A PEC 241, como já é sabido, limita os gastos públicos pelos próximos 20 anos, usando a inflação do ano corrente como parâmetro de reajuste – uma medida que tem seus acertos e seus erros.
Mas, antes de comentar a medida em si, vamos desmentir um erro grosseiro cometido por alguns analistas: o gasto com saúde e educação não será reduzido em 2017. Pelo contrário, pode até aumentar. Aliás, saúde e educação só entrarão no regime da PEC a partir de 2018. Somente depois disso pode ser que tais gastos sejam reduzidos, e mesmo assim existem diversas exceções (o gasto com o Fundeb, por exemplo, não entra na PEC).
Desfeito o erro imaginário, há o primeiro problema real da proposta: saúde e educação têm disposições legais de gastos obrigatórios próprios que podem ir contra a PEC – que, por ser emenda constitucional, prevalece sobre as demais disposições de gastos. De maneira mais clara, a PEC 241 estaria revogando as disposições anteriores que versam sobre os gastos com saúde e educação. Evidentemente tal assunto, pela sua própria importância, deveria ter sido deixado claro.
O governo pretende realmente sanar as contas públicas ou apenas ganhar tempo para terminar seu mandato?
Outra objeção feita à PEC se refere a seu horizonte de tempo: 20 anos é um prazo longo demais para um mecanismo desse tipo. Mas sua efetividade para reduzir o gasto público em relação ao PIB ocorre apenas no longo prazo. No curto prazo, ajuste fiscal algum esta sendo feito. Sejamos claros: o gasto público de 2017 será, em termos reais, maior que o de 2016. Isso ocorrerá por causa do mecanismo de indexação adotado. Em outras palavras, o governo Temer está propondo um ajuste fiscal que atingirá em cheio seu sucessor, mas afetará muito pouco a ele mesmo. O governo prevê um déficit primário de R$ 170 bilhões para esse ano e de R$ 139,5 bilhões para o ano que vem. A PEC 241 em nada muda essa realidade. Em resumo, nada de cortes significativos de gastos do governo até o fim da administração Temer.
Mas, com o passar o tempo, e com a retomada do crescimento, o gasto público será reduzido em relação ao PIB – e essa é a ideia central da PEC 241: desde a Constituição de 1988 o gasto público aumenta meio ponto porcentual do PIB ao ano; a PEC 241 impede tal crescimento. Este é o grande mérito dessa proposta: impedir o crescimento contínuo dos gastos públicos federais em relação ao PIB.
A pergunta que fica é: o governo pretende realmente sanar as contas públicas ou apenas ganhar tempo para terminar seu mandato? Pois a PEC 241 não funciona sem a reforma da Previdência. A PEC dá tempo para o governo, que terá dois anos para aprovar várias medidas que ajustem as contas públicas, mas sem elas fica impossível seguir o que determina a PEC 241 pois, na ausência de outras reformas, parte significativa do gasto público terá de ser direcionado ao pagamento de pessoal ativo e inativo, e juros da dívida pública. Será a paralisação do governo.
Há ainda outros problemas com a PEC 241: um é o congelamento linear de salários para funcionários públicos. Existem carreiras que estão em seu pico salarial e outras que estão defasadas salarialmente. Não faz sentido usar a mesma regra de congelamento para todas elas. A PEC ainda deixou de fora os gastos com empresas estatais. O governo brasileiro já mostrou ao mundo o que é capaz de fazer quando se trata de ser criativo em matéria de aumentar gastos públicos. Deixar as empresas estatais de fora desse limite é um convite ao próximo governante para financiar, com elas, o gasto público. Faltou também a imposição de um teto para a dívida pública bruta. E, por fim, as contas dos estados e dos municípios estão em pior situação que as contas da União, que não pode continuar a ajudar e premiar os entes federados mais irresponsáveis à custa dos responsáveis. A PEC não resolve esse problema.
A PEC 241 é um importante passo para o ajuste fiscal brasileiro. Mas é fundamental entendermos que ela é apenas um primeiro passo necessário. Muitos outros ajustes ainda terão de ser feitos para restaurarmos as contas públicas brasileiras.