Circulam notícias a respeito do Projeto de Lei Complementar 116/2017, que pretende regulamentar a demissão de servidores públicos estáveis em razão de mau desempenho no exercício de suas funções. O tema, seguindo a moda da atual conjuntura nacional, tem despertado a ira de críticos e defensores, que privilegiam o embate em detrimento do debate. É preciso encarar a questão com parcimônia.
De um lado, a possibilidade de demissão de servidores públicos estáveis em razão de mau desempenho em seus cargos é expressamente prevista na Constituição (artigo 41, §1.º, III). Ocorre que tal dispositivo demanda lei complementar para regulamentar o procedimento denominado Avaliação Periódica de Desempenho (APD) e, na ausência de tal lei, a APD nunca pôde ser realizada. O PLS 116/2017 surge com a finalidade de regulamentar a norma em questão, viabilizando a condução de APDs para aferir a produtividade de servidores públicos estáveis. A intenção é louvável, visto que estabilidade não é sinônimo de perpetuidade ou de direito à comodidade.
É fundamental garantir que a regulamentação da APD respeite as balizas do direito à estabilidade
Do ponto de vista do cidadão, a atuação diligente dos agentes públicos configura fundamental contrapartida aos tributos recolhidos, e realizar APDs significa apenas demandar dos servidores que se dediquem às funções que almejaram após aprovação nos concorridos concursos públicos nacionais. Do ponto de vista do servidor, a APD tem o mérito de prestigiar o bom profissional à medida que nivela a qualidade do serviço por cima, contribuindo para diluir a inverídica pecha de ineficiência generalizada atribuída pelo senso comum.
Todavia, a APD não pode configurar válvula de escape para violar o direito à estabilidade, garantia dos servidores públicos que também tem status constitucional, derivada do fato de terem acessado seus cargos de maneira meritocrática, mediante aprovação em procedimento seletivo público, isonômico e altamente competitivo. Definitivamente, estabilidade não é sinônimo de ineficiência. Assim, se de um lado é dever da administração pública buscar o bom desempenho de seus agentes, por intermédio das APDs, de outro lado é direito fundamental dos servidores exigir que a APD seja realizada mediante efetivo processo administrativo, com direito ao contraditório e à ampla defesa; que os critérios de avaliação sejam claros e objetivos; e que as avaliações sejam realizadas de maneira absolutamente impessoal.
São, infelizmente, notáveis os casos de processos disciplinares (semelhantes às APDs, mas com objetivo diverso) movidos contra servidores em retaliação por divergências político-ideológicas ou desavenças pessoais. É impensável que APDs sejam conduzidas com essa finalidade – e é por isso que o PLS 116/2017 contém algumas máculas em sua redação original, a exemplo do artigo 15, que afirma competir individualmente à “chefia imediata” realizar a avaliação de seus subordinados, situação que facilita a condução de APDs de maneira persecutória. É fundamental garantir que a regulamentação da APD respeite as balizas do direito à estabilidade.
Aliás, em demonstração de maturidade institucional, seria interessante aproveitar a oportunidade para, ampliando o escopo do artigo 41, §1.º, III da Constituição, instituir APD para todos os cargos públicos, abrangendo cargos políticos, cargos tidos por “vitalícios” e cargos em comissão. Por que não?
Fernando Menegat, advogado e doutorando em Direito, é professor de Direito Administrativo da Escola de Direito e Ciências Sociais da Universidade Positivo.
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