O Rio e o Brasil estão comemorando mais uma vez a entrada de nossos soldados na luta contra a violência que tomou conta dessa bela cidade. Diante da guerra civil em andamento, não há como ficar contra a decisão do governo federal, mas é preciso estar alerta aos seus riscos e limitações.
Com as Forças Armadas nas ruas, a população carioca pode ter um fôlego de paz, mas sob o risco de envolver nossos soldados em mortes: a deles e a de bandidos nas ruas. As consequências dessas mortes poderão ser muito graves para o necessário casamento entre os brasileiros e suas Forças Armadas.
Ao escolhermos o caminho do enfrentamento entre nossos soldados e a guerrilha do crime, adotamos o risco de soldados matarem brasileiros, inclusive com prováveis “efeitos colaterais”, eufemismo para dizer vítimas inocentes de balas perdidas atiradas por armas de um lado ou de outro. Somente neste ano de 2017, 92 policiais militares e mais de 500 civis, inclusive crianças, foram mortos na guerra entre bandidos e policiais. São estatísticas assustadoras: ainda mais graves se envolverem nossos soldados.
Continuamos preferindo os soldados aos professores, a segurança provisória à paz permanente
Igualmente graves são os limites desta opção. O Exército não pode ficar para sempre nas ruas do Rio, nem de outras cidades. No dia seguinte à saída dos militares, mesmo não sendo vista como derrota, os bandidos voltarão com espírito de vencedores. Sem falar no risco de sucesso da guerrilha do crime, se não diretamente no enfrentamento com nossos soldados, indiretamente pela disseminação da bandidagem em outras cidades.
A solução provisória será uma agravante. Ainda que tenham sucesso momentâneo, os soldados não construirão a paz permanente, que só viria se o governo federal ocupasse o Rio com professores bem preparados, dedicados, bem remunerados, em escolas bonitas e bem equipadas, todas com horário integral.
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Há anos, muitos dizem que, se o Brasil não ocupar suas cidades com professores, teria de ocupá-las com soldados. Darcy Ribeiro dizia que, se não fizermos escolas, teremos de fazer cadeias. Ou ocupamos com professores ou não adianta ocupá-las com soldados. Mas continuamos preferindo os soldados aos professores, a segurança provisória à paz permanente. Comemoramos a federalização da segurança, mas nos recusamos a federalizar a educação. Se todas as crianças do Rio tivessem escolas equivalentes aos colégios federais militares ou ao Pedro II, em uma geração teríamos um ambiente de paz, evitando a necessidade da precária e arriscada opção militar.
Talvez isso nunca vá acontecer, por causa da miopia em relação ao futuro que nos faz preferir soldados nas ruas, muros nos condomínios e carros blindados a uma paz duradoura que vem da educação. Em grande parte, porque temos três ideias arraigadas: a de que educação não resolve o problema; a de que não podemos esperar por ela; e, sobretudo, a ideia de que no Brasil não há como oferecer escola com a mesma qualidade para os filhos de ricos e filhos de pobres. Esta mentalidade é a principal origem da violência que agora tentamos barrar com soldados.
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