Em 2011, o Instituto de Políticas Públicas em Direitos Humanos do Mercosul (IPPDH) prestou apoio técnico aos países do bloco – Argentina, Brasil, Paraguai e Uruguai – para apresentar à Comissão Interamericana de Direitos Humanos, em sua sede em Washington (EUA), os fundamentos da consulta que resultaria na Opinião Consultiva 21/14: “Direitos e garantias de crianças no contexto da migração e/ou em necessidade de proteção internacional”, aprovada pela Corte Interamericana de Direitos Humanos.
Nesta ocasião, tive a oportunidade de acompanhar essa proposta como representante alterno do Paraguai na Organização dos Estados Americanos (OEA). Essa foi a primeira vez que um bloco regional apresentou, de maneira consensual, uma resposta adequada ao enfoque de direitos humanos para afrontar a problemática da proteção dos direitos das crianças migrantes em todo o continente.
Quatro anos se passaram desde a sua promulgação, e a situação da mobilidade humana no mundo nos expõe à necessidade, cada vez com maior urgência, de voltar a recordar os fundamentos da proteção dos direitos humanos das pessoas migrantes e, em particular, da dupla vulnerabilidade das crianças e adolescentes migrantes.
Os migrantes são um grupo em situação de vulnerabilidade
Desde o IPPDH, afirmamos que a partir dos primeiros anos do século 20 a proteção dos direitos humanos se converteu em uma questão de interesse da comunidade internacional. Na Sociedade das Nações (antecedente da Organização das Nações Unidas), estabelecida ao fim da Primeira Guerra Mundial, tratou-se de criar um marco jurídico e mecanismos de vigilância internacionais para a proteção das minorias. Os crimes cometidos durante a Segunda Guerra Mundial deram um impulso definitivo ao estabelecimento de um sistema internacional vinculante para a proteção dos direitos humanos, centrado na ONU.
Nas últimas décadas, as crianças têm sido objeto de uma crescente proteção por parte do direito internacional dos direitos humanos. Entre as múltiplas situações que agravam a vulnerabilidade das crianças se encontra a condição de migrantes. Os migrantes são um grupo em situação de vulnerabilidade, devido a situações de jure (desigualdades entre nacionais e estrangeiros nas leis) e de facto (desigualdades estruturais). Isso leva a diversas formas de desigualdade no acesso a serviços públicos administrados pelo Estado. Além disso, existem preconceitos culturais sobre os migrantes, que favorecem a reprodução de suas condições de vulnerabilidade. Entre eles estão os preconceitos étnicos, a xenofobia e o racismo, que dificultam a integração dos migrantes na sociedade.
Opinião da Gazeta: O drama dos venezuelanos no Brasil (editorial de 27 de fevereiro de 2018)
Leia também: Venezuelanos, lei migratória e hospitalidade (artigo de Thiago Assunção, publicado em 26 de fevereiro de 2018)
As reações de criminalização dos migrantes em países tradicionalmente respeitosos dos direitos humanos nos obrigam a redobrar os esforços para promover, em foros internacionais e nos âmbitos regionais, ações de proteção e garantia dos direitos humanos dos migrantes e de suas famílias.
O Mercosul promove uma resposta solidaria e respeitosa aos padrões de direitos humanos diante da emigração massiva de cidadãos venezuelanos e venezuelanas. Os países sul-americanos estão mostrando que, como ocorreu antes em relação a pessoas migrantes provenientes principalmente da Europa, as Américas continuam sendo um continente de acolhida, refúgio, asilo e integração.
No âmbito dos grupos de pesquisa do IPPDH, estamos impulsando a iniciativa denominada Foco Infância Migrante, dirigida a aprofundar a análise e os desenvolvimentos da política pública regional, para prestar assistência técnica e cooperação aos países do Mercosul e associados. Redobremos o esforço pelos direitos das crianças migrantes, porque elas são uma das razões mais importantes do nosso compromisso com o futuro compartilhado.