| Foto: JONATHAN CAMPOS/GAZETA DO POVO/Arquivo
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A economia do Brasil vive um paradoxo. De um lado, milhares de vagas de empregos disponíveis no mercado; de outro, a falta de qualificação adequada para que os jovens as ocupem.

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Embora estejamos vivendo com menos restrições que no início da pandemia, principalmente nas atividades econômicas, ainda temos cerca de 13,5 milhões de desempregados, sendo que, segundo pesquisa da Confederação Nacional da Indústria (CNI), a falta de qualificação impede que boa parte destes brasileiros ingresse no mundo do trabalho. Esse paradoxo se acentua em um dos setores que mais emprega no Brasil, o industrial. Cinco em cada dez indústrias enfrentam dificuldades para encontrar profissionais qualificados, interferindo diretamente em nossa tão sonhada recuperação econômica e social.

Esse cenário também é desanimador em setores que tradicionalmente requisitam grande quantidade de mão de obra, como os de móveis, vestuário, têxtil, e o de máquinas e equipamentos. Em algumas profissões, como de operador, por exemplo, a carência de qualificação supera a casa dos 96%.

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Motivos elementares, como a dificuldade de expressão, problemas com cálculos matemáticos, ausência de noções básicas em informática, falta de domínio de outras línguas (principalmente o inglês) e poucos anos de estudo curricular, fazem parte de uma pesquisa da União Geral dos Trabalhadores (UGT) que explica essa contradição, em que ao mesmo tempo há muitas vagas e um grande número de pessoas buscando um trabalho.

Enquanto o foco for apenas em programas assistenciais, a exemplo do Bolsa Família e o recém-criado Auxílio Brasil – sem desmerecer sua importância, principalmente em momentos como de agora –, vamos continuar consumindo montanhas de recursos públicos e pulando de crise em crise, sem focar no cerne do problema!

Sugestões já foram dadas por setores da sociedade, sem contar as várias propostas engavetadas no parlamento brasileiro para solucionar esse problema; entretanto, elas se perdem por serem muito pontuais. A maioria delas deixa de lado a discussão da causa, atendo-se apenas aos efeitos.

Enquanto o foco for apenas em programas assistenciais, a exemplo do Bolsa Família e o recém-criado Auxílio Brasil – sem desmerecer sua importância, principalmente em momentos como de agora –, vamos continuar consumindo montanhas de recursos públicos e pulando de crise em crise, sem focar no cerne do problema! O Brasil precisa de medidas estruturantes, que priorizem a educação das camadas mais pobres da população. A meu ver, esse é o único caminho para acabarmos com a desigualdade social e econômica da nossa nação.

Existem exemplos que comprovam essa tese. Um deles é o da Coreia do Sul, que experimentou um crescimento econômico vertiginoso nas últimas quatro décadas, tendo como uma das principais razões de tal transformação o desenvolvimento educacional, conquistado a partir de uma verdadeira revolução no ensino básico do país. De forma complementar, foram implementados programas de qualificação, como o de aprendizagem, que já revelaram sua eficácia, pois as novas gerações continuam impulsionando o desenvolvimento do país asiático. Podem ter certeza de que no Brasil não seria diferente. Quanto mais iniciativas voltadas à educação e formação de nossos jovens forem criadas, mais oportunidades reais estaremos criando.

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A experiência do Centro de Integração Empresa-Escola (Ciee) atesta que o Programa de Aprendizagem, aplicado de acordo com a Lei 10.097/2000, é um treinamento extremamente eficaz para o futuro profissional. A qualificação teórica, ajustada à prática do trabalho na empresa onde os jovens atuam, aprimora a capacidade e corrige deficiências técnicas e comportamentais, preenchendo a lacuna deixada pelas falhas (ou os chamados gaps) que ainda temos no ensino escolar brasileiro. A recém-instalada Comissão Especial do Estatuto do Aprendiz (PL 6.461/2019), composta por deputados de diferentes partidos e de vários estados da Federação, tem como grande missão produzir uma legislação moderna para o novo Marco Regulatório da Aprendizagem do Brasil.

Além de melhorar a qualidade do nosso sistema de ensino, principalmente o público, precisamos semear agora o que queremos colher no futuro. Por esse motivo, somente se plantarmos hoje a semente da educação conseguiremos celebrar no futuro a “colheita” de uma safra de adultos aptos a ocupar o seu lugar no mundo do trabalho. E o Brasil, então, poderá ocupar o lugar que sempre mereceu.

Domingos Murta é presidente do Centro de Integração Empresa-Escola do Paraná (Ciee/PR), e foi presidente do Banco do Estado do Paraná e diretor do Banco Regional de Desenvolvimento do Extremo Sul.