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A miséria da política partidária brasileira

Manifestantes pró-governo participam de ato na Esplanada dos Ministérios no dia 7 de setembro. (Foto: Fabio Rodrigues-Pozzebom/Agência Brasil)

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A história dos partidos políticos na República brasileira registra, em seus diferentes momentos desde 1889 até hoje, uma trajetória de programas superficiais, descontinuidade e personalismo. Não é exagero afirmar que boa parte da desorganização crônica da representação da sociedade brasileira tem suas origens na dificuldade de se estabelecer partidos políticos que definam com clareza uma orientação ideológica e um verdadeiro programa de políticas públicas independentes de alguma figura carismática ou de algum proprietário da legenda. No Brasil, ainda não surgiu um partido político que seja resultado da vontade de uma parte da sociedade e que seja reconhecido apenas pelas ideias que propõe.

Desde a transição para o regime democrático dos anos 80, o Brasil tem sido governado e politicamente organizado por partidos políticos com quatro características: herdeiros das legendas do bipartidarismo do regime autoritário MDB e Arena e suas secessões (PMDB, PSDB, DEM, PP, PSD, PL, PV); herdeiros de lideranças do período pré-1964 (PDT, PTB, PSB, Cidadania, PCB, PCdoB, Podemos); partidos oriundos do sindicalismo, com destaque para o PT e suas secessões (PT, PSol, Rede, Solidariedade); e partidos de base evangélica (Republicanos, PSC, Patriotas, DC). Restou, ainda, mais de uma dezena de partidos que compõem exóticas agremiações de extrema-esquerda com baixíssima representatividade e legendas de aluguel que não possuem alinhamento que não seja compor com o governo de plantão. Um modelo de representação política dos piores possíveis: muitos partidos, baixa representatividade, pouco compromisso dos parlamentares com a agremiação e baixa clareza de posição ideológica programática.

Em 2011 uma experiência inédita ocorreu com a fundação do Partido Novo. Grupos de classe média urbana formados majoritariamente por profissionais liberais estavam inconformados com a alta carga tributária e péssima prestação de serviços do Estado brasileiro. Trabalharam intensamente por cinco anos para registrar um genuíno partido liberal com inovadora postura em relação à política partidária tradicional descrita acima. Inovaram a ponto de se abster do uso de recursos públicos para campanha e para o partido, vivendo de contribuições privadas e voluntárias. Registrado em 2015, o Novo teve desempenho espetacular nas eleições gerais de 2018. Seus candidatos à Presidência e Vice-Presidência da República alcançaram o quinto lugar com 3% dos votos válidos, à frente de figuras consagradas da política brasileira. Destaca-se que não tiveram espaço para debates na televisão. O partido elegeu de forma surpreendente o governador de Minas Gerais, Romeu Zema, e uma bancada de oito deputados federais representando cinco estados da Federação.

Depois de quase três anos de trabalho, o governo de Minas Gerais é o que tem a melhor avaliação espontânea em pesquisas de opinião em todo o país. E os deputados do Novo foram avaliados entre os dez melhores da Câmara Federal em todos os levantamentos do Ranking dos Políticos desde então. Entende-se, então, que o projeto se tornou realidade e abriu o caminho que se tanto sonhava para que um partido de origem nas bases da classe média pudesse crescer, ocupar espaços, aplicar sua capacidade de gestão e legislar com perfil reformador, certo? Errado.

Surpreendentemente, o Novo se perdeu na administração partidária. Se conseguiu o mais difícil – provar que é possível governar e legislar com eficiência, com quadros novos e políticos jovens –, criou para si mesmo uma armadilha que o está levando rapidamente à irrelevância. Aquele que havia sido candidato à Presidência voltou a ser presidente da legenda e passou e emitir suas opiniões como se fosse a voz do partido, sem sequer consultar os mandatários do Executivo e Legislativo. Um Diretório Nacional que deveria ser aliado inseparável daqueles que estão no front político passou a ser o inquisidor de suas ações.

E o pior de tudo: a conjuntura política do país e o debate sobre as ações do presidente da República e seu governo fizeram o partido adotar postura fatal, isto é, adotar enfrentamento com o presidente e promoção da agenda de seu impedimento. Uma combinação perversa de ignorância política, imaturidade e, principalmente, arrogância fez a direção partidária romper com aquilo que era a base da criação do Partido Novo: a independência do partido, seu caráter alternativo e inovador frente àquilo tudo que existia no sistema partidário, além de seu compromisso tantas vezes repetido em campanha, de nunca debater pessoas, mas ideias e programas para o país.

O naufrágio de um projeto que se mostrou um verdadeiro sucesso se dá pelas mesmas razões da miséria que persegue o sistema partidário brasileiro. A falta de educação e maturidade da política, causada por décadas de distanciamento do cidadão das práticas de ação e representação. Do afastamento da postura sagrada de independência e compromisso com a alternativa no campo das ideias que o partido representava. E principalmente, pela incapacidade de se despersonalizar o partido, tanto de seu principal dirigente quanto da agenda critica sistemática à figura individual do presidente da República atual.

A experiência vivida sempre nos traz alguma aprendizagem, ainda que dolorosa. A tentativa de mudar o sistema partidário brasileiro pela representação diferenciada que o Partido Novo propunha não aconteceu porque não fomos capazes de despersonificar a política. A estrada ainda é longa.

Christian Lohbauer, doutor em Ciência Política, foi candidato a vice-presidente da República pelo Partido Novo nas eleições gerais de 2018.

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