A qualidade da educação tem mais chances de florescer quando o seu controle sair das mãos dos burocratas do sistema para passar ao controle da comunidade servida e for entregue a educadores
A melhoria da qualidade da educação é assunto que vem despertando crescente interesse nos últimos anos. Discute-se a qualidade do ensino de todos os níveis e graus. Na verdade, mais se reclama do que se aprofunda a discussão. As reclamações assumem proporções maiores quando se aborda o ensino superior, cujo ciclo educacional alcança o seu último estágio. Aí, como para desobrigar a consciência, a culpa é lançada sobre as etapas anteriores. Nota-se, entretanto, que a discussão se generaliza, não apenas no Brasil. Provavelmente, a qualidade do ensino nunca tenha suscitado tanto interesse anteriormente.
Mais do que assunto de discussão ou reclamação, entre nós, o tema da melhoria da qualidade da educação vem se tornando objeto de preocupação. Sobram motivos que justificam tal atitude. Nesse ponto, parece haver pouca discordância. A matéria desassossega pais, educadores, estudantes e autoridades governamentais. A questão deixou de ser debatida apenas nos círculos acadêmicos e passou também a ocupar amplo espaço na mídia, dada a sua relevância para toda a sociedade.
"Pela melhoria da qualidade do ensino" tem-se tornado um slogan repetido por toda a parte: por estudantes e por reitores, por associações de docentes e por políticos. O assunto é prato cheio nos palanques, nas universidades e nas praças públicas, principalmente em momentos de eleições. Terminadas as eleições, dá-se a missão por concluída. Pensa-se que essa dívida pública, como a financeira, não se paga; rola-se até o próximo pleito, quando o tema volta ainda mais forte na agenda dos novos atores, porque a situação, muito provavelmente, terá piorado. Nota-se claramente que, em muitas instâncias, a retórica tomou conta do discurso, desbancando a severa plataforma do urgente e do indispensável.
Parece generalizar-se no país, até nos meios acadêmicos, a crença de que a melhoria da qualidade das escolas, se é que tal coisa seja possível, virá como resultado de iniciativas externas. As próprias instituições encontram-se, de certo modo, anestesiadas, à espera de decisões a serem tomadas fora delas, sobretudo em instâncias governamentais. Imagina-se, equivocadamente, que a salvação e o resgate da educação venham de fora e possam acontecer sem a sua participação. Aqui se enfatiza exatamente o contrário. Proclama-se que as escolas, felizmente, possuem a capacidade interna de se aprimorar. Neste particular, estou convencido de que as mudanças oriundas e sustentadas a partir de dentro têm mais chance de promover a melhoria efetiva e duradoura da qualidade. Se no interior da escola pouco se faz, a qualidade e a excelência do ensino, como no soneto "Lamento das coisas", de Augusto dos Anjos, vão jazer "na estática do nada".
Parece claro que o sistema de ensino do país não será nem melhor nem pior do que as instituições que o compõem. A educação implementa-se tão somente no âmbito local, em nível de escola, de faculdade ou de universidade. O sistema, por assim dizer, é uma abstração. O que existe de concreto são instituições, com nome e endereço, onde a educação, de boa ou de má qualidade, se processa.
Não se pretende, nem de longe, insinuar que instâncias externas, sobretudo as governamentais, nada tenham que ver com a educação. Têm e muito, sobretudo em termos de infraestrutura e recursos. Simplesmente chama-se a atenção para o papel insubstituível das instâncias internas da escola no processo de melhoria da qualidade da educação. É até fácil observar que boa parte da responsabilidade pela baixa qualidade da educação nacional recai sobre as políticas educacionais adotadas pelo poder público. O marasmo, a desagregação, o desânimo e a falta de criatividade, que tomaram conta de alguns muitos ambientes escolares públicos e privados têm, em parte, a sua origem fora deles. A situação da educação no Brasil pode ser atribuída, entre outras causas, à exacerbação da intervenção das instâncias governamentais na vida das instituições. Parece que uma das grandes decisões para o bem da educação no país, que deve ser assumida fora das escolas, seria precisamente a de se reduzir a interferência externa no funcionamento das instituições e a de se potenciar a sua autonomia.
A qualidade da educação tem mais chances de florescer quando o seu controle sair das mãos dos burocratas do sistema para passar ao controle da comunidade servida e for entregue a educadores, aportando-lhes, isso sim, mais apoio e melhores condições de trabalho.
Clemente Ivo Juliatto, reitor da Pontifícia Universidade Católica do Paraná, é membro da Academia Paranaense de Letras.
Lula tenta conter implosão do governo em meio ao embate sobre corte de gastos
PEC contra jornada 6×1 supera assinaturas necessárias para iniciar tramitação na Câmara
Itaipu e Petrobras destinam R$ 33,5 milhões para Janjapalooza e eventos do G20
Governo Lula 3 registra prejuízo de R$ 1,7 bilhão em vacinas vencidas
Deixe sua opinião