Sem dúvida, há uma nova escola à espera dos aproximados 48 milhões de estudantes da educação básica que iniciarão o ano letivo de 2022. Com tantas reinvenções humanas, profissionais, educacionais e tecnológicas, é certo que a instituição educacional que os receberá já é muito diferente até mesmo daquela do início da pandemia, em março de 2020.
Sob uma perspectiva positiva, sem menosprezar nem esquecer as significativas perdas de vidas e os prejuízos no ensino, na interação, na convivência e na vida escolar, é possível sintetizar algumas valiosas oportunidades que a pandemia colocou diante das escolas, impondo-lhes, em curto espaço de tempo, o desafio crucial de adaptar, a duras penas, professores, famílias e alunos em face da escassez de recursos e da angústia do período incerto e pandêmico.
Iniciamos 2022 pedagogicamente mais evoluídos. Temos mais controle sobre o rol de competências a ser desenvolvido, bem como aprendemos a avaliar situações com mais critério, a gerenciar vários tipos de aprendizado, e a rever conteúdos; também entendemos, de uma vez por todas, que quantidade de conteúdo não tem nada a ver com qualidade de aprendizagem. Afinal, reduzimos e “andamos” a passos mais lentos até nos adaptarmos. Mesmo assim, podemos dizer que nunca adquirimos tanto conhecimento sobre ensino, aprendizagem significativa e valor da mediação docente. Em plena fase de implementação da Base Nacional Comum Curricular, contamos com uma emergente “hibridização” do ensino, tirando todas as famílias, educadores e alunos de qualquer zona de conforto existente.
Gestores retomaram com habilidades de “malabaristas”. Manobraram custos, administraram a suspensão de inúmeros contratos laborais, lidaram com uma infinidade de testes e atestados de afastamento, e implantaram novos protocolos, além de, em pleno cenário de recuperação financeira, investirem estrategicamente em tecnologia para dar um outro passo: educar, simultaneamente, alunos presenciais e remotos. Outros desafios, nova aprendizagem, liderança de ponta, treinamentos inovadores e muita capacitação de famílias, para que não se perdessem no caminho ou na maioria de conselhos vãos oriundos de grupos de mensagens.
As escolas hoje estão infinitamente mais fortes porque se reposicionaram. Conseguiram deixar o que era processo com a tecnologia, via portais e aplicativos, e passaram a focar no relacionamento. Aquela tradicional secretaria tornou-se uma equipe focada em orientar famílias a melhorar sua experiência com a escola, virtual ou presencialmente, mirando na excelência. Retomam com equipes completamente reestruturadas. É nítido observar que não há mais áreas fragmentadas. Agora, existe uma rede de colaboradores mais engajados com a missão. Afinal, ministrar aulas on-line, encarar reduções de jornada e salário, sujeitar-se a novas posições e protocolos, resistir à pressão do contexto incerto e do medo foram muito mais uma questão de equipe, união, pertencimento e propósito do que de salário e plano de benefícios.
Para complementar, as famílias também se transformaram. Como sociedade, outorgaram um renovado e nobre valor ao professor, uma das profissões mais expostas na pandemia, e hoje já reconhecem que ensinar é tão complexo quanto qualquer outra função social. Aquela famosa expressão “parceria família-escola” ganhou vida e tornou-se “aliança família-escola”. Essa aliança é perene, transparente e muito mais valiosa que a simples parceria. Esse avanço já começa a gerar frutos.
Aprendemos na prática que, mesmo em um mundo tão digital e conectado, ser humano é vital.
No quesito família, ainda há muito a ser feito. A pandemia mostrou uma necessidade emergente de formação de famílias, via Escola de Pais. Em função do isolamento e do uso excessivo de tecnologias, a quantidade de alunos com distúrbios de sono e comportamento, miopia e ansiedade é muito grande. Demoramos a entender, como adultos, que a infância pede interação significativa entre pais e filhos, com momentos que gerem memórias, construam histórias e deixem pequenos ensinamentos, mas vitalícios. Infelizmente, muitas crianças perdem seus dias na tecnologia, enquanto os pais maratonam séries. Embarcamos na geração das selfies e da imaturidade, desperdiçando ricos e fundamentais instantes em função do melhor registro. O Brasil está no topo quando o assunto é tempo gasto em aplicativos e streaming. Se de fato queremos, como diz o pensamento, que a escola seja o segundo lar, é imprescindível que a casa seja a primeira escola, mas, para isso, temos muito a aprender sobre o relacionamento de pais e filhos.
As escolas retornam, em maior ou menor grau, em outro patamar, mas, como visto, os desafios também se renovaram. Aprendemos na prática que, mesmo em um mundo tão digital e conectado, ser humano é vital. Viver, errar, interagir, reaprender, servir, ser natural. É pertinente e primorosa a adaptação do pensamento do genial Einstein às escolas: aquela que se abre ao novo jamais volta ao seu tamanho original. Sigamos atentos e sensíveis para ver no caos as oportunidades de reinvenção. Que venha 2022 com uma nova escola, um recomeço histórico e novas oportunidades de transformação.
Haroldo Andriguetto Junior é doutor em Educação, mestre em Administração e diretor da Escola O Pequeno Polegar (São José dos Pinhais-PR).