Enquanto o Brasil despende fatia substancial de 3,5% de seu PIB com o pagamento de regimes de previdência do setor público, a média de 17 países da Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) é de 1,4%. México e EUA, por exemplo, gastam 0,8% de seus respectivos PIBs. Por outro lado, o déficit atuarial total dos regimes próprios de previdência dos servidores (RPPS) de todos os entes federados brasileiros chega à impressionante cifra de R$ 8 trilhões, segundo dados da Subsecretaria de Regimes Próprios de Previdência Social (SRPPS) do Ministério da Fazenda. O montante equivale a mais de 1,2 vez o PIB brasileiro de 2016.
Com exceção dos servidores da União que ingressaram no serviço público federal após 2013 e dos servidores de alguns estados brasileiros, todos os demais não estão sujeitos ao teto do INSS – hoje R$ 5.531,31. Os sistemas são financiados via regime de repartição, o que implica em pacto intergeracional. Há uma falsa sensação, por parte daqueles que contribuem, de que o estariam fazendo para pagar sua própria aposentadoria, mas na verdade os que estão na ativa pagam os benefícios dos que estão aposentados.
É preciso encarar a situação previdenciária com o realismo que ela exige e com soluções técnicas
Tal sistema exige um mínimo de quatro ativos contribuindo para custear o benefício de um aposentado, em média. A realidade, no entanto, indica rápido declínio dessa relação por diversas razões: a primeira delas é que, exceto nos países de maioria muçulmana, as taxas de fertilidade têm caído significativamente nas últimas gerações; a segunda é que – para o bem e para o mal – estamos vivendo mais e virando de ponta-cabeça a pirâmide etária brasileira. “O Brasil envelheceu antes de enriquecer”, conforme expressão cunhada pelo Bird em relatório publicado há poucos anos; a terceira razão é o notório fenômeno mundial de redução de postos formais de trabalho; a última, mas não menos importante, é o fato de que os orçamentos públicos não mais admitem contratações de servidores em números capazes de reequilibrar a retromencionada relação de quatro para um.
Os crescentes déficits atuariais dos entes federados são financiados pelos orçamentos públicos, formados por tributos pagos pelos cidadãos e pelas empresas, que já não suportam aumento de carga tributária. Urge o enfrentamento da delicada questão. O teólogo Santo Agostinho ensinou: “A esperança tem duas filhas lindas, a indignação e a coragem. A indignação nos ensina a não aceitar as coisas como estão; a coragem, a mudá-las”.
O problema tem de ser arrostado sob duas óticas que devem convergir. A primeira é a manutenção de adequada proteção da valorosa categoria dos servidores públicos (na acepção do termo, aqueles que servem à população). A segunda é a busca do equilíbrio na oneração dos orçamentos públicos com a rubrica.
Do mesmo autor: A bomba-relógio da Previdência em Curitiba (4 de abril de 2017)
A solução adotada em todo o mundo desenvolvido é a quebra do pacto intergeracional e a limitação do uso do regime de repartição. A saída se dá pela instituição do teto do INSS para os servidores, e pela criação de entidade de previdência complementar fechada, em que os servidores contribuem durante a vida ativa para a formação de um fundo capitalizado que vai garantir a complementação de suas aposentadorias a níveis capazes de assegurar uma velhice digna.
Os servidores continuam a contar com um benefício-base garantido pelo poder público, mas limitado ao teto, de modo que o regime de repartição e o pacto intergeracional – e seus reflexos orçamentários – passam a ficar restritos a tais montantes. Os servidores que recebem acima do teto ganham a oportunidade de formar sua poupança previdenciária, com contribuição paritária do ente federado, até determinado limite. A renda, na inatividade, dependerá do esforço previdenciário de cada um. Mas não estará mais sujeita à sorte de haver outra geração para custeá-la ou à de haver orçamento público suficiente para garanti-la.
A fim de reverter um quadro geral que afeta diretamente os servidores municipais, a prefeitura de Curitiba enviou à Câmara dos Vereadores um projeto de lei que institui um teto previdenciário para os novos servidores do município e cria um fundo de pensão complementar. É preciso encarar a situação previdenciária com o realismo que ela exige e com soluções técnicas. A conta da inação não demorará a chegar. Cabe agora à edilidade curitibana decidir sobre a sustentabilidade do sistema previdenciário dos servidores de Curitiba.