Lendo os grandes pensadores da história, rapidamente percebe-se que muitos ou eram políticos ou mantinham relações diretas ou indiretas com a política e com os governantes. Marco Aurélio era imperador; Cícero, advogado e cônsul. Sêneca também era advogado. Francis Bacon era chanceler. Boécio e Dante também eram ativos na política. Aristóteles e Epicteto não eram políticos, mas o primeiro foi tutor de Alexandre Magno e o segundo influenciou Marco Aurélio; e o infame Nero não era filósofo, mas teve como tutor Sêneca. Aqui no Brasil, dom Pedro II, em que pese o fato de não ter o status de pensador, tinha a admiração de Nietzsche, Victor Hugo e outros grandes pensadores – e isso por seus dotes intelectuais!
Isso nos mostra duas coisas: o fato de que a filosofia gozava, em tempos passados, de grande prestígio social – o que não deixa de nos trazer à mente a enorme desvalorização pela qual passam hoje a filosofia e as humanidades em geral; e o fato de que, em tempos passados, era importante que um político tivesse uma cultura e uma bagagem intelectual mínima – de certo modo, ainda fruto da herança deixada por Platão, para quem o governante deveria ser amante da sabedoria (ainda que, não raras vezes, isso não tenha sido praticado ou não tenha ido além da esfera das aparências).
Seja como for, neste século 21, hipoteticamente o ápice do desenvolvimento da humanidade, parece ocorrer precisamente o oposto: quanto mais ignorante parecer o político, mais é ele valorizado e mais cai ele nas graças do povo, de modo que chegamos ao ponto de, já à beira do abismo, termos de escolher entre políticos da estatura intelectual de Lula e Bolsonaro.
Neste século 21, hipoteticamente o ápice do desenvolvimento da humanidade, parece ocorrer que quanto mais ignorante parece o político, mais é ele valorizado e mais cai ele nas graças do povo
Cabe à psicologia explicar que espécie de gatilho psicológico despertam no povo os políticos que, ostentando a própria ignorância como se fosse uma virtude, polarizam o debate político com promessas de redenção e de extirpação do mal original. É possível e provável que isso evoque de nosso inconsciente coletivo a imagem do Messias que emerge dentre os iletrados e que, precisamente por não figurar entre os doutos, identifica-se com os mais simples e os salva. Parece uma hipótese razoável!
O problema é, todavia, que tal encaixa-se muito bem na figura de um verdadeiro Messias. Quando se trata de políticos, por outro lado, nem é prudente encará-los como salvadores e nem é sensato louvar neles a ignorância, a ausência de erudição e o iletramento, por assim dizer. Reflitamos: como pode um político discernir corretamente como deve investir em cultura, ciência e educação se tudo isso constitui para ele um mundo estranho e completamente desconhecido?
Renan Pires Maia é graduado em Psicologia, mestre em Filosofia e professor da Faculdade Santíssima Trindade (Pernambuco).
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