Meio ano do segundo mandato não se comemora, mas vale o registro e a tentativa da interpretação do estilo presidencial na curtição do bis em clima de festa, na cadência do "é hoje só, amanhã não tem mais".

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Lula só desperta e entra em campo quando se sente ameaçado. A crise moral que devasta o Congresso e arrasta o Senado na sucessão de escândalos não provocou um gesto ou um vinco na testa presidencial. Mas, buliu com a sua tranqüila fruição do cargo, quando bateu à sua porta o risco da defenestração do senador Renan Calheiros, um aliado de mil e uma utilidades na presidência do Senado. Convocou a turma ao seu gabinete e bateu o martelo na escolha do senador Leomar Quintanillha, do obediente PMDB do Tocantins, para presidente do Conselho de Ética. Está resolvida a parada.

O presidente pode voltar à despreocupação: a delegação virtual da responsabilidade pela rotina à ministra Dilma Rousseff, chefe do Gabinete Civil; a generosidade com que cria e distribui cargos de confiança aos cupinchas, a extravagância da criação do Ministério surrealista para prever o futuro, entregue ao seu inimigo de véspera, o mago Mangabeira Unger. Tudo isso compõe o cenário em que se distrai o mais feliz dos brasileiros.

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A auto-estima em dose dupla maquia a imagem refletida no espelho do "maior presidente de todos os tempos", que realiza "o maior governo da história deste país" e que recebeu nova injeção de otimismo com os dados da última pesquisa, confirmando a sua popularidade na altura celestial de 64%.

Lula vê o país do alto, nas asas do Aerolula, como milionário em férias, imune a todas as crises que atormentam milhões, como o apagão aéreo, a violência solta nas ruas e invadindo residências; as estradas esburacadas retendo milhares de veículos por dias e semanas; portos abarrotados, com imensas filas para o embarque e desembarque das cargas; hospitais com filas de doentes varando madrugadas à espera da vaga nas macas enfileiradas nos corredores, marchas do MST na invasão e depredação de fazendas produtivas e na ocupação de prédios públicos.

No segundo mandato, sem nova reeleição à vista, tem muitos motivos para desfrutar o momento de vento a favor e céu sem nuvens. Blindou a popularidade com a esperteza e os truques do aprendizado na liderança do movimento sindical, na militância política como fundador e presidente do Partido dos Trabalhadores e em quatro campanhas como candidato a presidente da República.

Sabe que é maior do que o PT e preza a solidariedade da legenda para carimbar a coerência: o partido da desbotada estrela vermelha sobrevive às custas do governo, que invadiu com a sofreguidão da longa espera.

Mas, se o PT e os aliados comem na sua mão, o presidente do país das maravilhas deve muito da sua tranqüilidade à inanidade da oposição. Está sozinho no picadeiro, sem adversário que o ameace. Os dois mais fortes pretendentes do anêmico bloco oposicionista – os governadores Aécio Neves, de Minas, e José Serra, de São Paulo – necessitam da ajuda federal para a realização dos projetos de grandes obras públicas.

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Programas populares, como o Bolsa-Família, o Bolsa-Escola, a construção de casas populares, o bom desempenho da economia, a inflação sob controle escoram os estáveis índices de popularidade.

Inflado de vaidade, Lula não controla a língua e costuma misturar frases desastradas com provocações que irritam os adversários. Como o misto de arrogância e deboche do auto-elogio, em transcrição fiel: "As coisas estão dando tão certo que eu fico preocupado de gente incomodada procurando pêlo em ovo para poder encontrar um jeito de fazer crítica ao país".

Villas-Bôas Corrêa é analista político.