Nos últimos anos, o número de processos contra médicos teve um crescimento exponencial. Com esse cenário, é necessário analisar em detalhes se o erro médico realmente ocorreu ou se o processo decorre apenas de um mero descontentamento com o resultado do tratamento por parte do paciente.
Primeiramente, é necessário apresentar o conceito de responsabilidade civil, também aplicado na responsabilidade civil por erro médico e definido da seguinte maneira por Maria Helena Diniz: “A responsabilidade civil é a aplicação de medidas que obriguem alguém a reparar dano moral ou patrimonial causado a terceiros em razão de ato do próprio imputado, de pessoa por quem ele responde, ou de fato de coisa ou animal sob sua guarda (responsabilidade subjetiva), ou, ainda, de simples imposição legal (responsabilidade objetiva)”. Com essa definição, é possível constatar que, mediante o cometimento de um ato ilícito (segundo o artigo 927 do Código Civil), o causador do dano deverá reparar a vítima.
A responsabilidade civil se divide em duas modalidades, a objetiva e a subjetiva. A responsabilidade civil objetiva tem dois requisitos: o dano e o nexo causal (ou nexo de causalidade). No entanto, os médicos respondem pela responsabilidade civil subjetiva, modalidade que tem mais um requisito: além do dano e do nexo causal, a culpa. Para a responsabilização por erro médico é necessário o preenchimento dos três critérios.
O dano é o prejuízo moral ou material que a vítima sofreu, sendo que esse dano tem de ser atual, certo e real, evitando assim cenários de situações hipotéticas. No dano material poderá haver aplicação dos danos emergentes, ou seja, trata-se do que a vítima realmente perdeu com o dano sofrido (gastos com remédios, com outras cirurgias etc.) e também de lucros cessantes, que representam o que a vítima efetivamente deixou de ganhar na sua profissão devido ao dano sofrido. O nexo de causalidade é o ponto que liga a conduta do agente ao dano. O profissional realizou o ato médico e, em decorrência disso, a vítima sofreu um dano. Esse elo que une os dois é o que se chama “nexo de causalidade”.
A profissão do médico é uma atividade-meio e não de fim, ou seja, uma atividade que não tem como prometer um resultado
Dos três requisitos, a culpa é o mais importante e divide-se em mais três situações, segundo o Código de Ética Médica e Código Civil: a imprudência, a negligência e a imperícia. A imprudência é a prática de uma ação irrefletida, ou precipitada. Um exemplo seria o do cirurgião que não aguarda a chegada do médico anestesista e inicia a cirurgia assim mesmo, surgindo um erro pela falta de atuação desse segundo profissional. A negligência é a falta de cuidado ou desatenção por parte do profissional na sua atividade laborativa. Ela implica em omissão ou falta de observação no dever de agir. Ressalta-se, nesse requisito, que o profissional não age com o cuidado necessário. Um exemplo é o do médico que esquece uma tesoura cirúrgica dentro do corpo do paciente. Perceba-se que a imprudência consiste em uma ação, enquanto a negligência, em uma omissão.
Por último temos a imperícia: a falta de aptidão ou habilidade específica para a realização do ato médico. Um exemplo fácil para entender isso é o do médico cardiologista que resolve realizar uma cirurgia neurológica.
É necessário o preenchimento de um dos três requisitos obrigatórios exigidos pela lei; o médico tem de ter agido com imprudência, negligência ou imperícia. Sem isso, ele não terá o dever de indenizar. E a análise desses requisitos será feita por perícia no decorrer do processo.
Com esse embasamento, é necessário realizar a diferenciação de alguns conceitos para entender o quadro geral, como, por exemplo: o que é ato médico? Existem outros tipos de atos? Sim, existem outros tipos. O ato médico é o ato que só pode ser realizado pelo médico, é um ato exclusivo e que, devido à sua formação profissional, só ele poderá praticar. Existe também o ato paramédico, realizado por outros profissionais da saúde, como enfermeiros, socorristas, fisioterapeutas etc. E, por fim, o ato extramédico, praticado por funcionários do hospital.
Leia também: Viver da medicina ou para a medicina? (artigo de Donizetti Giamberardino Filho, publicado em 17 de outubro de 2015)
Quem poderá ajuizar uma ação e quem poderá responder? A própria vítima – e, na morte dela, o seu espólio (artigos 943 do Código Civil e 110 do Código de Processo Civil) –, bem como seus familiares, poderão requerer a compensação pelo dano sofrido em nome próprio (dano reflexo ou ricochete). Poderá responder pela ação o médico, o hospital e o plano de saúde (responsabilidade solidária).
A profissão do médico é uma atividade-meio e não de fim, ou seja, uma atividade que não tem como prometer um resultado, mas apenas garantir que o profissional irá empregar as melhores técnicas para atingir o objetivo esperado. O preceito funciona assim porque na área da saúde existem inúmeros fatores que influenciarão o tratamento, como a reação aos medicamentos, o cumprimento das prescrições médicas por parte dos pacientes etc. Essa regra geral não se aplica a cirurgias plásticas, mas essa é outra discussão.
Levando em consideração esse cenário na relação entre médico e paciente, existe um vínculo contratual, com a aplicação do Código de Defesa do Consumidor e o consequente emprego do seu artigo 6, que trata sobre o direito de informação. O consumidor tem o direito de ampla informação sobre o serviço prestado, aplicando ao presente tema informação sobre os riscos, as contraindicações, os possíveis efeitos colaterais, as probabilidades de êxito, tratamentos alternativos/similares etc.
O ponto mais importante é a parte que trata sobre a culpa. Portanto, não agindo o profissional com imprudência, negligência ou imperícia, não terá ele o dever de indenizar o paciente por um mero descontentamento com o tratamento. Respeitando tais normas legais, o profissional estará amplamente amparado pela legislação caso venha a responder a um processo.
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