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Artigo

A segurança pública, o consenso e o descaso

 | Daniel Castellano/Gazeta do Povo
(Foto: Daniel Castellano/Gazeta do Povo)

A respeito dos vários papéis que podem ser exercidos pelo Estado, preponderam duas visões: uma que apresenta tendência em direção a um Estado mínimo, e outra que tende a um Estado mais provedor. A primeira tem suas raízes no chamado liberalismo, acreditando que o Estado deve interferir pouco no meio social. Na prática, confia na liberdade individual e na engrenagem da economia de mercado para o sustento e emancipação do cidadão. A segunda visão tem suas raízes no chamado Estado social, no qual deveria o Estado intervir para assegurar diretamente melhores condições de vida para o indivíduo, entendendo que o próprio mercado não seria suficiente para tanto.

Como a sociedade atual é extremamente plural, com uma miríade de grupos de interesse e entendimentos diversos, a busca por pontos de contato é fundamental. Estamos falando de estabelecer consensos. Avançaremos tanto mais quanto formos capazes de encontrar consensos na complexa e pluralista sociedade de hoje. A visão liberal crê que deve existir, pelo Estado, a garantia dos contratos e da segurança individual. Em outros termos, ênfase no Poder Judiciário e na segurança pública. O Estado provedor não exclui esses requisitos: acredita que a eles devem ser somados muitos outros. Assim, por que não ver a atuação estatal por meio do Judiciário e da segurança pública como um consenso? Ora, em vez de formarem um mínimo de Estado, eles devem ser vistos também como pontos consensuais.

Falta o essencial: pessoal, remuneração digna, gasolina para as viaturas, armas, munições e coletes

Mas, no caso da segurança pública, estariam os governantes dando a devida importância a algo que pode ser considerado um consenso entre as diversas concepções de Estado? Considerando os fatos recentes ocorridos em várias unidades da Federação, com o Espírito Santo como último exemplo, a resposta parece ser negativa. Em regra, falta o essencial: pessoal, remuneração digna, gasolina para as viaturas, armas, munições e coletes. Sobre a polícia investigativa, excetuadas ilhas de excelência, análise já apontou que o índice de elucidação de homicídios é de apenas 5%, ao passo que no Reino Unido é de 90% e na França, 80%, segundo dados da Estratégia Nacional de Justiça e Segurança Pública. O nosso modelo de investigação, atualmente formatado em torno de um burocrático inquérito policial, poderia explicar apenas parcialmente esses dados. Houvesse estrutura suficiente, mesmo o atual modelo funcionaria muito melhor.

Alguns especialistas chegaram a apontar que o país já gastaria o bastante em segurança pública, mas que gasta mal, havendo má gestão da administração pública. Seria o caso de se indagar contra quem é feita essa comparação, já que cada país, cada lugar, possui uma realidade diferente – e a brasileira é bastante singular. De qualquer forma, sendo caso de ausência de recursos, de má gestão ou ambas, a situação é preocupante. Além do aspecto humanitário, caracterizado pela dor e sofrimento gerados pela perda ou mutilação de vidas, pesquisa relativa ao ano de 2013 apontou que o custo financeiro da violência já ultrapassava 5,4% do PIB. Não é difícil imaginar que o ano de 2017 reserva números ainda piores. Consensos não deveriam ser relegados a segundo plano.

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