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A recente inauguração de um gasoduto de mais de 5.000 km conectando a Rússia à China marca uma mudança significativa no equilíbrio energético global. Desenvolvido pela Gazprom, a gigante russa do setor de energia, o projeto alivia a pressão enfrentada pelo país após as sanções ocidentais e a explosão do gasoduto Nord Stream em 2022. A Rússia, que antes dependia fortemente da exportação de gás natural para a Europa, agora volta seu foco para o mercado chinês, uma das economias mais sedentas por energia.
A explosão do Nord Stream e as sanções impostas pelo Ocidente, lideradas pelos EUA, restringiram severamente as exportações de gás russo para a Europa. Enquanto isso, os Estados Unidos preencheram a lacuna, enviando volumes recordes de gás natural liquefeito (LNG) para o continente. Esses navios criogênicos reforçaram a independência europeia em relação à Rússia, mas não sem custos logísticos e ambientais significativos.
O novo gasoduto Rússia-China é mais do que uma infraestrutura energética; simboliza uma redefinição de alianças geopolíticas
Além disso, o gasoduto que atravessa a Ucrânia, um resquício da era soviética, está com os dias contados. O governo ucraniano planeja encerrar sua licença de operação até o final de 2024, como forma de limitar os lucros russos. Essa decisão, combinada com invernos potencialmente rigorosos, aumenta as preocupações sobre a estabilidade energética na Europa.
O gasoduto recentemente concluído é projetado para transportar até 100 milhões de metros cúbicos de gás por dia, cerca de 25% da capacidade do Nord Stream que foi destruído. Ele abastecerá regiões estratégicas da China, como Beijing-Tianjin-Hebei e o Delta do Rio Yangtzé. Essa parceria fortalece os laços econômicos entre os dois países, enquanto desafia as iniciativas ocidentais de isolar a Rússia economicamente.
A chegada de um novo governo nos Estados Unidos, com promessas de paz na Ucrânia e de estabilização das relações internacionais, traz incertezas. A capacidade do presidente eleito de equilibrar conflitos na Ucrânia, entre Israel e Hamas, e as tensões envolvendo China e Taiwan, será um teste significativo. Além disso, a política energética dos EUA, com reservas substanciais de gás natural, levanta questões sobre sua estratégia futura: continuar exportando volumes elevados ou focar no mercado interno, dado o cenário econômico e ambiental.
Enquanto isso, o Brasil busca fortalecer suas relações comerciais com a China e importa diesel da Rússia. Ao mesmo tempo, de forma contraditória, realiza exercícios militares em parceria com os EUA na fronteira venezuelana. O país também explora alternativas regionais, como a importação de gás natural da Argentina, mesmo diante de divergências políticas e ideológicas entre os líderes.
O novo gasoduto Rússia-China é mais do que uma infraestrutura energética; simboliza uma redefinição de alianças geopolíticas. Com a Europa cada vez mais afastada da Rússia, a China emerge como a principal beneficiária dessa transformação, enquanto os EUA consolidam seu papel como fornecedor global de gás natural. Nesse cenário dinâmico, a resiliência e a adaptação estratégica de cada país determinarão seu lugar no novo equilíbrio energético global.
Armando Cavanha é consultor da área de petróleo e gás e professor da PUC-Rio.
Conteúdo editado por: Jocelaine Santos