Não esqueceu o STF de lembrar que a grande causa da reprovação no exame está na deficiência do ensino jurídico, provocado pelo grande número de cursos de Direito
A decisão unânime do Supremo Tribunal Federal (STF) negando provimento ao recurso que questionava a constitucionalidade do Exame de Ordem e a competência da OAB para aplicá-lo, estabelecem de maneira definitiva a predominância dos pressupostos legais que regem a profissão de advogado. A vitória é da classe jurídica, da Ordem dos Advogados e, principalmente, da sociedade, que se vê valorizada e protegida.
A partir do voto do ministro Marco Aurélio, relator do processo, ficou difícil argumentar em sentido contrário. Demolindo um a um os argumentos levantados contra o Exame de Ordem, o ministro soube demonstrar que não há ofensa a nenhum dispositivo constitucional. Mais ainda, foi enfatizado o fato de que é preciso limitar o exercício da profissão de advogado a quem se submete ao exame, tendo em vista a necessidade de se proteger a coletividade. Liberar o exercício da profissão a quem não está habilitado implica em colocar em risco o interesse coletivo, já que veríamos a profissão ser exercida por pessoas despreparadas para defender a liberdade e o patrimônio de seus clientes. No julgamento também foi lembrado que outras profissões de caráter essencial, como a Medicina, também podem prever a realização de exames de suficiência, desde que exista lei que o preveja. No caso dos advogados, a previsão consta de lei que criou o seu Estatuto. O ministro Luiz Fux afirmou em seu voto que o Exame de Ordem tem caráter preventivo, para evitar que profissional inepto cause prejuízo à sociedade.
O papel exercido pela OAB também foi destacado. O ministro Ayres Britto fez questão de afirmar que as palavras e expressões "advogado, advocacia, Ordem dos Advogados do Brasil, OAB, Conselho Federal da OAB" são citadas 42 vezes na Constituição Federal. Segundo ele, tal volume de referências marca a importância da advocacia em sua função de intermediar os interesses dos cidadãos em relação ao poder público. Aí notamos uma clara valorização da advocacia nesse julgamento histórico.
Restou evidente a função essencial do advogado na preservação da ordem pública, já que sem ele não se pode falar em administração da justiça. O Supremo colocou no mesmo plano, em funções opostas, juízes e advogados, por serem fundamentais à manutenção do primado das leis.
Se tantos argumentos a favor da advocacia não fossem suficientes, a eles os ministros do Supremo somaram mais um, lembrando que o artigo 94 da Constituição Federal reserva um quinto da composição dos tribunais aos advogados e membros do Ministério Público. Ora, se a profissão não fosse determinante para a sociedade, tal previsão legal não existiria.
Mas que não se minimize a importância do diploma de bacharel em Direito. Com ele, pode-se pretender seguir diversas carreiras, tais como as de promotor de justiça, defensor público, delegado de polícia, entre outras. Para o juiz, há necessidade de comprovar o exercício da advocacia pelo menos por três anos. Para todas, mostra-se necessário prestar concurso, assim como para se tornar advogado o bacharel precisa ser aprovado no Exame de Ordem.
A diferença está em quem promove o concurso. Como disse o ministro Ricardo Lewandowski, a competência da OAB para aplicar o Exame de Ordem equivale a uma delegação estatal, conforme a teoria dos poderes.
Se a decisão do Supremo foi formidável sob todos os aspectos, não deixou de ser também inusitada. O procurador-geral da República fez questão de retificar, de viva voz, o parecer do subprocurador, que divergia do entendimento da OAB, estabelecendo a palavra final da procuradoria a favor do Exame.
O fato é que o resultado do julgamento irá balizar, a partir de agora, todos os demais que tenham pedido idêntico, em todas as instâncias judiciais. É o reconhecimento da correção dos argumentos levantados pela Ordem dos Advogados durante os últimos anos. Em nenhum momento a OAB deixou de apresentar a legalidade da sua atuação, conforme o disposto na Lei 8.906/94, que trata da profissão de advogado e da advocacia.
Não esqueceu o STF de lembrar que a grande causa da reprovação está na deficiência do ensino jurídico, provocado pelo grande número cerca de 1.200 de cursos de Direito, num puxão de orelha que deveria merecer especial atenção das autoridades do governo, que concedem autorizações para que tais faculdades funcionem sem as adequadas condições pedagógicas. Vende-se o sonho, entrega-se o pesadelo, como salientado no julgamento.
A decisão representa o triunfo dos bacharéis que tanto se dedicam a ser bem-sucedidos no Exame de Ordem. É também a vitória de toda a sociedade.
José Lucio Glomb é presidente da OAB-PR.
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