É importante que deixemos nosso espaço de conforto e passemos a nos preocupar com o espaço público-político

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Muitos tratam o momento eleitoral como sendo a "festa da democracia". Todavia, o processo democrático não se resume aos três meses de campanha e nem se esgota no instante do comparecimento à urna. A democracia clama pelo exercício diário da cidadania, exercício este que – tal como os exercícios físicos – demanda perseverança, persistência e somente produz resultados a longo prazo.

Temos uma presidente eleita. E o que dela sabemos? A pauta de debates atendeu às expectativas dos eleitores? Somos anfitriões ou coadjuvantes da "festa da democracia"? O que assistimos ao longo da campanha eleitoral foi aquilo que nos quiseram apresentar os marqueteiros políticos.

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Questões importantes ligadas à política externa, à tributação, à previdência e ao emprego foram praticamente alijadas da campanha, surgindo apenas aqui e acolá. Na pauta das eleições presidenciais, em um estado laico, predominaram questões religiosas como o aborto e a legalização da união cível entre homossexuais.

É possível que o modelo de campanha existente no Brasil esteja esgotado, mas é possível também que tenhamos nos acomodado ao plano traçado pelo marketing político, sem conseguir provocar o debate de questões que afetam de maneira contundente nosso dia a dia e o futuro do país.

Curiosamente, é agora, depois de proclamado o resultado das urnas, que sairão de cena os profissionais de marketing e entrarão os profissionais da política. É agora que assuntos como plano de governo e quais as forças políticas que ocuparão o núcleo do poder passarão a dominar a mídia. É a partir de agora que iremos conhecer a candidata alçada à Presidência da República pelos extraordinários índices de popularidade do atual mandatário nacional.

Diante desse quadro, é imprescindível que exerçamos nosso papel de cidadãos para além do momento eleitoral. Para tal mister é importante que deixemos nosso espaço de conforto e passemos a nos preocupar com o espaço público-político.

Já dizia o poeta Fernando Pessoa que "há um tempo em que é preciso abandonar as roupas usadas, que já tem a forma do nosso corpo, e esquecer os nossos caminhos, que nos levam sempre aos mesmos lugares. É o tempo da travessia: e, se não ousarmos fazê-la, teremos ficado, para sempre, à margem de nós mesmos."

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A política – boa ou má, exitosa ou malsucedida – é feita diariamente e é responsabilidade dos eleitores. Transferir responsabilidades é abdicar do direito de interferir no espaço de governo e infringir o dever de colaborar para a construção de um Brasil mais desenvolvido e com menos desigualdades. Muitos são os instrumentos de participação colocados à disposição dos cidadãos brasileiros: audiências públicas, ouvidorias, corregedorias, redes sociais, blogs, entre outros. Não nos deixemos substituir.

Nesse fantástico mundo da internet podemos nos comunicar com nossos representantes de maneira muito efetiva. Saibamos utilizá-los de forma responsável e crítica no próximo quadriênio, sob pena de continuarmos eternos coadjuvantes da "festa da democracia".

Isabela Martins Ramos é presidente da Associação dos Procuradores do Estado do Paraná (Apep).