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A derrubada da extensão automática das patentes e seu impacto econômico e social

A discussão acerca do tema envolve dois momentos: o pedido de registro da marca e a efetiva concessão (Foto: Pixabay)

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Recentemente, a questão das patentes e da propriedade intelectual voltou à pauta do noticiário no Brasil com a possibilidade de mudança nas regras do período de duração de patentes industriais. Dias atrás, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que é inconstitucional a regra prevista na Lei de Propriedade Industrial (LPI) que permite estender os prazos de patentes em caso de demora na análise dos pedidos pelo Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI). O assunto ainda deve voltar à pauta do colegiado para definir se a decisão será aplicada apenas às novas patentes ou também àquelas já vigentes, e se é o caso de se incluir os medicamentos nessa análise.

O privilégio temporário está previsto no artigo 5.º, inciso XXIX, da Constituição Federal, garantindo exclusividade de fabricação, comercialização, importação, uso ou venda da criação durante um período previamente determinado. Mas, por apresentar uma lacuna de especificações deste prazo, foi aprovada e sancionada, em 1966, a Lei de Propriedade Industrial (LPI), que regulamenta de maneira ímpar o tempo determinado para cada inventor, cientista ou empresa assumir e obter exclusividade sobre o objeto que se encontra em análise.

O artigo 40 da Lei 9.279/1996 afirma que “A patente de invenção vigorará pelo prazo de 20 anos, e a de modelo de utilidade, pelo prazo de 15 anos contados da data de depósito”. Mas o parágrafo primeiro complementa que “O prazo de vigência não será inferior a dez anos para a patente de invenção e a sete anos para a patente de modelo de utilidade, a contar da data de concessão, ressalvada a hipótese de o INPI estar impedido de proceder ao exame de mérito do pedido, por pendência judicial comprovada ou por motivo de força maior”. É deste trecho em específico, que dispõe acerca da prorrogação no prazo de vigência da patente na hipótese de demora na análise do pedido pelo INPI, que trata a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 5.529, ajuizada pelo procurador-geral da República, Augusto Aras.

Segundo o procurador-geral, o enunciado do parágrafo único do artigo 40 poderia culminar na indeterminação no prazo de vigência das patentes, o que acarretaria afronta constitucional. Isso porque haveria indeterminação e variáveis de acordo com cada pedido, uma vez que requerentes distintos usufruirão de prazos de vigência distintos, mesmo que tenham depositado o pedido na mesma data, gerando assim uma grave e desproporcional insegurança jurídica.

A discussão acerca do tema envolve dois momentos: o pedido de registro da marca e a efetiva concessão. Porém, a ineficiência do poder público, embora se trate de processo complexo, não dá ensejo ao lapso temporal que pode levar mais de uma década entre a data do pedido e a data da concessão. O debate enfoca não apenas a violação da prorrogação do prazo, mas também a violação da função social da propriedade intelectual, pois ela existe enquanto socialmente útil. Apesar de resguardar os direitos do autor do invento por um período determinado, a partir de sua extinção toda a sociedade se beneficia, uma vez que seu objeto passa a ser de domínio público.

O ministro relator deste caso, Dias Toffoli, considerou que o prazo extra para a vigência de patentes é inconstitucional. Em abril, ele concedeu parcialmente liminar (decisão temporária) suspendendo a regra para as patentes de medicamentos e produtos farmacêuticos, mas com efeitos futuros e não retroativos; no julgamento ocorrido dias atrás, o plenário já formou maioria pela derrubada da regra que amplia os prazos. Segundo Toffoli, “há décadas de monopólio em solo brasileiro de produtos que, frequentemente, já estão em domínio público no exterior e com preços muito mais acessíveis”.

O relator foi nem assertivo em suas palavras, pois a verdade é que a patente é considerada um instrumento de incentivo à inovação e desenvolvimento em todo o país, não podendo, de todo modo, existir um monopólio por tantos anos. A criação de grandes monopólios industriais causa grave impacto na livre concorrência para novos investidores e criadores, além de impactar diretamente o sistema socioeconômico do Brasil.

Mais graves são os efeitos sobre as indústrias farmacêuticas no país, ainda mais na atual conjuntura enfrentada em todo o mundo, pois outras empresas de produção de fármacos ficam impedidas de produzir determinados medicamentos genéricos contra futuras e atuais doenças. O caso do combate à Covid-19 é exemplar: além de barrar empresas para a produção de componentes que ajudariam na corrida contra o vírus, isso ainda impacta diretamente na produção de respiradores, aparelhagem tão necessária e escassa no Brasil. A regra atual, portanto, desencadeia efeitos em toda a rede de saúde, em especial no Sistema Único de Saúde (SUS), que economizaria bilhões de reais com a quebra dessa extensão de prazo das patentes.

A decisão do STF é uma vitória, ainda que exija modulação futura, uma vez que isso muda drasticamente o cenário brasileiro diante de todo o mundo. Em termos de patentes, o Brasil se encontra isolado perante a comunidade internacional graças a esta automática e indiscriminada extensão dos períodos de vigência das patentes. Além disso, quanto maior o prazo de exclusividade, mais se onera o poder público, causando diretamente elevados prejuízos financeiros não somente para o Estado, mas também para milhões de brasileiros que arcam com os altos custos de medicamentos.

Há diversos e inúmeros fatores que ferem a Constituição que não devem ser esquecidos, como os princípios básicos e fundamentais tais quais o direito à saúde, à dignidade da pessoa humana, aos valores da livre iniciativa, a garantia do desenvolvimento nacional, que devem ser sempre de máxima proteção.

*Carinny Okasaki é advogada.

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