Ouça este conteúdo
Independentemente da crença religiosa do (e)leitor, imaginamos que o espírito natalino possa, à esta altura, estar influenciando seu humor. Nunca estes bons sentimentos foram tão importantes quanto neste final de 2023. Não acredita? Esperamos convencê-lo que sim.
Veja, o ano começou com o atual presidente da República queixando-se da política monetária que protege o valor da moeda – principalmente para a população mais pobre – sem que tivesse um projeto claro de como conduziria o endividamento do governo de forma sustentável. Vale notar que, um dos ganhos do Plano Real associado à proteção do valor da nova moeda foi a redução de pobreza Além disso, o atual ministro da Fazenda e sua equipe demoraram alguns meses para apresentar o que chamaram de “arcabouço fiscal”.
Neste meio tempo, tivemos também o anúncio de que impostos sobre empresas chinesas de compra online seriam pagos, formalmente, por elas, como se isso não implicasse em aumentos de preços para os consumidores, misconception daqueles que resistem em realizar uma leitura dos bons livros de introdução à economia. Cabe novamente lembrar, grande parte dos consumidores destas empresas não recebem vencimentos mensais de juízes ou de empresários ricos.
Voltando ao arcabouço fiscal, ele veio junto com sua “irmã”, a reforma tributária. Quanto a esta, a preocupação com a eficiência na arrecadação pública, na contramão das expectativas, foi se tornando um monstro por conta das exceções que políticos incluíram no projeto. Um problema importante das exceções é que alguém deve pagar por elas e nem todos percebem – ou querem perceber – que a conta lhes cabe. O resumo da ópera sobre os irmãos (arcabouço e reforma tributária): por enquanto parece que o senhor ministro considera impossível mexer nos gastos, mas não na receita.
Alguém poderia dizer que ao menos o cenário externo seria mais generoso com o depenado brasileiro. Ledo engano. Putin e o Hamas não nos permitiram esta alegria, embora o brasileiro médio já esteja se esquecendo da invasão russa na Ucrânia e, alguns, por incrível que pareça, andem por aí relativizando o enjaulamento de crianças ou os erros do noticiário. Ainda assim, é correto dizer que a economia se adapta a choques externos rapidamente (mais rapidamente quanto maior a liberdade econômica) e parece que é o que vem acontecendo (ainda que o tamanho da nossa liberdade econômica seja discutível).
Talvez o leitor possa nos convencer que a segurança jurídica voltou a ser uma preocupação entre nossos juízes e que o sistema de pesos e contrapesos funciona bem. Em países com instituições fortes, juízes não fazem ameaças veladas a senadores (ou vice-versa) e a preocupação da Justiça é preservar o bom funcionamento dos mercados, evitando privilégios para alguns grupos de interesse, prestando um serviço público ao cidadão. Não tem sido bem assim. Um exemplo? A segurança de que a reforma trabalhista seria consolidada se perdeu, a despeito das evidências de seus efeitos benéficos sobre a economia (ah, negociação coletiva é que definirá sobre o trabalho de determinadas atividades aos domingos e feriados, ou seja, menor liberdade econômica…).
Há sempre uma última esperança que é a formação técnica dos nossos estudantes. Sabe-se que o ensino (desde o básico ao universitário) é a base da produtividade de uma economia e que esta, por sua vez, alavanca a prosperidade de uma nação. Em algumas ocasiões, raras, é verdade, o governo auxilia neste processo. A criação da Embrapa é um exemplo de sucesso que estimulou o agronegócio brasileiro. Quem poderia ser contra o crescimento econômico do setor? Aparentemente, quem formulou e também quem aprovou a última prova do Enem não acredita na ciência e no valor adicionado que o setor proporciona para o país. Alunos, já com sérias defasagens devido ao fechamento das escolas imposto pelas políticas governamentais de combate à pandemia, têm um problema adicional: estão lhes ensinando inverdades no que diz respeito ao progresso do Brasil na agropecuária.
Poderíamos citar mais exemplos. Muito mais exemplos. E poderíamos citar exemplos positivos, mas não sei se teríamos como preencher dois parágrafos neste caso. Talvez, mais do que nunca, o brasileiro mereça alguns dias de paz neste final de ano porque 2024 promete ser uma batalha difícil. Feliz Natal e Feliz 2024, amigos (e)leitores.
Claudio D. Shikida é professor do curso de de Ciências Econômicas no Ibmec-BH; Ari Francisco de Araujo Jr. é coordenador do curso de Ciências Econômicas do Ibmec-BH.
Conteúdo editado por: Jocelaine Santos