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Em sua obra "Senso Comum", Thomas Paine assevera que fazemos confusão entre sociedade e governo, a ponto de não fazermos distinção entre os dois. Entretanto, na expressão do autor, eles não são apenas diferentes, mas nascem de origens diferentes. A sociedade é produzida pelas nossas necessidades; o governo, pelas nossas fraquezas. A primeira promove nossa felicidade de modo positivo, unindo nossas afeições, enquanto o segundo promove nossa felicidade de modo negativo, restringindo nossos vícios. A sociedade encoraja a união; o governo cria distinções. A primeira é uma protetora, e o segundo, um punidor.

No meio estatal corre a crença de que somos um país de sonegadores e propensos à economia informal, o que, para muitos, resulta de escassa vocação para a honestidade fiscal. Poucos, porém, se perguntam se é isso mesmo ou se a genealogia do problema é outra. Aos tripulantes do Estado não lhes agrada reconhecer que parte da informalidade e da sonegação não passa de resultado da mão pesada do Estado, da alta tributação, dos elevados encargos trabalhistas e do inferno de leis que há no Brasil. Relutam em reconhecer que há um conflito entre um setor público ineficiente e corrupto, e uma sociedade tentando sobreviver longe das garras do Estado.

Se tivéssemos poucas e boas leis, carga tributária igual aos países médios, melhor legislação sobre as relações trabalho/capital e facilidade para abrir e fechar empresas, certamente a informalidade e a sonegação seriam bem menores. Os candidatos a cargos públicos, que vivem prometendo ajuda aos pobres, muito mais fariam por estes se entendessem que a desobstrução do mercado e o estímulo ao espírito empreendedor poderiam levar o país a um surto de crescimento capaz de gerar emprego e renda, e que isso sim melhoraria a vida dos pobres sem necessidade de apelar para tantos adjutórios do governo.

Roberto Campos dizia que o Brasil só pode ser salvo pelos eficientes e não pelos caridosos, pois se os eficientes não produzirem, os caridosos não terão o que distribuir. E mesmo quando os "caridosos" incrustados no governo fazem a distribuição, a coisa é permeada por elevados graus de ineficiência e de corrupção, sobretudo porque os que pregam a distribuição do bolo na prática querem mesmo o controle da faca. Afinal, não raro os assistentes costumam reservar uma boa fatia para si no caminho até entregarem o bolo para os assistidos, e a razão é simples: os governos não são feitos de anjos, mesmo porque estes, se existirem, não habitam o mundo dos homens. De tanto ouvir soluções óbvias e erradas, a sociedade acostumou-se a acreditar nos auxílios prometidos por um político de bom coração antes que nas soluções geradas por um cérebro de boa razão. As propostas de distribuição são muito mais populares e costumam permitir melhor colheita de votos do que as receitas para aumentar a produção.

O Banco Mundial informa que, numa lista de 178 países, o Brasil é 122.º pior país para se fazerem negócios. Chega a ser assustador que tal informação não tenha gerado comoção e indignação nos políticos brasileiros capazes de mobilizá-los para um mutirão cívico destinado a resgatar o país dessa vergonhosa posição. Infelizmente, os homens que dirigem o país parecem acreditar que a solução seja apenas repartir o bolo, quando na realidade a solução é outra. Os países do leste asiático demonstraram que é possível escapar da pobreza coletiva em uma só geração e que a riqueza não está nos recursos naturais, e sim nos recursos artificiais da educação e da tecnologia, novamente lembrando Roberto Campos. No Brasil sobram recursos naturais, mas faltam os artificiais, e o país adentra o terceiro milênio fragilizado por não ter corrigido três deficiências fundamentais: a baixa taxa de investimento, a precária infra-estrutura e o déficit educacional.

Um governo que conseguisse progresso apenas nessas três áreas faria mais pelo povo, a longo prazo, do que todas os programas de adjutórios sociais.

José Pio Martins é professor de Economia e vice-reitor do Centro Universitário Positivo (UnicenP).

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