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Felipe Lima

Depois da minha participação no segundo capítulo do Congresso Brasil Paralelo, recebi uma enxurrada de perguntas sobre o que ali expus. Uma das mais importantes refere-se ao ideal de integração americana de José Bonifácio de Andrada e Silva em comparação com o proposto pelo Foro de São Paulo. Há semelhança entre os projetos? É possível forçar as ideias de José Bonifácio a ponto de servirem à revolução socialista?

O projeto de integração proposto por Bonifácio não era nem poderia ser socialista porque não havia socialismo nenhum na época; o que havia de mais próximo ao socialismo eram, no Brasil, as ideias “liberais extremadas”, vinculadas à Revolução Francesa, e Bonifácio era um pensador político de linha inglesa. Além disso, Bonifácio queria promover uma união que também envolvesse os norte-americanos; os socialistas têm nos americanos a visão do inimigo.

José Bonifácio visava o crescimento econômico conjunto, mas quase sem regulamentação: apenas abertura, muito trabalho e boa vontade. Era um liberal, no sentido atual do termo. Queria também a unidade militar para garantir independência do jugo europeu. O leitor deve se recordar que a Europa tinha acabado de passar por fortes turbulências causadas por Napoleão. Era indesejável sofrer investidas análogas na América.

Comunistas têm usado a figura de José Bonifácio em favor de suas causas

O Foro de São Paulo, por outro lado, é um ambiente onde se reúnem os partidos da esquerda latino-americana para deliberar sobre cultura, sociedade e política na América Latina, visando a elaboração de estratégias para o avanço da revolução socialista. Os órgãos oficiais que deveriam trazer à carne o que o Foro criava em espírito chamam-se Mercosul, Parlasul e Unasul, entre outros. O projeto de Andrada, por outro lado, era o de dar curso a um movimento civilizatório que plantasse em terras americanas o melhor da Europa, sem seus defeitos e enganos, e aproveitando também o melhor do resto do mundo que pudesse ser conhecido.

É verdade, sim, que comunistas têm usado a figura de José Bonifácio a favor de suas causas. O escritor Gondim da Fonseca, cuja biografia fez de Bonifácio um jacobino, fez ficção; quem a ler depois de ter lido a biografia de Octávio Tarquínio de Souza dará boas risadas. Em Santos, a vereadora Telma de Souza e a ex-candidata a prefeita Carina Vitral fizeram isso não com finalidade literária, mas política. Mas isso não me preocupa. Maus mesmo são os que usam a estratégia de Bonifácio para perseguir os fins revolucionários. Entre estes estão Aldo Rebelo, Ricardo Alemão Abreu (líder da parte de Política Externa do PCdoB) e Ronaldo Carmona (comunista doutor em Geografia pela USP). Este último já até discursou sobre Bonifácio no Foro de São Paulo – tive acesso ao conteúdo, feliz ou infelizmente.

O nosso Patriarca queria fazer do Brasil o assento do melhor das civilizações do mundo, imitando suas artes, técnicas e ciências para, no tempo certo, dar-lhes um desenvolvimento próprio. Os esquerdistas que citei querem fazer do Brasil parte de uma “Pátria Grande” que, em vez de nos dar independência, nos trará a mais infame submissão. Povos livres e independentes não podem aceitar cair nas mãos de aventureiros revolucionários. O que diria disso o Patriarca da Independência?

Já deve estar claro que não é correto pensar que falar em integração americana é necessariamente a mesma coisa que falar no Foro de São Paulo. Atualizando algumas ideias de Bonifácio, acho positiva certa forma de integração. Somos isolados culturalmente. Mal olhamos para os nossos vizinhos, a não ser quando são suscitadas rivalidades esportivas. Fazemos fronteira com dez países e mal sabemos os seus nomes. Mas daí a exportar uma contracultura revolucionária advinda não da América Latina, mas das cabeças de Marx e Engels, da experiência falida da antiga URSS, dos venenos mentais de Gramsci e da Escola de Frankfurt, e do politicamente correto, já é inaceitável – tão inaceitável que temos de estar dispostos a lutar com tenacidade contra tão abominável projeto.

Rafael Nogueira, professor de História, Filosofia, Ciência Política e Literatura, é estudioso de José Bonifácio.
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