho, abriu-se vaga no Supremo Tribunal Federal, composto por 11 ministros. A nomeação do novo ministro que completará a composição plena do tribunal cabe ao Presidente da República, com anterior e necessária aprovação do Senado Federal. A fim de dar início ao procedimento de preenchimento da vaga aberta, o chefe do Poder Executivo federal indicou, em agosto passado, como candidato à vaga o ex-advogado-geral da União André Mendonça.
O procedimento de confirmação ou não do nome indicado pelo presidente da República tem continuidade no Senado Federal, a quem cabe a sabatina – que culmina com uma espécie de entrevista qualificada – e a decisão final sobre a escolha presidencial. Depois, caso haja aprovação do candidato ou candidata, o procedimento retorna ao Poder Executivo, para nomeação. Portanto, o procedimento é político. O fato de estar baseado em disposições legais – a começar pela Constituição da República, desembocando no Regimento Interno do Senado Federal – não o torna um procedimento eminentemente jurídico.
A legislação sobre a matéria dispõe acerca das competências de atuação e do rito procedimental, mas não estipula prazos para conclusão das etapas e para a decisão final. Aqui está o ponto central da discussão. Ao não se estabelecer prazo para as manifestações no procedimento desdobrado em duas esferas de poder, ruídos e tensões podem ocorrer, como de fato se está vendo.
Se a demora não é ilegal, resta a pergunta: meses depois da indicação do candidato à vaga, é adequado que ainda não se tenha um desembaraço da situação?
Chamado a falar, o Poder Judiciário – leia-se o Supremo Tribunal Federal, por decisão do ministro Ricardo Levandowski –, além de analisar questões processuais preliminares, disse que não lhe cabe julgar a demora no procedimento, em homenagem à tripartição do poder. Aliás, julgamentos anteriores do tribunal sobre a matéria foram nesse sentido. A interpretação e aplicação do Regimento Interno da Câmara dos Deputados e do Senado Federal é de alçada de cada uma das casas legislativas, limitando-se o Poder Judiciário a coibir ilegalidades, o que não é caso em questão.
No silêncio da legislação sobre os prazos que iniciam ou encerram cada etapa do procedimento de escolha e nomeação do candidato à vaga de ministro, não cabe ao Judiciário suprir a lacuna, o que configuraria uma verdadeira substituição à atuação do Legislativo. Isso é assunto interna corporis, ou seja, assunto interno do parlamento. A discussão sobre a demora em se fixar a data para a sabatina do candidato está ligada ao que se chama de “poder de agenda”, poder de pautar as atividades internas de cada casa legislativa.
Diante disso, o debate público se acentua, o que faz transparecer a turbulência política brasileira. De um lado, o presidente da Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania – a comissão do Senado Federal responsável por dita sabatina –, o senador Davi Alcolumbre, sustenta não haver consenso para a pauta. Também afirma que, por se tratar de um procedimento complexo e de índole política, não se desenrola por meros procedimentos formais. Enfim, há muito mais que a letra da lei pode nos indicar, justamente por ser plasmado pela atividade política. De outro lado há a pressão pela agenda da sabatina. Muitos já se levantaram contra a demora, a exemplo dos senadores que chamaram o Judiciário a falar, por meio da impetração de mandado de segurança, cujo desfecho acima foi comentado.
Se a demora não é ilegal, resta a pergunta: meses depois da indicação do candidato à vaga, é adequado que ainda não se tenha um desembaraço da situação? Do ponto de vista da atividade judicial, parece que não. O ideal é que todos os cargos de ministro estejam preenchidos, a fim de se ter normalidade no fluxo processual. Fora isso, a estabilidade das instituições deve ser observada. A incerteza provoca rumores, desassossego, inquietude.
Não é, ao menos aos olhos de quem não está no olho do furacão das decisões políticas, aceitável que não se ponha em discussão o nome do candidato indicado; põe-se em discussão, vota-se, decide-se, remete-se a decisão ao Poder Executivo e, dependendo da decisão, nomeia-se o indicado. Simples, mas não muito. Há mais coisas em questão do que nós, pobres mortais, conseguimos perceber e compreender. O jogo político é próprio da democracia, marcada pelo duelo de opiniões e ideias. De quando em vez, cabos de guerra política são criados, e que vença quem tem mais poder, num sentido amplo. Esperemos, então.
Marco Berberi é advogado, mestre e doutor em Direito, e procurador do Estado do Paraná.
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