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Tive a oportunidade de visitar a Agrishow 2023, ocorrida entre os dias 1º e 5 de maio. Considerada a maior feira de Agronegócio da América Latina, saí de lá extremamente impressionado com a pujança, a seriedade e o preparo do mercado rural brasileiro, pronto para atender a demanda de alimentos, maquinário, energia e fibras, tanto no mercado interno como para exportação.
Os organizadores conseguiram mostrar a força e a inovação do agronegócio brasileiro. Qualquer visitante pôde notar o vigor desse mercado. Do pequeno ao grande produtor rural, não houve quem não tivesse algo para fazer, conversar, aprender, comprar ou apenas admirar tanta novidade, tanta tecnologia misturada com muito trabalho. As imensas ruas com enormes stands expunham desde plantas e produtos de humildes produtores rurais como também máquinas de pequeno e grande porte, tratores, colheitadeiras, grandes drones, carros, caminhões, helicópteros e mesmo aviões.
O dia a dia dos tribunais muitas vezes vem desacompanhado da realidade rural brasileira,
O primeiro dia contou com mais de 60 mil visitantes, a fila de carros para entrar era interminável; ao longo da feira, a pista de pouso de helicópteros não parava, a cada 3 minutos subia ou descia uma aeronave, trazendo ou levando algum interessado. Nossa visita tinha a intenção de procurar entender onde e como o mundo jurídico poderia servir de sustentação e amparo para tanta movimentação de pessoas, máquinas e alimentos.
O otimismo que a exuberância do evento gera em qualquer visitante, acompanhado da bravura de tantos produtores rurais que ali estão para tentar melhorar o valoroso trabalho que realizam nos campos brasileiros era sempre mitigado quando entrávamos no assunto jurídico. O produtor brasileiro tem hoje duas preocupações sérias que precisam ser atendidas. Uma é ligada à política e à falta de sinais do governo federal em relação à segurança das propriedades rurais, com uma ameaça real de invasão por todo lado. A segunda aflição, porém, vai além dessa inevitável movimentação política e decorre de um problema que atinge todo brasileiro: a sensação constante de uma insegurança jurídica.
A percepção geral é de que cedo ou tarde o jugo pode atingir de cheio o maior cartão postal da nossa economia: o agronegócio.
Preocupado com o labor quotidiano, a informação que chega ao conhecimento de boa parte desse público ligado ao mundo rural é de que a Justiça vem mesmo atravessando um sério problema de insegurança. E não é por falta de conhecimento no assunto essa apreensão, é por incompreensão quanto às recentes movimentações e veredictos que vêm sendo tomados por alguns magistrados brasileiros. De nada adianta apontar decisões acertadas tomadas por juízes em algumas situações; a percepção geral é de que cedo ou tarde o jugo pode atingir de cheio o maior cartão postal da nossa economia: o agronegócio.
O agronegócio precisa e deve ter ao seu lado um robusto amparo jurídico, que seja capaz de defendê-lo nas adversidades, mas, sobretudo, que consiga mitigar essa sensação de insegurança, antevendo situações, acertando contratos, cuidando dos aspectos jurídicos de todos os atores dessa enorme realidade. Por óbvio que é preciso uma atenção especial para com o funcionário trabalhador rural, dando-lhe garantias e segurança, afinal, é ele que garante a qualidade do serviço. Contratos bem feitos, atenção aos direitos legais, uma constante preocupação com a qualidade de vida, seja ela material, social e mesmo espiritual.
O agronegócio precisa e deve ter ao seu lado um robusto amparo jurídico, que seja capaz de defendê-lo nas adversidades.
Mas além disso é preciso que o produtor rural não perca o rumo com as inúmeras normas, regulamentos, leis, decisões jurídicas, enfim, de todo anteparo legal que pode ajudar ou restringir o seu trabalho. Esse acompanhamento só pode ser feito se houver um amparo jurídico a seu lado. O dia a dia dos tribunais muitas vezes vem desacompanhado da realidade rural brasileira, e a grande quantidade de processos que se acumulam nas mesas dos juízes pode dar a tentação a alguns de tomar decisões precipitadas e desacompanhadas da atualidade.
Um produtor me perguntou, por exemplo, como entender que um contrato de arrendamento, tão praticado no Brasil, tenha um regulamento que data da década de 60. Outro ainda, acompanhado de alguns funcionários, não conseguia compreender como as normativas trabalhistas em vigor no país sejam regradas, entre outras, por leis de 73 e 74.
É preciso atenção a esse cenário, um acompanhamento jurídico constante para que as leis antigas e as novas não se tornem armadilhas e arcabouços que venham a atrapalhar o trabalho no campo. Tudo isso é trabalho para bons advogados, que estejam comprometidos a fazer o meio de campo entre o judiciário e o produtor rural.
E o trabalho desses advogados é justamente esse: mostrar a realidade rural àqueles que julgam, demonstrando que ela é bem diferente daquela apontada na mídia e no conforto das metrópoles. Por outro lado, atender as necessidades desses produtores e trabalhadores rurais, para que, atendidos nas suas justas demandas, possam continuar o brilhante ofício que hoje é responsável por praticamente um terço do PIB brasileiro.
Miguel da Costa Carvalho Vidigal é advogado e doutorando em Direito Civil pela Universidade de São Paulo.