Na equação dos acidentes de trânsito, a velocidade aparece como protagonista: é ela a responsável por um terço das mortes. Isso significa dizer que, pela pressa em chegar ao destino ou pela confiança exacerbada na própria destreza ao volante, o motorista acaba empregando velocidades impróprias. Porém, reverter esse cenário fatídico não se restringe às posturas do motorista. É nesse momento que entram em cena os gestores, incumbidos de traduzir os gargalos das cidades em uma realidade com mais qualidade de vida à população.
A receita para isso já foi até preconizada pela Organização das Nações Unidas (ONU), que definiu 50km/h como velocidade máxima para minimizar a severidade dos acidentes. Como um instrumento de conscientização, a fiscalização eletrônica auxilia para que a magnitude da medida seja internalizada pelo motorista.
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Fora do campo das ideias, porém, os números revelam uma massa de motoristas que abusam da velocidade no Brasil – e mundo – afora. Parece exagero, mas, conforme dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), mesmo conscientes dos riscos, de 40 a 50% dos condutores perdem as estribeiras na hora de pisar no acelerador, tanto em países em desenvolvimento como naqueles cujo Produto Interno Bruto (PIB) é considerado elevado, como França, Dinamarca e Reino Unido, por exemplo. De um lado, a atitude parece uma reprodução negligente daquilo que é praticado por muitos, cenário que deixa à tona o fato de um sujeito que, enquanto pedestre, é pacífico e respeitador das leis, mas, atrás do volante, se torna colérico e beligerante. De outro, não respeitar os limites de velocidade pode, nada mais ser, que efeito do temperamento do condutor.
Em ambos, educação, informação e fiscalização são parte da solução.
Qualquer que seja o caso em que se enquadra o motorista que abusa da velocidade, o comportamento é somado à rotina apressada das cidades, à infraestrutura viária que deixa a desejar e, por fim, aos infratores contumazes – que mesmo correspondendo a menos de 5% dos casos, desarmonizam o trânsito. Em meio a esse cenário polivalente, emergem cidades que apostam na mudança. São os vestígios da combinação de redução da velocidade e fiscalização eletrônica que a cidade de Curitiba experimenta desde novembro de 2015 com a implantação das vias calmas, de 40 km/h. Ao final de 2016 veio a notícia: menos 33% acidentes de trânsito nessas áreas.
Diante dessa referência, como fechar os olhos para a atmosfera controversa que impera na cidade de São Paulo? E como deixar de associá-la, sobretudo, às decisões da gestão? É fato que a administração passada acertou ao adotar o padrão da ONU e, com ele, usufruir dos benefícios da redução de 41% dos acidentes de trânsito com vítima nas marginais. A atual gestão, entretanto, ignorando esses números e recomendações, acatou ao clamor popular e, com isso, anunciou a volta do limite para até 90 km/h em pistas expressas e 60 km/h em pistas locais. O reflexo já é sentido nas ruas, sendo novamente palco de mais óbitos e acidentes severos.
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Em suma, o que falta à gestão pública, quando o assunto é o plural e controverso trânsito, é consciência e respeito a embasamentos técnicos para tornar as cidades, na limitação em que carregam, espaços humanizados para todos os atores que dele fazem parte, sejam eles motorizados ou não. E aos motoristas, faltam altivez e empatia para tomar para si a parcela de responsabilidade que lhes cabe para reverter um trânsito, hoje, nefasto.
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