Em diálogo com um ex-dirigente de entidade industrial, ouvi dele três afirmações, todas preocupantes por não serem verdadeiras e demonstrarem desconhecimento do funcionamento da economia. Ele me disse: que a indústria está cada vez menos importante, pois vem perdendo participação no total do PIB; que estamos vivendo uma era pós-industrial e os governos diminuirão a atenção à indústria; e que o país vai progredir na economia de serviços, e é por aí que o padrão de vida vai aumentar.

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O espaço deste artigo não permite análise profunda, mas é possível tecer algumas notas. Pedi a meu interlocutor a lista dos produtos consumidos em seu café da manhã e, com ela na mão, afirmei-lhe: "Note que você não comeu nenhum serviço, mas somente produtos da indústria". Esse é o primeiro ponto: a população não vive sem consumir produtos industriais; se o país não os produzir, terá de importá-los.

Meu amigo comentou: "É isso mesmo! A economia de serviços crescerá e os produtos industriais serão importados". Ora, então em algum lugar do mundo eles terão de ser produzidos. Ademais, para fazer importações, um país precisa da moeda estrangeira – que, no longo prazo, somente pode ser obtida por receitas de exportações. Em sua quase totalidade, os serviços não são exportáveis; logo, o país precisa vender ao exterior produtos primários e produtos industriais.

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A prestação de serviços, em geral, depende de que o produtor e o consumidor estejam no mesmo lugar. Assim é com o atendimento médico, o corte de cabelo, a consulta do psicólogo, o conserto do automóvel, o serviço do faxineiro, a sessão de cinema, a educação de seu filho e por aí vai. Um país pode – e deve – expandir esses setores. Porém, não pode exportar tais serviços para obter os dólares necessários à importação das coisas que comemos no café da manhã.

O segundo ponto é que a indústria está perdendo participação relativa no PIB basicamente por causa do aumento de sua "produtividade". Os preços relativos dos produtos manufaturados caíram em função da tecnologia e do aumento da produtividade na indústria. Há 20 anos, o preço de um notebook equivalia a dez toneladas de soja. Hoje, com o valor de duas toneladas de soja compra-se um bom computador pessoal. O porcentual do produto industrial na economia é dado em expressão monetária. Assim, o peso relativo da indústria no PIB pode cair ainda que haja aumento das quantidades produzidas.

Já o setor de serviços não tem a mesma capacidade para aumentar a produtividade (produção dividida pelas horas de trabalho). Um psicólogo atende a um paciente por hora, e não dá para atender a quatro pacientes e dizer que aumentou a produtividade. Outro exemplo: você não voltaria a seu cabeleireiro se ele o avisasse que passará a cortar seu cabelo em cinco minutos porque precisa aumentar a produtividade.

O terceiro ponto tem a ver com a teceirização ocorrida nas últimas décadas. Se uma indústria mantém seu restaurante, é um centro de custo industrial. Se terceirizar, os valores pagos à empresa fornecedora são contabilizados como produto do setor de serviços. Trata-se de uma mudança contábil que "incha" o PIB do setor de serviços à custa da diminuição do PIB da indústria.

Descuidar da expansão e da modernização do setor industrial por acreditar que a agricultura e os serviços bastam para desenvolver o país é um erro que pode custar caro à população.

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José Pio Martins, economista, é reitor da Universidade Positivo.