A prisão processual, a despeito dos avanços havidos na estruturação democrática nacional, tem vivido um dos seus mais vigorosos períodos, havendo, em grande parte pelo discurso do pânico na sociedade brasileira, verdadeira febre acautelatória, em que a hermenêutica que se tem construído é de um estado intervencionista ao extremo nas liberdades dos indivíduos não processados criminalmente e sobre os quais recai, ainda, o estado constitucional de inocência.
A democracia tem na garantia do estado de inocência um instituto fundamental de segurança dos cidadãos contra a abusiva intervenção do Estado nas liberdades fundamentais. Ocorre que, a partir do estado de inocência, constitucionalmente assegurado no Brasil, toda e qualquer forma de prisão processual é medida excepcional, aplicável somente em casos de extrema necessidade em que não haja possibilidade alguma de manter o acusado respondendo ao processo em liberdade.
Até mesmo no caso dos condenados com trânsito em julgado encontra-se em decadência pelos seus malefícios; não há razoabilidade em sustentar-se um crescente da prisão cautelar, contra pessoa que apresenta todas as possibilidades legais de, ao final, ser declarada inocente.
A decretação ou manutenção da custódia prisional preventiva depende da existência de fortes razões, no sentido de que a liberdade do acusado represente concretamente prejuízo para o processo.
Não basta um temor imaginário para com a pessoa do acusado ou a repulsa causada ao julgador, em seu subjetivismo, pelo fato em apuração; é fundamental que haja necessidade objetiva da segregação daquele que ainda mantém seu status de inocente.
A atual política de "prisionalização processual" verificada no Brasil contraria de forma evidente a Carta Maior, representando permissão ao excesso interventivo do Estado e quebra da estrutura democrática, pois estabelece os claros contornos de um poder público incontrolável e cerceador das liberdades fundamentais como prática comum e normal.
O risco de que não sejam denunciados e contidos os excessos interventivos do Estado Brasileiro é evidente; "o poder gosta do poder" e tende a sempre querer produzir agigantamento do seu exercício. Ocorre que mais poder ao Estado é a contraface de menos direitos aos cidadãos.
Ao magistrado, portanto, impõe-se especial racionalidade, superando a pressão da opinião pública e dos meios de comunicação de massa, contendo o poder público e garantindo as liberdades fundamentais.
Hobbes justificou seu Estado Leviatã na necessidade de oferta pelo poder público de segurança aos cidadãos e, assim, em nome da segurança, justificou-se, com fundamento em Hobbes, o absolutismo que vigorou na Europa até a feliz vitória das idéias iluministas de Spinoza, Rosseau e Montesquieu, entre outros. Idéias estas que o Brasil hoje torna vulneráveis no abraço impensado que dá, de forma calorosa, no Leviatã.