Decifrar códigos sempre foi um grande desafio para a espécie humana. No século XIX Champollion decodificou os hieróglifos egípcios. O famoso poeta norte-americano Edgar Allan Poe, que viveu de 1809 a 1849, deixou alguns poemas em taquigrafia que até hoje, 155 anos depois de sua morte, não puderam ser decifrados. Nos anos 60, Gerald S. Hawkins deduziu os mistérios de Stonehenge.

CARREGANDO :)

Em 1985, Thierry Gaudin publicou o seu revolucionário Secret Code of the Bible. O dia 14 de abril do ano de 2003 ficará marcado por décadas, talvez até séculos, na história da humanidade, pois neste dia foi revelado o segredo do código dos códigos, o código da vida. Neste dia, o homem desvendou um segredo que a natureza guarda a sete chaves por milhões de anos: a ordem correta das substâncias bioquímicas que compõem o seu código genético. Foi uma jornada de 15 anos de pesquisas em centenas de laboratórios espalhados por mais de 20 países do mundo, todos com o mesmo objetivo: decifrar o código da vida.

O ser humano, quando recém-nascido, tem 26 bilhões de células e um adulto tem cerca de 50 trilhões. No centro de cada uma destas células está o nosso genoma.

Publicidade

Em 2001 foi publicado um primeiro rascunho das 3 bilhões de letras bioquímicas do genoma. Esta seqüência foi revisada uma primeira vez em 14 de abril de 2003; e a sua versão definitiva entregue à humanidade em 2004. Os próprios cientistas ainda desconhecem o significado de boa parte das seqüências de letras bioquímicas que descobriram. A sensação que a comunidade científica vive neste exato momento é semelhante à de Champollion, ao tentar decifrar os hieróglifos da Pedra Roseta. Temos um tesouro riquíssimo nas mãos, mas ainda vamos demorar anos para compreender e desfrutar da mensagem que este livro tem para nos ensinar.

Existem, naturalmente, barreiras éticas, morais, filosóficas, culturais e religiosas a serem transpostas pelo conhecimento a ser adquirido do genoma. Além disso, a descoberta de um número bem menor de genes do que imaginávamos no genoma humano traz da Natureza uma lição de humildade a ser aprendida pelos seres humanos; a de que não existe um determinismo genético para tudo, ou seja, nem tudo está escrito nos nossos genes.

As fantásticas descobertas possíveis graças ao genoma humano trazem mudanças radicais na medicina. Já é possível hoje saber se um indivíduo nascerá ou nasceu com predisposição a ter filhos com determinadas doenças, ou se ele mesmo desenvolverá certas doenças.

Existem milhares de doenças genéticas diferentes, e graças ao seqüenciamento do genoma, dentro de alguns anos poderemos diagnosticar no primeiro dia de vida se um bebê vai ou não ter estes tipos de doenças.

Se o século XIX foi o século da Química e o século XX o da Física, o século XXI será sem dúvida o da Genética. O aspecto social mais relevante de toda essa evolução é o de que as conquistas obtidas graças ao Genoma Humano já estão se tornando acessíveis à população brasileira. Todos os exames de genética são de cobertura obrigatória para todos os brasileiros que tem planos de saúde posteriores a 1998. Em breve a Genética estará disponível também para os pacientes do SUS. Tecnicamente, laboratórios especializados estão aptos a fazer testes de DNA para mais de mil doenças genéticas, como suporte essencial no tratamento em todas as áreas da medicina e, conseqüentemente, trazendo mais esperança de vida ao paciente e aos seus familiares.

Publicidade

Salmo Raskin, especialista em genética médica, é presidente da Sociedade Brasileira de Genética Clínica e dirige o Genetika – Centro de Aconselhamento e Laboratório de Genética.