A produtividade não cresce sem a aplicação de novas técnicas, ou seja, sem formas de novas de juntar, combinar e movimentar os fatores
Em reunião de uma entidade de classe, surgiu a proposição de que o próximo governo deveria destinar orçamento específico para aplicação em tecnologia, a fim de elevar o nível de incorporação tecnológica nos processos produtivos no Brasil. No momento de debater que política seria essa e quais setores e projetos seriam beneficiados com dinheiro do governo, o que se viu foram duas coisas: uma, a falta de consenso sobre o que seja tecnologia; outra, um grande desentendimento sobre que atividades podem ser definidas como de natureza tecnológica.
As opiniões pareciam mais um samba do crioulo doido, em que cada um tinha seu próprio conceito sobre os temas, e a discordância entre todos era a tônica. É curioso que, quando ninguém exige uma definição clara do objeto tratado, parece que todo mundo concorda sobre o conteúdo em questão. Mas não é assim. Podemos iniciar definindo tecnologia como "a aplicação do conhecimento para a solução de problemas do dia a dia; é o saber fazer", expressão que implica saber o que entendemos por "conhecimento". Uma resposta pode ser: "Conhecimento é o domínio dos princípios e das leis que regem a natureza, o homem e a sociedade".
O vocábulo "tecnologia" deriva de "técnica". No dicionário, técnica é "o conjunto de procedimentos ligados a uma arte ou ciência", enquanto tecnologia é "a teoria geral e/ou o estudo sistemático sobre técnicas, processos, métodos, meios e instrumentos de um ofício ou domínios da atividade humana". Essas definições podem dar uma boa noção da coisa, mas não a esgota. Naquela discussão, meti minha colher de economista no meio para propor uma interpretação à luz da ciência econômica.
Os manuais antigos de Economia diziam que a produção resulta da aplicação de três fatores: terra, trabalho e capital. Já os manuais mais modernos introduziram uma modificação e dizem que o processo produtivo requer quatro fatores: terra (recursos naturais), trabalho, capital e iniciativa empresarial. A substituição de "terra" por "recursos naturais" é feita porque "terra" pode parecer algo muito ligada ao solo, quando a natureza oferece muito mais à produção, a exemplo do sol, do vento, dos gases e dos minérios.
A introdução do quarto fator, a iniciativa empresarial, baseia-se na constatação de que os outros fatores precisam ser juntados, combinados e movimentados por alguém, para que deles possa surgir algum produto (bem material ou serviço). Desse ponto de vista, o volume de produto que o homem consegue extrair dos fatores de produção resulta da sua habilidade, destreza e métodos usados para juntar, combinar e movimentar tais fatores. Para um economista, tecnologia é isso (repetindo): "A habilidade, a destreza e os métodos utilizados na tarefa de juntar, combinar e movimentar os recursos naturais, o trabalho e o capital, com vistas a produzir algo".
É fato que o próprio capital (máquinas e instrumentos de produção) precisa ser produzido antes e ele pode ser mais ou menos eficiente. Os bens de capital (que são chamados de bens de produção e não bens de consumo) também precisam de tecnologia no processo de fabricá-los, para que a atividade nas quais eles serão utilizados seja a mais eficiente possível. E por que é preciso melhorar a tecnologia? Por duas razões: uma, porque a humanidade procura tirar a maior quantidade possível de produto dos mesmos fatores de produção, resultando na taxa de produtividade, que, quanto maior, maiores são as possibilidades de ampliação do bem-estar social; outra razão é que, em nome da preservação e da poupança dos recursos naturais, estes devem ser utilizados com o maior rendimento possível.
O grande adversário do capitalismo, Karl Marx, propôs que a experiência socialista fosse feita na Inglaterra, que já havia atingido alto nível de desenvolvimento, e não em qualquer país rural atrasado. Ele entendia o papel da tecnologia na melhoria do padrão de vida da população e deixou claro que o socialismo não teria chance sem aumento da produtividade. Ocorre que esta não cresce sem a aplicação de novas técnicas, ou seja, sem formas de novas de juntar, combinar e movimentar os fatores. De qualquer forma, todo processo ou equipamento que consiga tirar mais produto dos mesmos fatores ou que torne possível o impossível é considerado tecnologia.
José Pio Martins, economista, é reitor da Universidade Positivo.
