| Foto: Henry Milleo/Gazeta do Povo

Em 28 de fevereiro, o Superior Tribunal Federal (STF) encerrou a votação de quatro Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADIs) propostas contra a Lei de Proteção da Vegetação Nativa (Lei 12.651), que substituiu o então Código Florestal em 2012. Depois de uma votação apertada, os ministros do STF optaram pela constitucionalidade da maioria dos dispositivos questionados pelas ADIs. O perdão dos crimes de desmatamento cometidos até 2008 e o uso de espécies exóticas na recomposição de Áreas de Preservação Permanente (APP) são alguns dos pontos que foram entendidos como constitucionais e, decepcionantemente, serão mantidos na lei.

CARREGANDO :)

Na prática, isso significa que proprietários que desmataram áreas naturais antes de 22 de julho de 2008 – data marco prevista na lei e que separa os desmatamentos consolidados dos novos – serão anistiados de multas e outras obrigações legais. Com apenas a assinatura de um termo de compromisso extrajudicial, flexibiliza-se a obrigatoriedade do desmatador de reparar os danos causados à biodiversidade. O problema dessa decisão é que, com ela, perdemos a oportunidade de restaurar milhões de hectares de florestas e reforçamos o sentimento de impunidade, além da frustração daqueles proprietários que no passado optaram por seguir a legislação e preservar suas áreas naturais.

A introdução de espécies exóticas invasoras é a segunda maior causa de perda de biodiversidade no mundo

Publicidade

Para piorar este cenário, nos casos em que se manteve a necessidade de reparação dos danos causados, será permitido que o proprietário use espécies exóticas na restauração de Áreas de Preservação Permanente e de Reserva Legal (RL). Dependendo de quais espécies forem utilizadas neste processo, estaremos promovendo a contaminação biológica de áreas naturais. Um exemplo dessa ameaça é o uso do pínus, espécie exótica invasora que se dissemina rapidamente, levando à perda da biodiversidade e à degradação de ecossistemas já muito ameaçados. Atualmente, a introdução de espécies exóticas invasoras é a segunda maior causa de perda de biodiversidade no mundo, atrás apenas do desmatamento.

Entretanto, aparentemente, nem tudo está perdido em termos de conservação da biodiversidade. Um ponto que vale a pena comemorar é que nascentes intermitentes (que não vertem água permanentemente) voltaram a ser consideradas Áreas de Preservação Permanente, ou seja, áreas protegidas por lei que devem ter vegetação em seu entorno. Esse ponto é muito importante, pois nascentes desse tipo são responsáveis por contribuir sazonalmente para a formação de cursos d’água e, com isso, garantir a segurança hídrica de diversas comunidades.

Leia também: O STF e o novo Código Florestal (artigo de Marcelo Buzaglo Dantas, publicado em 4 de março de 2018)

Leia também: O Código Florestal no STF e a (in)segurança jurídica (artigo de Rodrigo Lima, publicado em 27 de fevereiro de 2018)

Outro ponto que ainda divide opiniões, mas que pode vir a ser positivo, dependendo de como for estruturado pelos governos estaduais em suas regulamentações, refere-se a uma regra mais restritiva para a compensação da Reserva Legal. A partir dessa votação, proprietários rurais podem compensar a ausência da área exigida para compor a Reserva Legal via Cota de Reserva Ambiental, em outra área de mesma equivalência ecológica e não simplesmente dentro do mesmo bioma, como estava estabelecido até então. Isso significa dizer que a escolha de áreas de compensação deverá levar em consideração características bióticas e abióticas semelhantes à área faltante da Reserva Legal.

Publicidade

Diante de um cenário nada positivo para a conservação da biodiversidade, que deixa transparecer mais uma vez que o interesse de uma minoria está acima do interesse da coletividade, a esperança que nos resta é de que a sociedade preze pela conservação da biodiversidade, considerando que a falta de florestas e outras áreas naturais pode agravar os problemas climáticos e hídricos que já enfrentamos em todo o país.

André Zecchin e Marina Cioato são técnicos da Sociedade de Pesquisa em Vida Selvagem e Educação Ambiental (SPVS).