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Todos que já estudaram Introdução à Economia lembram que uma moeda precisa desempenhar três funções elementares: servir como meio de troca ou intermediação; atuar como denominador comum ou medida de valor, devendo ser a expressão monetária de bens e serviços e servindo como instrumento de medição do valor das mercadorias; e servir como reserva de valor, sendo possível guardá-la para aquisição futura e acumulação de riqueza. Uma moeda deverá assumir estas três funções simultaneamente, sendo assim estável e confiável. Se não as cumpre, pode ser qualquer ativo, menos moeda.

Desde meados dos anos 70, as moedas se tornaram fiduciárias, ou seja, não há mais um lastro como o ouro. Então, aceitamos a moeda emitida pelo Estado por meio da confiança.

As criptomoedas também deveriam cumprir estas funções e emitir confiança, mas, apesar de usarem tecnologias como blockchain e criptografia para funcionarem como tal, inclusive com maior segurança, não é bem isso a que estamos assistindo com o bitcoin – pelo contrário!

O bitcoin não cumpre as funções de uma moeda. Como meio de troca, um dos principais motivos de sua existência, é limitadíssimo, lento e dispendioso (os próprios eventos sobre bitcoin nem sempre o aceitam como pagamento da inscrição). Em uma economia, todos os produtos e serviços disponíveis são expressos em suas próprias moedas (denominador comum), o que já não acontece com o bitcoin – você já viu algo do tipo “promoção imperdível, pague apenas x bitcoins”? Com certeza não. Quanto à reserva de valor, bom, depende do investidor, mas sua volatilidade compromete qualquer previsão. Desde seu lançamento, em meados de 2007, as oscilações são uma constante. Em 2013, obteve uma alta de 700%, mas somente em janeiro deste ano perdeu aproximadamente 60% de seu valor – a máxima foi de US$ 19 mil em dezembro do ano passado, caindo para US$ 6 mil no início de fevereiro. Logo, o bitcoin pode ser caracterizado como um ativo especulativo, mas não como uma moeda.

Quanto mais cedo essa bolha estourar, melhor para todos

O fato de não haver uma autoridade monetária envolvida no processo desvincula este ativo da realidade, tornando possíveis manipulações de impacto em seu valor. Mas é exatamente nesse item que os libertários alegam a sua importância: o fato de quebrar o monopólio da emissão de moeda exclusivo dos bancos centrais torna o bitcoin uma revolução. Vale destacar que esta lógica já criou mais de 800 criptomoedas mundo afora nos últimos anos. Não parece ser uma revolução, mas uma panaceia.

Aquela história de que o bitcoin é a moeda do futuro e uma ótima opção de investimento já está mais que refutada. Diversos economistas, como Nouriel Roubini, que previu a crise financeira de 2008, e os prêmios Nobel Paul Krugman e Robert Shiller têm alertado sobre isso. Mas por quê? Porque, além de não exercer as funções de uma moeda, é um ativo instável (altamente especulativo) e sem confiança (quem garante a emissão e o seu valor?). Conforme Krugman, o esquema é muito parecido com o de uma pirâmide, em que os primeiros investidores ganham muito e atraem outros com a mesma expectativa.

Pior: o bitcoin permite que seus usuários o utilizem de forma anônima, possibilitando desde a compra de drogas e evasão fiscal até a lavagem de dinheiro.

Muitos economistas alertam que as criptomoedas são a bolha do momento, pois se parecem com o famoso caso das tulipas na Holanda do século 17. Algo parecido aconteceu com as ações das empresas de Eike Batista, lembra?

E, para engrossar o caldo, importantes agentes financeiros internacionais como JP Morgan, Bank of America, Citigroup e Lloyds Bank estão proibindo seus funcionários de efetuar qualquer tipo de operação com bitcoins. A Coreia do Sul, um dos países de maior negociação em criptomoedas, deseja rastrear as operações no intuito de combater negócios ilegais.

Leia também: O fim do dinheiro como o conhecemos (artigo de Christian Geronasso e Patrick Silva, publicado em 8 de setembro de 2017)

Leia também: O futuro está no bitcoin? (artigo de Maria Ticiana Araújo, publicado em 5 de fevereiro de 2018)

Além dos grandes conglomerados financeiros, os bancos centrais também fazem o mesmo alerta. Inclusive já promoveram discussões para reduzir a circulação de moeda em espécie, que será substituída por Central Bank Digital Currency ((Moedas Digitais de Bancos Centrais, CBDC), com status de moeda fiduciária que cumpre com as três funções citadas anteriormente.

No último Fórum Econômico Mundial, especialistas se reuniram para discutir tal problemática. Robert Shiller estava lá e apresentou sua preocupação com o bitcoin: “o entusiasmo me incomoda, é muito parecido com uma bolha especulativa. As pessoas viram que tinha gente ganhando muito dinheiro e entraram nesse mercado. Mas me parece um pouco egoísta e tem o potencial de aumentar as desigualdades”.

Diante desses acontecimentos, gigantes das redes sociais como Facebook e Instagram resolveram banir qualquer tipo de publicidade sobre criptomoedas. O Facebook, por exemplo, informou que está proibindo anúncios que promovam “produtos e serviços financeiros que são associados frequentemente com práticas promocionais enganosas”.

Então, respondendo à pergunta: sim, bitcoin não passa de mais uma perigosa bolha especulativa e, quanto mais cedo estourar, melhor para todos.

As novas tecnologias dos mercados financeiros são cada vez mais complexas e de difícil compreensão; por isso, precisamos refletir sobre seus impactos em nossas vidas, pois já experimentamos algumas vezes o árduo período de uma crise após o estouro de uma bolha. O custo social é alto.

Jackson Bittencourt é coordenador do curso de Economia da PUCPR.
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