Desde o fim da Segunda Guerra Mundial vimos presenciando uma evolução no trato dos direitos humanos. Cortes Internacionais de Direitos Humanos, declarações e pactos internacionais prestigiam o direito à vida, alçando-a como um dos bens jurídicos individuais mais valiosos a serem tutelados pelo Direito. O Direito Internacional Humanitário jamais se afastou das questões morais, sempre associadas à busca de limites para os sofrimentos causados (historicamente) pelas guerras.
Entretanto, nos países onde a pena de morte ainda é prevista como reação a crimes praticados contra a saúde pública, a exemplo do tráfico de drogas, verifica-se uma desproporcional e desvirtuada aplicação do Direito Penal. No caso da Indonésia, o que se vê é uma injustificável intransigência quanto ao tratamento dispensado aos casos de tráfico internacional de drogas. É certo que as diferenças culturais observadas são muito fortes e que os critérios de justiça não são os mesmos, mas não se pode invocar a soberania como justificativa para o cometimento de tamanha brutalidade. Sob o aspecto do sistema internacional de direitos humanos, uma solução radical, cruel e injusta.
Lamentavelmente, notícias dão conta de que outro brasileiro, o paranaense Rodrigo Gularte, preso e condenado à pena máxima na Indonésia, em breve poderá ser executado. No caso de Rodrigo, há uma questão peculiar que tornaria eventual execução ainda mais desumana. Ele sofre de uma doença mental grave e a família, juntamente com advogados locais, tenta que ele seja transferido para um hospital psiquiátrico para receber o tratamento adequado, como substituição necessária à execução da pena imposta. De fato, o laudo médico pericial emitido neste mês pelo médico Nono Rasino dá conta de que Rodrigo sofre de “esquizofrenia paranoica”, recomendando imediato tratamento.
Nos países onde a pena de morte ainda é prevista como reação a crimes praticados contra a saúde pública, a exemplo do tráfico de drogas, verifica-se uma desproporcional e desvirtuada aplicação do Direito Penal
No Brasil, quando no curso da execução da pena sobrevém doença mental ao condenado, o juiz tem o dever de converter a pena em medida de segurança. A medida de segurança não deixa de ser uma sanção penal. Ela preserva o sentenciado e o trata. Nos demais países da América Latina não é diferente. Na Europa, desde o século 19 as medidas de segurança aparecem como mecanismo eficaz de defesa social. Antes de se configurar em castigo, deve-se levar em conta a finalidade de correção da resposta penal, seja pelo tratamento dos inimputáveis, seja pela segregação.
Se, enquanto esperava o desfecho de seu processo, sobreveio a Rodrigo Gularte doença grave que lhe afetou a higidez mental, o caminho humanitário e adequado é a internação para tratamento. Do contrário, estar-se-á legitimando uma opção político-criminal absolutamente irracional, violenta e desastrosa.
Seja qual for o país, a legislação que aplica ou a nacionalidade do imputado, em casos semelhantes a flexibilização da soberania estatal é medida que se impõe. Não se pode admitir fragilidades no sistema garantidor dos direitos humanos nos dias atuais. Daí porque em casos de violações aos direitos humanos, em todas as formas de sua manifestação, existe o dever dos Estados de buscar sua repressão.
Não se está a defender o crime, e tampouco a impunidade. A medida de segurança também é resposta de satisfação à sociedade. Demonstra ação estatal em defesa de bens jurídicos consagrados pela lei, mas de forma a preservar o condenado doente de uma pena desvirtuada de sua finalidade. Diante de tudo, impõe-se que, de alguma forma, torne-se público o repúdio à intolerância e ao radicalismo defendido pelo governo indonésio, contrapondo-se a toda a evolução internacional de proteção de direitos.
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