A crise de governabilidade que marcou o ano de 2011 não influenciou negativamente a imagem da presidente Dilma no exterior nem no perfil da política externa brasileira
Há pouco mais de um ano da posse da presidente do Brasil, é raro encontrar analistas que afirmam que Dilma Rousseff conduz a inserção internacional do Brasil essencialmente diferente da do seu antecessor, Lula da Silva.
A política externa de Dilma tem sido marcada pela continuidade com relação ao governo anterior. Essa continuidade pode ser verificada na opção do atual governo em promover vetores clássicos da diplomacia brasileira, como a defesa dos direitos humanos, o princípio da solução pacífica de controvérsias, o fortalecimento do multilateralismo, a promoção da paz, a estabilidade financeira; além de outras agendas importantes como a promoção da integração regional (Mercosul e Unasul), maior participação em arranjos de geometria de poder variável (Brics, G20, Ibas, CPLP); o aprofundamento das relações Sul-Sul, promoção de parcerias com países da Ásia e do Oriente Médio, bem como com os grandes sócios do Brasil como os Estados Unidos, China e os países europeus.
Mas se os caminhos percorridos pela política externa brasileira continuam os mesmos, há uma significativa mudança de estilo entre Lula e Dilma, na chamada diplomacia presidencial. Segundo o diplomata Sérgio Danese, diplomacia presidencial implica a "(...) condução pessoal de assuntos de política externa, fora da mera rotina ou das atribuições ex officio, pelo presidente, ou, no caso de um regime parlamentarista, pelo chefe de Estado e/ou pelo chefe de governo". Assim, quando o presidente desempenhou funções além do que corresponderia ao simplesmente protocolar, isso é, extrapolou suas competências previstas pela Constituição no que se refere ao exercício da diplomacia, cingindo-lhe um papel mais ativo na elaboração e execução da política externa do país, ele fez diplomacia presidencial.
Embora o termo diplomacia presidencial assente suas origens no período republicano, é apenas a partir do governo Fernando Henrique Cardoso que essa prática ganha importância. Entretanto, será com o presidente Lula que a diplomacia presidencial ostentará um ativismo nunca visto antes, com um grande circuito de viagens de trabalho, rede de contatos e conversações a cargo do chanceler, algo inédito para os próprios padrões do Ministério das Relações Exteriores. O perfil populista de Lula e a influência do PT sobre a elaboração da agenda internacional do país denotam especificidades quanto ao modo de Lula fazer política e de sua diplomacia. Nesse contexto, o elogio dado a Lula pelo presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, com a expressão "Thats my man right here", parece estar mais ligado à figura carismática de Lula do que com a importância do Brasil na arena internacional.
Um elemento a ser considerado é a inevitável comparação de estilo entre Dilma e Lula quanto ao modo de se fazer política, em lidar com os assuntos domésticos e, especialmente, em representar o país no cenário internacional. Ao longo de seu primeiro ano de mandato, Dilma deparou-se com complicados problemas domésticos como os recorrentes escândalos de corrupção e a demissão de vários ministros. Na resolução de tais problemas, Dilma foi capaz de conjugar um estilo discreto, sóbrio e gerencial que rendeu não só apoio e respeito dos mais céticos em relação à sua gestão, mas terminou seu primeiro ano com uma popularidade recorde de 72% de aprovação.
A crise de governabilidade que marcou o ano de 2011 não influenciou negativamente a imagem da presidente no exterior nem no perfil da política externa brasileira. Assim sendo, o eloquente discurso de Dilma na abertura da Assembleia Geral das Nações Unidas, o papel firme na defesa dos direitos humanos (em relação ao Irã) e na luta pela erradicação da fome no mundo contribuíram, em parte, para a construção de um novo rosto para a diplomacia brasileira: mais segura, menos bajuladora, menos política e mais focada naquilo que vários analistas têm chamado de "Diplomacia de Resultados".
Em relação às viagens internacionais, Dilma não tem mostrado tanto apreço como Lula. No primeiro ano de seu mandato fez apenas 12 viagens ao exterior, menos que a metade das 27 viagens de Lula em 2003. Após um breve giro recentemente por Cuba, Haiti e Alemanha, agora está na Índia (para a reunião dos Brics) e em abril vai aos Estados Unidos. Se Dilma seguir a lógica e a coerência de sua diplomacia presidencial, deve procurar manter um low profile, com menos retórica e mais pragmatismo.
Rafael Pons Reis, doutorando em Sociologia Política pela UFSC, é mestre em Relações Internacionais e professor dos cursos de Relações Internacionais da Facinter e do UniCuritiba. Janiffer Zarpelon, doutoranda em Sociologia Política pela UFSC, é professora do curso de Relações Internacionais da Facinter e do Curso de Direito da Famec.
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