Os mentores da política galinácea adotada no campo da arrecadação tributária têm tido arroubos ambiciosos nos últimos tempos. Soltaram balões de ensaio visando anular o previsto nos artigos 76 e 84 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias ADCT , que estabelecem a morte e sepultamento no final do próximo ano, exatamente em 31 de dezembro de 2007, da Desvinculação das Receitas da União-DRU e da Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira-CPMF.
São dois instrumentos de extorsão, que tornam cada vez mais inclemente a carga tributária absurda que oprime os padecentes tributários do país, em subserviência obsequiosa do governo federal aos organismos internacionais, cuja linha de frente é ocupada pelo FMI.
Como se sabe, a política de galinha se caracteriza pela abrangência micha, em face do seu vôo curto; pelas inconstâncias que lhe são típicas, decorrentes da sua infidelidade aos deveres elementares, no caso, ao disciplinamento constitucional; ao processo alimentar, enchendo o papo de grão em grão, tomando recursos daqui e dali para encher os cofres do tesouro; e, finalmente, a sua base operativa é o poleiro, cheio de resíduos, a fundamentar suas políticas arrecadatórias.
A CPMF constitui o tributo mais indecente da constelação espoliativa do povo brasileiro. Parece inofensivo se considerada a insignificância da sua alíquota: 0,38%. As aparências enganam. A sua arrecadação ultrapassará 30 bilhões de reais, muito superior ao somatório do IPI, imposto de importação, imposto sobre operações financeiras e o imposto territorial rural. Onera todo o processo produtivo nacional, quando se realiza o pagamento, por cheque, das matérias-primas e mão-de-obra necessárias à fabricação das mercadorias e à prestação dos serviços. E, pior, incide também sobre o consumo, quando os consumidores retiram os recursos das instituições financeiras para o pagamento das compras no mercado. É o seu efeito gilete. Corta dos dois lados. Invade bases econômicas de todos os outros impostos e contribuições. É o efeito invasor. Onera, como dito todo, o processo produtivo nacional, tornando mais atraente a importação do similar estrangeiro, que não sofre sua incidência. É o efeito entreguista ou quinta-coluna a conspirar contra os interesses nacionais.
O governo federal vai tentar eternizar a incidência da CPMF, revitalizando-a em prejuízo dos padecentes tributários e do processo produtivo nacional, tornando-a tributo permanente, embora dissimulado em fórmula menos gravosa.
A DRU constitui uma garfada em 20% das contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico. Tais contribuições constituem tributo vinculado à uma finalidade específica. A retirada de 20% das contribuições sociais implica em sacrificar nesse percentual os recursos da seguridade social saúde, previdência e assistência social acarretando o alegado déficit nas finanças da previdência social, que, conforme prega o governo, deverá sofrer nova reformulação para suprir a carência de recursos. Entenda-se nessa formulação a elevação da contribuição previdenciária, PIS, Cofins, e permanência da CPMF. Mais aumento de carga tributária. Na parte das contribuições de intervenção no domínio econômico o que ocorre é vergonhoso e catastrófico desvio de recursos de sua finalidade específica. As estradas, a ciência e a tecnologia, os aeroportos, a poluição, a telefonia, têm bilhões garfados da destinação estabelecida na lei, para ser utilizados no pagamento dos juros da dívida pública federal, apaziguando os seus credores. Recursos que deveriam ser utilizados em favor da nação e dos cidadãos deserdados deste país, em obras de infra-estrutura e criação de emprego, são direcionados para os rentistas, credores da União. Agrada-se a casta espoliadora, em detrimento da nação e do povo.
É uma opção governamental. Mas repete o processo espoliativo que há quinhentos anos depaupera a nação e o povo brasileiro. Agrado para a casta detentora do capital rentista e arrocho e extorsão para o padecente tributário. É tempo de mudar e fazer prevalecer o interesse genuinamente nacional.
Osíris de Azevedo Lopes Filho é advogado, professor de Direito na Universidade de Brasília UnB e ex-secretário da Receita Federal.