Um soldado corre por 40 quilômetros para levar a notícia da vitória ao seu povo. Arranca de si todas as forças. E consegue! Entrega a mensagem. Exausto, morre.
Não é curioso que o nome deste herói não seja lembrado por praticamente ninguém? E não é ainda mais estranho que a corrida que resultou na perda de sua vida tenha se tornado um esporte praticado por milhões em todo o mundo? Não seria esperado que, quando uma pessoa falasse de Maratona, todos lembrassem o nome de Fidípedes. Já se alguém arriscasse dizer: “Olhe, estou pensando em correr 40 quilômetros seguidos”, não seria o caso de ouvir “Está doido? Quer morrer de cansaço!?”
Pois é, talvez você tenha feito uma careta. Afinal, se as coisas não acontecem assim não é à toa. Todos nós gostamos de ver alguém estender as fronteiras do possível. Existem até provas em que se corre duas ou mais maratonas de uma vez. Caso surgisse a notícia de que alguém correu 500 quilômetros em pique de cavalo, você, eu, todo mundo iríamos querer saber quem foi. Mas e os joelhos?
Todos preferem ignorar os efeitos colaterais da busca pelo extremo. Isso se torna ainda mais prejudicial em meio à pandemia. Será que você não está exigindo de mais dos joelhos da sua alma quando se propõe a fazer de tudo de maneira irrepreensível em tempos tão difíceis como esses? Exercícios, dieta equilibrada, não beber álcool, largar o cigarro, organizar a casa, administrar o trabalho a distância em um home office organizado e 100% eficiente... Tudo muito bom, mas quase impossível.
Não é preciso aqui listar a comprovação histórica, biológica, psicológica. Você está cansado de saber que a moderação até na busca da saúde emocional é o melhor caminho. E, no entanto, não conseguimos. Ficamos encantados com os discursos e as práticas radicais.
Pouco conhecida no Brasil, a psicanalista norte-americana Karen Horney descortinou as causas e as consequências dessa compulsão ao exagero que seduz a todos nós. Dizia ela que temos um ideal de ego que busca, por meio desta ilusão de onipotência, a superação das frustrações da vida, principalmente as da infância. Esse ideal do ego, por ser tão distante das limitadas possibilidades do ego real, acaba gerando uma incomensurável frustração seguida pelo que Horney denominou como “auto-ódio” – um verdadeiro castigo masoquista.
E, então, continuamos todos fascinados pelos exageros e sofrendo pelos exageros. E principalmente os exageros na busca pelo equilíbrio emocional entram neste balaio. Afinal, quem com os pés na realidade pode querer passar por tudo isso bem?
No fim das contas, o maratonista emocional acaba por se frustrar com seu fracasso em não atingir aquelas metas tão boas de ser sonhadas e tão impossíveis de ser realizadas. E é assim que muita gente, além do medo da Covid-19, além do medo do desemprego, passa a lidar com a culpa de não estar fazendo o que devia.
Por outro lado, a maratona da moderação é a mais difícil de ser completada. A cada passo somos tentados a querer acelerar. Mas, quando nos conduzimos neste caminho do meio, nos sentiremos em harmonia com o todo, sem forçar o corpo ou a mente na busca boba por um alguém que não somos.
Então, que tal você ser um novo Fidípedes, que depois de uma bela caminhada emocional leve a mensagem da vitória da moderação para o seu povo, e depois... realizado, continue a viver bem e satisfeito consigo?
Roberto Pio Borges é psicólogo e escritor.
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