Tem sido um grande desafio compreender os movimentos promovidos pela "nova economia" das startups, não só pela velocidade como as transformações estão acontecendo, mas também pela renovação dos conceitos tradicionais.
A economia mudou e impactou nosso cotidiano de forma significativa. Nosso instinto de adaptação está em alerta e tudo parece confuso nesse momento. É como se estivéssemos, bem no meio da passagem no tempo de um mundo analógico para o digital. Mas, como bem observaria Darwin, nosso poder de adaptação nos faz diferentes de qualquer espécie que já pisou nesse planeta. Um dos atalhos para aproveitar as oportunidades trazidas por essa "nova economia" das startups é entender que nada se cria, tudo se transforma (nada que o Lavoisier já tenha falado há mais de 200 anos). Muito do que se discute hoje tem um “quê” de déjà vu. Déjá vu aqui em um sentido clássico e teórico do conceito, afinal a maioria desses "novos" entendimentos são conceitos-base da teoria econômica revestidos por um véu de modernidade adaptativa.
Podemos decifrar esses "novos" conceitos e confrontá-los com os que a teoria econômica já mostra
Muitas definições utilizadas pela nova economia surgem agora nos noticiários econômicos como se fossem novidade. Por exemplo, o conceito de economia de escala, que hoje fundamenta a rota de valor criada pelas startups e que justifica a velocidade de seu crescimento é entendido como exponenciabilidade. O que vemos nas startups é que elas são capazes de entregar o mesmo produto numa escala potencialmente ilimitada e exponencial, ou seja, o novo produto entregue custou menos do que anterior, e em alguns casos esse custo de uma nova unidade vendida pode estar próximo de zero – pense aqui em um novo usuário do Facebook e quanto ele agrega de custos para a empresa do Mark Zuckerberg.
Na teoria econômica, em especial na microeconomia, estuda-se esse movimento através do conceito de custo marginal. Em um sistema capaz de produzir economia de escala, o custo marginal será decrescente. Quanto menor, mais deve-se produzir e ganhar escala. David Ricardo já falava disso no século 19, apesar da economia, nesse tempo, ser sustentada pela agricultura e pouco pelo comércio.
O termo escalabilidade virou moda no mundo das startups, algo que precisa ser alcançado para que um modelo de negócios fique sustentável. É fundamental que todo empreendedor esteja atento para a busca das economias de escala. Precisa sim, sempre buscar o ponto ótimo para construir a melhor rota de valor para essas novas companhias, mas ele tem que saber que nada disso é novo.
Por outro lado, atualmente as empresas ligadas à "nova economia" discutem o conceito de MVP para seus produtos ou serviços. MVP é a sigla de minimum viable product e significa produto mínimo viável. Lançar um MVP não é mais do que ofertar um produto ou serviço com o mínimo de custos possíveis para que ele possa ser testado e validado pelo mercado, ou seja, significa atingir a fórmula antiga de viabilidade de produção que já era ensinada pelos economistas neoclássicos no século 19. Se a esse raciocínio inserimos o conceito de valor agregado, que significa na capacidade de somar valor de uso e de utilidade no produto ou serviço, conseguimos descrever qual é a procura atual das empresas num mercado cada vez mais volátil e incerto. Definitivamente, nada novo conceitualmente.
Disrupção é o conceito usado para descrever mudanças estruturais em sistemas econômicos e mercados. É, por exemplo, o que o Uber, Spotify, Airbnb causaram nos seus respectivos mercados. "Disruptar" até virou verbo moderno. Se trocarmos disrupção por destruição criadora, não teríamos nenhuma alteração na estrutura do conceito. A diferença é que o economista austríaco Joseph Schumpeter, já discutia isso em 1942 no seu livro Capitalismo, Socialismo e Democracia. Schumpeter precisamente apontava a necessidade de inovação para entender ciclos econômicos e novas fases do capitalismo.
- Paraná, um polo de inovação (artigo de Armando Kolbe Júnior, publicado em 6 de setembro de 2019)
- O Vale do Silício brasileiro (artigo de João Panceri e Aldo Macri, publicado em 4 de outubro de 2019)
- O que pode mudar para o empresário a partir de 2019? (artigo de Marina Luiza Amari, publicado em 12 de setembro de 2019)
Ainda podemos decifrar esses "novos" conceitos e confrontá-los com os que a teoria econômica já mostra, levaria um livro para fazer isso. Nosso ponto aqui é que ninguém está inventando a roda, só precisamos entender do que estamos falando.
Acreditamos que quanto mais empreendedores engajados, novas soluções serão criadas, mais valor será construído, e toda economia se beneficiará positivamente. E para que mais iniciativas surjam, o entendimento de todas as possibilidades econômicas se torna crucial para o ecossistema. Isso precisa ser um chamado para que os economistas consigam traduzir seus conceitos para a aplicação prática dos empreendedores e, ao mesmo tempo, os criadores e gestores de startups consigam entender e usufruir do que há de melhor na teoria econômica.
É possível continuar explicando, por exemplo, de divisão do trabalho, do Adam Smith, mas em lugar de falar da fabrica de alfinetes, por que não usar como exemplo a fabrica da indústria automotiva Tesla? Em ambos os exemplos, os conceitos-base, são os mesmos. Essa é a grandeza da teoria econômica. Por tudo isso, acreditamos no papel vital do economista como intermediador desse momento histórico.
Hugo E. Meza, economista, professor da Faculdade Estácio de Curitiba e Fundador da Amauta - Economia Criativa. Léo Jianoti, economista, investidor-anjo e conselheiro de empresas.
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